Os Estados Unidos da América manifestaram consternação esta terça-feira com a morte de cerca de 100 palestinianos, incluindo mulheres e pelo menos 25 crianças, num ataque israelita em Beit Lahia, no norte de Gaza, e exigiram explicações a Israel.
O porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller, disse que os EUA estão “profundamente preocupados com a perda de vidas civis” neste “ataque horrível com um resultado horrível”. “Contactámos o Governo de Israel para perguntar o que aconteceu”, acrescentou Miller.
A Defesa Civil da Faixa de Gaza anunciou esta terça-feira que 93 pessoas foram mortas durante a noite num ataque israelita a um edifício em Beit Lahia, no norte do território palestiniano. Menos de 24 horas após o bombardeamento, Israel voltou a atacar a cidade de Beit Lahia, visando uma zona residencial e provocando a morte de pelo menos uma dezena de pessoas.
O porta-voz da diplomacia norte-americana não mencionou quaisquer consequências imediatas para Israel, que conta com o apoio militar e diplomático dos EUA. Miller reiterou o apelo de Washington a um fim negociado da guerra na Faixa de Gaza, desencadeada pelo ataque do grupo islamita palestiniano Hamas a Israel em 7 de outubro de 2023, que matou mais de 1.200 pessoas, na maioria civis, e fez mais de duas centenas de reféns. O “custo trágico para os civis” do último ataque “recorda-nos mais uma vez porque é que temos de acabar com esta guerra”, afirmou Matthew Miller.
O porta-voz da Defesa Civil do enclave palestiniano, Mahmud Basal, disse, por sua vez, através da plataforma Telegram que várias famílias estão a pedir ajuda, mas que os serviços de ambulância do grupo já não estão a funcionar no norte de Gaza, onde Israel mantém um forte cerco desde o início de outubro, que já fez mais de mil mortos.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos apelou entretanto às autoridades israelitas para procederem a uma investigação “rápida, transparente e pormenorizada” sobre as circunstâncias do ataque. “Os civis estão protegidos pelo direito internacional humanitário”, declarou o porta-voz do Alto Comissariado, Jeremy Laurence, que se disse “chocado” com o ataque ao edifício que albergava “crianças, mulheres e idosos”.
Entre os mortos encontram-se pelo menos 25 crianças, o que faz deste “um dos ataques mais mortíferos em Gaza em quase três meses”.
O porta-voz sublinhou que é “imperativo” que as autoridades israelitas permitam o acesso dos serviços de emergência às zonas afetadas pelos seus ataques no norte de Gaza e denunciou que, nalguns casos, são os próprios socorristas que estão a ser atacados. “Os hospitais também foram atacados e estão agora praticamente fora de serviço. Os hospitais, as ambulâncias e o pessoal médico estão especificamente protegidos contra ataques pelo direito humanitário internacional ou contra qualquer utilização para fins militares”, reiterou.
Desde que Israel iniciou a sua operação em grande escala contra o Hamas, o enclave palestiniano ficou sitiado e mais de 43 mil pessoas, também maioritariamente civis, morreram, segundo as autoridades locais controladas pelo grupo islamita.
Ainda no enclave, controlado pelo Hamas desde 2007, mais de 1,9 milhões de pessoas estão deslocadas, enfrentando uma escassez generalizada de bens essenciais.
UNRWA afirma estar a manter a população de Gaza “viva”
O porta-voz da agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinianos no Médio Oriente (UNRWA), Jonathan Fowler, afirmou esta terça-feira que a organização é “insubstituível” pois está a ajudar a manter “viva” a população de Gaza, devastada pela guerra.
Jonathan Fowler, porta-voz da agência em Jerusalém, disse que a organização é a espinha dorsal do trabalho humanitário nos territórios palestinianos, especialmente em Gaza. “A UNRWA é insubstituível, a UNRWA é essencial. Isso continua a ser um facto, independentemente da legislação aprovada ontem [segunda-feira]”, disse Fowler, descrevendo o projeto de lei como “escandaloso”, em entrevista à agência de notícias francesa AFP.
Apesar da oposição do seu aliado norte-americano e de uma advertência do Conselho de Segurança da ONU, o parlamento israelita aprovou na segunda-feira, por esmagadora maioria (por 92-10), um projeto de lei que proíbe “as atividades da UNRWA em território israelita”, incluindo Jerusalém Oriental, uma área ocupada e anexada por Israel.
Israel, que desde há muito critica a agência, acusou vários funcionários da UNRWA de participarem no massacre perpetrado no país pelo grupo islamita palestiniano Hamas em 7 de outubro de 2023, que desencadeou a retaliação israelita. Nos últimos meses, o exército israelita atacou várias escolas da UNRWA em Gaza que haviam sido transformadas em refúgios, nas quais afirmou que operavam combatentes do movimento islamita palestiniano. Segundo a agência, 230 dos seus funcionários foram mortos desde o início da guerra.
Jonathan Fowler disse ainda que a UNRWA espera que a decisão seja revertida e que não há “qualquer possibilidade de a substituir”.
“Cabe à comunidade internacional e às autoridades israelitas, enquanto membros da comunidade internacional, dizer qual é o plano B”, caso a decisão seja efetivamente implementada dentro de três meses, como anunciado pelo parlamento.
Com cerca de 18.000 funcionários entre a Cisjordânia ocupada e a Faixa de Gaza, incluindo 13.000 professores e 1.500 profissionais de saúde, a agência tem prestado ajuda aos refugiados palestinianos desde a sua criação em 1949.
O porta-voz da UNICEF, Jens Elder, que está atualmente a participar numa campanha de vacinação em massa em Gaza com a UNRWA, levantou esta terça-feira a questão logística numa conferência de imprensa em Genebra.
“Se a UNRWA não conseguir funcionar, o sistema humanitário em Gaza provavelmente entrará em colapso. A UNICEF não conseguirá distribuir os fornecimentos vitais”, afirmou.
Um segundo documento aprovado pelo parlamento na segunda-feira proíbe os funcionários israelitas de trabalharem com a UNRWA e os seus colaboradores, o que deverá perturbar consideravelmente as atividades da agência, ao mesmo tempo que Israel controla rigorosamente todas as entradas de carregamentos humanitários em Gaza.
Outras notícias:
⇒ O secretário-geral da ONU lembrou que “nenhuma legislação pode alterar” as obrigações internacionais de Israel, depois da aprovação da lei que limita a UNRWA. António Guterres disse, numa declaração divulgada na segunda-feira, que está “profundamente preocupado” com a decisão, e considera “prejudicial para a solução do conflito israelo-palestiniano e para a paz e segurança em toda a região”;
⇒ O Conselho Shura do Hezbollah, o mais alto órgão do grupo xiita libanês, anunciou, esta terça-feira, que Naim Qassem é o seu novo secretário-geral. O nomeado substitui Hassan Nasrallah, que morreu num bombardeamento de Israel em 27 de setembro;
⇒ O Alto Representante da União Europeia para a Política Externa, Josep Borrell, considerou os ataques a capacetes azuis “totalmente inaceitáveis”, após os ferimentos infligidos esta terça-feira no Líbano a oito soldados da missão interina da ONU no país. “Os ataques a forças de manutenção da paz da ONU constituem uma violação do direito internacional e são totalmente inaceitáveis”, declarou Borrell num comunicado, referindo-se aos oito capacetes azuis austríacos da FINUL feridos num ataque com morteiros “provavelmente proveniente do [movimento xiita libanês] Hezbollah ou de um grupo a ele ligado”;
⇒ A Noruega pediu ao Tribunal Internacional de Justiça que se pronuncie sobre as obrigações humanitárias de Israel na Palestina, na sequência da proibição imposta às atividades da Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinianos;
⇒ O ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, estimou que o grupo xiita Hezbollah tem apenas um quinto do seu arsenal de foguetes e mísseis intactos, após um mês de escalada da guerra no Líbano. “Calculo que a capacidade restante de mísseis e foguetes é de cerca de 20 % e que o Hezbollah não está organizado como antes, em termos de como poderia lançar grandes barragens [de foguetes]”, disse Gallant durante uma visita à base do Comando Norte do exército israelita.