Daqui a 48 horas, Sérgio estará de regresso ao Dragão. Consumado o despedimento de Vítor Bruno, os adeptos portistas irão centrar as atenções no rendimento da equipa no compromisso de quinta-feira. E talvez muitos olhares surjam na direção daquele que já esteve no Nantes e acabou por trocar o FC Porto por Itália, algo típico dos Sérgios que construíram uma história em tons de azul e de branco.

Atualmente, Sérgio Oliveira representa o Olympiakos, tal qual acontece com David Carmo, outro nome que ainda não há muitos meses fez correr muita tinta e muito dinheiro na Invicta. Ambos terão saído sob a gerência de Pinto da Costa por falta de rendimento desportivo condizente com o custo salarial, a avaliar pelo grau de utilização do defesa que custou 22 milhões de euros e a avaliar também pelos famosos resultados da auditoria feita às contas do clube nos últimos 10 anos.

Octavio Passos/GETTY IMAGES

Face ao publicado, o próprio Sérgio Conceição terá anuído na saída de Sérgio Oliveira em setembro de 2022, o ano em que David Carmo foi contratado ao Sporting de Braga por uma soma recorde e quase à razão de um milhão de euros por cada desafio disputado na primeira categoria. O central que optou pela seleção de Angola não tem mais do que 27 encontros com a camisola do FCP, em contraste com os 40 jogos ao serviço de um dos emblemas que permite ao multimilionário Evangelos Marinakis brincar aos futebóis num escalão intermédio entre o Rio Ave e o Nottinhgam Forest.

Martin Meissner/AP Photo

Evangelos e níveis de entretenimento à parte, a verdade é que hoje em dia quer David Carmo quer Sérgio Oliveira seriam dois indiscutíveis no onze que será orientado por José Tavares na penúltima jornada da Liga Europa. E essa seria uma das grandes conclusões da auditoria que a presente administração se esqueceu de fazer ao plantel do FC Porto e que iria sobrepor-se a todas as outras destinadas a apurar responsabilidades de natureza contabilística.

JOSE COELHO

Ao deixar cair Vítor Bruno e as promessas de um novo paradigma e de uma nova forma de estar no futebol, André Villas-Boas (AVB) fugiu no domingo à noite às responsabilidades que assumiu quando fingiu ser disruptivo e promoveu o adjunto a figura de proa do que parecia ser um projeto suportado pela escolha criteriosa dos pilares fundamentais do departamento... fundamental. No momento em que apostou no homem que se desligou de Conceição, sabia melhor do que ninguém das condições melindrosas e da escassez de recursos, o que só por si fazia supor uma cumplicidade à prova de bala e uma proteção incondicional do treinador.

MANUEL FERNANDO ARAÚJO

O presidente e os dois diretores que deram muitas vezes a cara na campanha eleitoral, Jorge Costa e Andoni Zubizarreta, tinham plena consciência de que o primeiro ano pós-Pinto da Costa seria marcado por uma terrível fase de transição e adaptação a novas realidades, com custos porventura severos do ponto de vista desportivo.

NANTES E DEPOIS

Numa instituição vergada a uma reestruturação financeira inventada para poder sobreviver mês após mês na sequência das dívidas e hipotecas que se foram acumulando, era e continua a ser desumano pedir ao substituto do técnico mais ganhador do FCP um trabalho sem mácula e sempre acima da performance dos rivais diretos.

Atendendo ao seu passado, Villas-Boas tinha a obrigação de perceber isto e de ignorar a pressão exterior que não cessou enquanto não foi entregue a cabeça de Vítor Bruno. Acima dos restantes, este foi O erro cometido pelo líder dos dragões, um erro ainda mais inadmissível considerando a coragem evidenciada quando em sentido literal deu o peito às balas durante a corrida às urnas. Ao chicotear sem piedade o técnico, no espaço de três semanas, virou do avesso a personalidade que parecia exibir e revelou-se um dirigente igual a tantos outros, discípulo da velha escolha que deixa tombar até ao último soldado na tentativa de prolongar no tempo o poder alcançado.

Com uma Supertaça no bolso e a quatro pontos da liderança no início da segunda volta do campeonato, este FC Porto exigia uma reflexão que não confundisse decisões estruturantes com o despedimento de quem se limitou a confiar que havia um ano zero.

O que a cúpula deveria ter entendido é que a cedência aos que pensam que tudo se lava com sangue vai acabar por fazer ricochete a médio prazo. Se a raiz de todos os males estava apenas em Vítor Bruno, caso a equipa chegue a maio sem conseguir os objectivos, então vai sobrar para um André Villas-Boas que deveria ter optado por uma fuga para a frente que lhe permitisse acrescentar talento a um grupo de trabalho marcado por vincados desequilíbrios.

Sendo verdade que esse esforço nunca poderia ser executado sem um milagre financeiro, mais valia na impossibilidade de um efetivo reforço do plantel manter tudo na mesma e erguer esse escudo no final de uma época que corre o risco de ficar fechada abaixo do admissível.

A partir de agora, AVB perdeu a sua testemunha de defesa e tornou-se o único alvo de acusação. Pode acreditar que será capaz de desencantar um Houdini capaz de transformar Neuhén Pérez num Ricardo Carvalho ou Otávio Ataíde num jovem Marcano. Mas o mais provável é que o senhor que se segue já se dê por feliz na eventualidade de descobrir um segundo David Carmo.

O original, sob o comando do Sérgio que se notabilizou no Nantes e depois no FC Porto que trocaria por Itália, raramente fazia parte da solução. Era visto como um problema tão alto como aquele que se senta na cadeira do presidente.