As principais questões sobre a guerra entre Israel e o Hamas:
- O que é o Hamas e qual a diferença para a Fatah?
- Porque é que a Palestina tem dois territórios e nunca foi um Estado independente?
- O que são os colonatos?
- O que é o sionismo?
- Qual o papel dos Estados Unidos?
- Quais os principais pontos de tensão entre Israel e Palestina?
- Porque é que as tentativas de paz não funcionaram?
- Como é a relação de Israel com os países árabes vizinhos?
- Qual a origem do Hezbollah e qual a relação com o Irão?
- Quais os motivos do ataque do Hamas a Israel, a 6 de outubro?
- Porque é que este território é considerado a Terra Santa para várias religiões?
- Porquê construir Israel nesta região?
- Israel tem armas nucleares? Isso deve preocupar-nos?
- Que consequências é que este conflito pode ter para Portugal?
1. O que é o Hamas e porque é considerado um grupo terrorista? E a Fatah como funciona?
É considerado um grupo terrorista porque usa práticas não convencionais contra quem considera inimigo. Contudo, é também visto no terreno por muitos palestinianos como um grupo que providencia cuidados de saúde, de educação e por isso ganhou as eleições de 2006. Este grupo surge em 1987 na Primeira Intifada – os confrontos e ações de resistência que ocorreram entre 1987 e 1993, contra a ocupação de Israel dos territórios palestinianos.
Embora tenha sido criado em 1987, é o herdeiro da Irmandade Muçulmana, criada no Egito, nos anos 1920. Alguns membros acabaram por se espalhar nos países vizinhos e fundaram a Irmandade da Palestina. O Hamas surge com alguns elementos desse grupo. Hamas é o acrónimo em árabe de Movimento de Resistência Islâmica. Na carta constitutiva do Hamas, o artigo 11.º refere que a Palestina é um Waqf, ou seja, um domínio muçulmano e não pode ser alienado e pelo qual é necessário lutar e preservar nas mãos muçulmanas.
A Fatah é mais moderada e representa internacionalmente a Autoridade Nacional da Palestina. O seu líder Mahmoud Abbas tem estado em reuniões com os principais líderes ocidentais. A Fatah reconhece a existência do Estado de Israel e pede a retirada deste dos territórios ocupados em 1967, depois da Guerra dos Seis Dias.
O Hamas controla a Faixa de Gaza, a Fatah a Cisjordânia. Há pouco diálogo e entendimento entre as duas fações palestinianas
2. A Palestina tem dois territórios e nunca foi considerada um Estado independente. Porquê?
Havia um projeto da ONU, em 1947, que previa a criação de dois Estados independentes, mas esse plano nunca saiu do papel. Os britânicos saíram da zona da Palestina (um território muito maior do que é atualmente) a 13 de maio de 1948. Um dia depois, Israel declarou unilateralmente a independência e pouco a pouco foi estendendo o seu território.
Os palestinianos ficaram circunscritos à Faixa de Gaza, junto ao Egito; e à Cisjordânia, junto à Jordânia.
3. O que são os colonatos e que impacto têm no território palestiniano?
Os colonatos são pequenas aglomerações de habitações israelitas que foram construídas nos territórios palestinianos. Algumas fações israelitas, sobretudo de extrema-direita, consideram que aquele território é Israel, a Terra Prometida. Alguns grupos, como o Gush Emunim, financiam e patrocinam a construção destes colonatos com o objetivo de construir The Great Land of Israel – um território com a área do que são os territórios israelitas e palestinianos juntos – mesmo que isso seja feito à custa dos direitos que os palestinianos já foram adquirindo.
A comunidade internacional critica os colonatos e considera que são direitos dos palestinianos que não estão a ser cumpridos.
4. O que é o sionismo?
O sionismo é um movimento que tem como objetivo criar um Estado para o povo judeu. Esta ideologia surge na Europa no final do século XIX. Sionismo deriva de Sião, uma referência a Jerusalém, uma cidade sagrada para a religião judaica (e também para a cristã e islâmica). Com base nesse movimento, Israel é criado em 1948 nesta região.
5. Qual é o papel dos EUA e porque é que estiveram sempre tão envolvidos?
É preciso relembrar o peso que a comunidade judaica tem na economia americana e por isso os EUA sempre estiveram muito envolvidos neste conflito.
Nixon e Jimmy Carter foram os mediadores dos acordos de Camp David em 1979. Bill Clinton foi o presidente que esteve mais vezes na região e acabou por estar nos Acordos de Oslo. Obama talvez tenha estado um pouco mais distante de Israel em relação aos seus antecessores. Trump voltou a aproximar-se até porque mudou a embaixada dos EUA de Tel Aviv para Jerusalém, para marcar a capital israelita.
O atual presidente, Joe Biden, tem tido alguma cautela na sua abordagem, mas sem descurar o apoio dos EUA a Israel.
6. Quais os principais pontos de tensão entre Israel e Palestina?
Há a questão religiosa mas não é apenas isso que está em causa. Há a questão da gestão dos recursos do território. É um território muito árido e quem tiver acesso, sobretudo à água, acaba por conseguir controlar as condições adversas que a natureza lhe dá.
A água foi também motivo de disputa de Israel com a Jordânia por causa do Rio Jordão.
7. Porque é que as tentativas de paz falharam?
Os acordos acabaram por nunca se concretizar. Uma das consequências dos Acordos de Oslo foi o assassinato de Yitzhak Rabin, primeiro-ministro de Israel, por um judeu ultra-ortodoxo, que considerava o acordo como concessões que estavam a ser feitas aos palestinianos.
Em 2003, foi tentado por George W. Bush o Roteiro para a Paz, e o plano seria concretizá-la até 2013. Deste roteiro faziam parte os EUA, Rússia, União Europeia e ONU e o objetivo seria a construção de dois Estados.
Houve várias tentativas de paz por parte da Arábia Saudita: na década de 1970 apoiou a resolução na ONU para a retirada dos territórios ocupados por Israel; em 1990 esteve presente nas negociações que levaram aos Acordos de Oslo e em 2002, apresentou, na Conferência de Barcelona, a Iniciativa de Paz Árabe em que era proposto o reconhecimento árabe de Israel em troca da retirada dos territórios ocupados e a criação de um estado palestino.
As tentativas de paz para o conflito, tanto por parte do lado ocidental como árabe, nunca saíram do papel.
8. No dia seguinte à declaração da criação do Estado de Israel, o território foi atacado pelos cinco vizinhos (Egito, Jordânia, Líbano, Síria e Iraque). Como é a relação com estes países?
Com a Jordânia e o Egito as relações estão apaziguadas. O Egito adota um papel de mediador do conflito. Acredita-se que não está a deixar passar refugiados para pressionar as partes e a comunidade internacional a tomarem medidas de resolução do conflito. É improvável que Israel se sente à mesa com o Hamas, mas pode vir a dialogar com a Autoridade Palestiniana.
As relações de Israel com o Líbano também não são fáceis, principalmente pela presença do Hezbollah, que é o outro ator não estatal e que é visto como um partido político xiita. Há uma parte da população que considera que esta organização tem um cariz social, de cuidados de saúde, educação e é considerado por alguns países, como pelos EUA, como uma organização terrorista.
9. Qual a origem do Hezbollah e qual a relação com o Irão?
O grupo foi criado no Irão na década de 1970, depois da Revolução Islâmica. O aiatolá Ruhollah Khomeini, líder iraniano, tentou espalhar os ideais da revolução além-fronteiras, nomeadamente para o Líbano e para o Iraque. No Líbano, o Hezbollah continua a ser apoiado pelo Irão com o objetivo de afirmar os valores xiitas no Médio Oriente.
No início dos anos 1980, o grupo instalou-se no sul do país em Beirute. Este grupo tem um representante, de forma independente, no parlamento libanês e não reconhece a existência de Israel, considera-o ocupante da Palestina e uma ameaça aos interesses árabes na região, o que adensa as tensões entre o Líbano e Israel.
No Iraque, Saddam Hussein não permitiu o avanço desta corrente xiita. Saddam era sunita e queria manter a independência do país em relação ao Irão, principalmente depois de uma guerra sangrenta de oito anos (1980-1988) entre o Iraque e o Irão. A maioria da população iraquiana é xiita e após a queda de Saddam em 2003 existiram alguns acordos e pontes com Israel, contudo é uma relação ainda com muitas tensões e desafios. O Irão continua a ter o desejo, de há muitos séculos, de construir um corredor xiita que abarque o Iraque e a Síria e que permita ter acesso ao mar Mediterrâneo.
Na Síria, o Irão continua a apoiar o regime xiita do presidente Bashar al-Assad da Síria, apesar de o país ter uma maioria sunita.
Este desejo é a tentativa de concretizar o que os Nizaris, também conhecidos como os Assassinos, tentaram fazer na época das Cuzadas, entre o século XI e o século XIII.
10. Quais os motivos do ataque do Hamas a Israel, a 6 de outubro?
Há o contexto histórico de um conflito que dura há décadas e a questão do Dia do Perdão. Mas há outras leituras: o genro do presidente Trump, Jared Kushner, começou por liderar, em 2020, os Acordos de Paz de Abraão, para o restabelecimento das relações diplomáticas entre Israel e alguns países como Marrocos, Emirados Árabes Unidos, Bhareim e Sudão. Estava na calha que estes acordos se estendessem à Arábia Saudita – um dos principais pivôs do Médio Oriente –, governada por uma monarquia sunita. Havendo um acordo entre a Arábia Saudita e Israel, o Irão ficaria ainda mais isolado. É possível que tenha havido algum instigar do Irão neste ataque para poder adiar estes acordos ou pelo menos causar alguma instabilidade.
Neste xadrez de complexas relações internacionais, militares, religiosas e económicas, é importante relembrar o papel da China. A China tem relações económicas fortes com o Irão e uma participação considerável na Saudi Aramco, a petrolífera saudita. Em 2016, conseguiu levar ao diálogo a Arábia Saudita e o Irão.
11. Porque é que este território é considerado a Terra Santa para várias religiões?
Foi nesta região que nasceram as três religiões monoteístas. O judaísmo, depois o cristianismo, e mais tarde, o islamismo. Jerusalém é vista como a cidade santa para as três religiões. Na mesma cidade, temos as três religiões juntas. Já foi alvo de disputa entre cristãos e muçulmanos, com as Cruzadas, e agora é alvo de disputa entre judeus e muçulmanos.
12. Porquê construir Israel nesta região?
A ideia de construir o Estado de Israel já vem muito de trás, do século XIX, pelo menos. Há quem pense que foi por causa do Holocausto mas foi muito antes. Já em 1917, o primeiro-ministro britânico Balfour assinou a declaração – a Declaração Balfour –, dirigida ao Lord Rothschild, que na altura era o presidente da União Sionista Internacional, em que compromete o Reino Unido a ajudar na construção de um lar nacional para os judeus, na Palestina.
Depois, no período entre guerras, houve migrações de judeus de vários países europeus e os governos locais a promoveram a saída de judeus. O governo polaco foi um dos que mais patrocinou a saída de judeus do seu país para a Terra Santa, a tal Terra Prometida.
Depois da Segunda Guerra Mundial, houve um intensificação da migração para a Palestina, mas desde o século XIX que a Organização Sionista Internacional defende o regresso de todos os judeus à Terra Santa – com alguns governos europeus a ajudarem nesta migração.
Há ainda a crença de que as 12 tribos de Israel vão reunir-se na Terra Santa, uma profecia religiosa que entende que os descendentes das 12 crianças de Jacob (também chamado Israel) retornarão a esta região. Para alguns judeus, a criação do Estado de Israel em 1948 e a migração em massa para esta região é vista como a concretização parcial dessa profecia.
13. Israel tem armas nucleares? Isso deve preocupar-nos?
Os efeitos de uma arma nuclear não são circunscritos a poucos metros, podemos estar a falar de muitos quilómetros. Israel pode ter armamento nuclear, mas está geograficamente muito próximo da Faixa de Gaza para usar esse tipo de armamento.
14. Que consequências é que este conflito pode ter para Portugal?
Há o receio de que aconteça também em Portugal o que já aconteceu em França e na Bélgica, com elementos radicais a realizar ataques isolados como forma de retaliação.
A nível económico o impacto será mínimo – a não ser que haja um embargo petrolífero por parte dos países árabes, como em 1973, que originou uma crise energética, política e económica no Ocidente.