A Câmara do Porto cancelou esta segunda-feira uma reunião marcada com a Associação Rodoviária de Transportadores Pesados de Passageiros (ARP), alegando falta de condições "para um diálogo sensato", o que deixou a associação "apanhada de surpresa".

"A autarquia considera que não estão reunidas as condições para um diálogo sensato, face às declarações proferidas recentemente pela ARP que, além de sectárias, insistem em canalizar para o centro da cidade mais de 400 autocarros por dia", pode ler-se num comunicado enviado às redações pela Câmara do Porto.

Em causa estava uma reunião para debater a limitação de veículos turísticos no centro da cidade, implementada desde 1 de outubro, e que estava marcada desde a semana passada.

Contactado pela Lusa, o presidente da ARP, Rui Pinto Lopes, disse que a associação foi "apanhada de surpresa" pelo cancelamento, sublinhando que "à ARP não foram dadas justificações", e remeteu uma posição mais completa para mais tarde.

Câmara alega falta de condições mínimas “de lucidez”

À margem da reunião do executivo camarário desta segunda-feira, o vereador da Economia da Câmara do Porto, Ricardo Valente, afirmou que "não se pode negociar com base num sequestro".

"Quando temos uma associação que diz que quer sequestrar e paralisar a cidade estamos perante uma questão de sequestro e, portanto, é muito difícil negociar com alguém que quer sequestrar a cidade", afirmou.

A decisão do cancelamento foi divulgada aos vereadores na reunião privada do executivo, tendo o presidente da Câmara, Rui Moreira, entendido que "não estão reunidas as condições mínimas para se realizar a reunião".

Para o presidente, "o Município do Porto não aceita ameaças" e "não tem havido condições mínimas de lucidez, sensatez e de respeito pelo interesse comum por parte dos responsáveis da ARP".

O que alegam a Câmara e a ARP

No comunicado que fundamenta a decisão, a Câmara do Porto "repudia as declarações recentes da Associação Rodoviária de Transportes Pesados", considerando que esta alegou "de forma leviana que ao invés da autarquia do Porto limitar o acesso dos autocarros turísticos ao centro da cidade, devia limitar as viaturas particulares dos portuenses, bem como daqueles que à cidade se deslocam para trabalhar".

Em causa estão declarações ao Jornal de Notícias (JN) e ao Público de Rui Pinto Lopes.

A Câmara do Porto, revelando "estupefação", cita declarações do presidente da ARP ao JN no dia 25 de outubro, em que Rui Pinto Lopes afirma que "o problema não está nos autocarros, o trânsito é caótico por causa dos veículos particulares".

A autarquia cita ainda, no comunicado desta segunda-feira, declarações do dirigente associativo no dia 22 de outubro ao jornal Público, dando conta que "os operadores, quer de autocarros, quer de ligeiros, quer de tuk-tuks, se nada for feito, estão a preparar bloquear a cidade", apesar de Rui Pinto Lopes afirmar que a ação não estaria a ser programada pela ARP.

A citação de dia 22 é recuperada no comunicado de hoje da Câmara do Porto, mas, no próprio dia, o presidente da autarquia fez declarações ao Público, e no dia seguinte o 'site' oficial do município publicou uma nota a confirmar a reunião, dando conta que a câmara estava "disposta a ouvir operadores sobre limitação à circulação de veículos turísticos", citando ainda declarações do presidente ao JN.

A Câmara do Porto classifica as declarações como "um conjunto de posições da ARP que revelam um claro desrespeito pelo espaço público e pelas suas funções essenciais, que se regem pelo interesse público e não por interesses particulares, como é o caso aqui em presença".

Gerir espaço público “de forma rigorosa”

A autarquia reafirma hoje "o seu compromisso em assegurar que o espaço público continue a ser gerido de forma rigorosa, transparente e responsável, procurando sempre o bem-estar e a qualidade de vida dos seus habitantes".

"Esta tentativa de apropriação das vias de circulação na cidade do Porto, como se fossem propriedade exclusiva de operadores privados, será sempre inaceitável", entendendo a autarquia que o "aumento expressivo na procura por veículos turísticos (...) tem conduzido a um desrespeito generalizado e intolerável das normas de paragem e circulação estabelecidas".

Para a autarquia, "a alteração à sinalização de trânsito promovida pelo município a 1 de outubro de 2024 é uma medida estratégica para a gestão do espaço público".