A vida de Amina Abu Maghasib depende do burro que puxa a carroça com a qual fornece transporte aos habitantes da Faixa de Gaza, devastada pela guerra, onde o combustível é escasso e caro.

“Antes da guerra, eu vendia leite e iogurte, e vinham buscar o leite a minha casa”, diz este carroceiro, com as rédeas numa mão e um bastão de borracha na outra, manobrando a sua carroça pelas ruas de Deir al-Balah, no centro do território palestiniano.

“Agora, não tenho outra fonte de rendimento senão este burro e esta carroça”, afirma, sentado no seu veículo, feito de tábuas de madeira presas com metal, montado em quatro rodas de automóvel.

As carroças puxadas por burros já eram muito comuns na Faixa de Gaza antes da guerra entre Israel e o movimento islamista palestiniano Hamas. No entanto, devido à destruição e à falta de combustível, tornaram-se omnipresentes.

Servem como meio de transporte público, fonte de rendimento ou, quando o combate se aproxima, para fugir.

Marwa Yess usa-os para viajar com a sua família.

"Pago 20 shekels (cerca de 4,80 euros à cotação atual) por uma carroça que me leve de Deir al-Balah a Nuseirat. O preço é exorbitante, mas dadas as circunstâncias, tudo parece razoável", disse à AFP.

“No início da guerra, tinha vergonha de subir numa carroça puxada por burros, mas agora não há outra opção”, explica esta professora, mãe de três filhos.

De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), até agosto, 43% dos animais de trabalho em Gaza, uma categoria que inclui burros, cavalos e mulas, morreram na guerra. Naquela data, apenas 2.627 ainda estavam vivos.

"Mais precioso do que ouro"

Além dos 2.500 shekels (cerca de 605 euros à cotação atual) para comprar um arreio, Amina Abu Maghasib também precisa de pagar pela forragem, cujo preço disparou, tal como o dos alimentos para humanos.

Os seus clientes pagam algumas moedas para entrar na carroça e, graças a isso, ganha cerca de 20 shekels por dia.

“Comprei este burro a crédito. O primeiro morreu em Deir el-Balah durante a guerra, atingido por estilhaços”, recorda.

Abdel Misbah, um homem de 32 anos que teve de se mudar com a família da Cidade de Gaza para o sul da Faixa, também se tornou condutor de carroça.

“Antes da guerra, eu vendia legumes numa banca. Agora trabalho com entregas”, conta. “Tenho de o alimentar bem, mesmo que o preço da cevada tenha subido de três para 50 shekels” por saco (cerca de 12 euros).

Desde que Israel impôs um cerco total a Gaza, quando iniciou a guerra contra o movimento palestiniano Hamas, em outubro do ano passado, a distribuição de alimentos tornou-se um pesadelo.

Além dos combates, os frequentes deslocamentos da população, a escassez de combustível, o bloqueio das estradas e os saques dificultam a distribuição.

Os burros de Gaza
Os burros de Gaza Esta vista aérea mostra uma carroça puxada por um burro a carregar latas de água no distrito de Tarhil, em Nouakchott, em 10 de outubro de 2024 créditos: AFP/Michele Cattani

O burro de Yusef Mohamad, um palestiniano deslocado de 23 anos, tornou-se o “salva-vidas” da sua família.

“Quando a guerra começou, os preços das viagens de automóvel estavam muito elevados. Não tive escolha senão confiar no meu burro. Graças a Deus, ele estava lá quando tivemos de fugir”, conta.

Aos 62 anos, Hosni Abu Warda também teve de recorrer a este meio de transporte tradicional para fugir quando a sua casa foi destruída durante uma operação militar israelita em Jabaliya, cidade no norte da Faixa de Gaza.

Depois de esperar 14 horas pela chegada de um automóvel, conseguiu finalmente entrar numa carroça com a família, “apertados como sardinhas”. Agora, afirma, “um burro é mais precioso do que o ouro e ainda mais precioso do que um automóvel moderno”.