Portugal enfrenta uma crise demográfica que terá um impacto profundo no ensino superior. Entre 2025 e 2030, o número de jovens em idade de ingressar nas universidades diminuirá em cerca de 25%, segundo a projeção da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência. O portal estatístico Pordata confirma esta tendência, com a população dos 18 aos 24 anos a reduzir-se de 770 mil em 2001 para menos de 480 mil em 2023. A manter-se esta tendência, o sistema de ensino superior corre o risco de enfrentar sérias dificuldades para preencher vagas, o que poderá impactar diretamente a sustentabilidade financeira de diversas instituições.

Acrescem o envelhecimento populacional, a emigração de jovens qualificados e as rápidas mudanças no mercado de trabalho, impulsionadas pela digitalização da economia, que intensificam a pressão sobre as Instituições de Ensino Superior (IES).

Este cenário será ainda mais severo com o fim dos apoios do PRR, em 2026, e do Portugal 2030 em 2029, comprometendo áreas cruciais como a modernização de infraestruturas, digitalização, investigação científica e formação profissional, incluindo os Cursos Técnicos Superiores Profissionais. Sem esses fundos, projetos de requalificação, currículos atualizados e apoios sociais estarão em risco.

Embora a internacionalização seja frequentemente apontada como uma solução, os seus efeitos não são imediatos. O relatório da OCDE Education at a Glance 2022 recorda que "a atração de estudantes internacionais depende não só da qualidade das instituições, mas também do ambiente social, económico e político". Portugal recebe atualmente cerca de 50 mil estudantes internacionais, mas esse número representa apenas 7% do total de estudantes do ensino superior, muito aquém de outros países europeus como o Reino Unido, onde os internacionais constituem cerca de 20% dos estudantes.

Estão as IES preparadas para o inverno demográfico que se avizinha? Algumas já avançaram com a digitalização e a internacionalização, mas isso pode não ser suficiente. A sustentabilidade a longo prazo requer uma estratégia robusta que inclua infraestruturas de qualidade, corpo docente preparado, tanto pedagógica como tecnologicamente, e uma gestão eficiente. A necessidade de atrair e reter talento docente de alto nível também será um desafio, à medida que a competição global por profissionais qualificados aumenta. Por outro lado, as IES não podem depender em exclusivo de mercados tradicionais como o Brasil e os PALOP. Diversificar o recrutamento internacional é essencial, tal como inovar nos currículos e apostar em programas em inglês, na investigação científica e na integração em redes internacionais.

Se o Governo e as IES não tomarem medidas eficazes, o impacto da crise demográfica será enorme. Mesmo com políticas de atração de talento internacional e fixação de jovens, o número de estudantes continuará insuficiente para preencher as vagas, e o financiamento disponível não cobrirá as crescentes necessidades das instituições. Para superar este desafio, é essencial uma cooperação estreita entre o Estado, as IES e o setor privado, de forma a desenvolver soluções integradas e sustentáveis. Só com esforços conjuntos poderemos garantir a competitividade e a atual sustentabilidade do ensino superior em Portugal.

Nota: Este artigo reflete a visão do autor e não da APESP.


Miguel Copetto, Diretor Executivo da Associação Portuguesa do Ensino Superior Privado