Apesar de já não ser um tema tabu na sociedade, falar de saúde mental é falar, também, de estigmas e preconceitos. O número de pessoas diagnosticadas com doenças mentais está a aumentar e atualmente cerca de um quinto da população portuguesa é afetada por distúrbios psicológicos, sendo os mais frequentes as perturbações de ansiedade e depressão.

A psicóloga Teresa Feijão explicou à SIC que “há uma persistente desvalorização das doenças mentais em comparação com as doenças ‘físicas’ ou ‘orgânicas ’e a falta de informação desta temática tem levado à origem de muitos mitos e informações erradas que promovem o preconceito e a estigmatização de pessoas com este tipo de problemas”.

“Assim como procuramos um dentista quando temos um problema nos dentes, procuramos um gastroenterologista se há algo relacionado com o nosso sistema digestivo, portanto, obviamente nesse sentido procuramos alguém que nos ajude para determinada coisa específica para o qual tem formação”, exemplifica a psicóloga.

Natalia Lebedinskaia

Estigmas podem ter várias origens

Os estigmas em relação à saúde mental vêm de vários lados. Desde logo, a ideia errada de que quem vai a um psicólogo é “maluco”. Esta ideia pré-concebida cria uma crença limitadora que bloqueia a pessoa que pede ajuda.

Esta interiorização do preconceito faz com que o paciente tenha receio ou medo do julgamento por parte dos amigos, ou familiares. Isto provoca uma ideia de que o seu sofrimento não é suficiente para pedir ajuda e que consegue ultrapassar a situação sozinho.

Carol Yepes/GettyImages

Também o dinheiro é um fator a ter em conta. Assim, como explica a psicóloga, as pessoas associam as consultas a algo caro, mas “não têm muitas vezes em consideração que o que se gasta a longo prazo em medicação acaba por ser, contabilizando, muito superior àquilo que se gasta num acompanhamento”.

Portugal é um dos países onde mais se consome antidepressivos

Teresa Feijão explica que o consumo de antidepressivos em Portugal não para de aumentar e isso acontece, principalmente, devido à normalização do consumo de comprimidos.

“Isto está associado a qualquer coisa que é medicação. Qualquer pessoa vai facilmente buscar um comprimido para a dor de cabeça, adota medicação que o amigo também adotou (...) Eu percebo, e todos nós já o fizemos, para facilitar tomamos um inflamatório, um anti-histamínico para a dor de cabeça, um comprimido para o estômago… todos o fazemos. Agora, quando a situação está a ser persistente no tempo, cuidado em relação a tudo, particularmente às perturbações mentais”, frisa.

A psicóloga crescenta, ainda, que isto se deve porque “é mais fácil tomar algo do que estar ali sessões e sessões a tocar em pontos que, do ponto de vista do foro interno, são mais difíceis".

"Não se vai ao psicólogo uma ou duas sessões. Quer dizer, há quem vá, mas não resulta.”

Canva

A pandemia como ponto de viragem

Na altura da pandemia, principalmente devido ao isolamento, as pessoas começaram a recorrer não só mais ao psicólogo, como também começaram a ver com bons olhos a realização de consultas online.

“Posso lhe dizer que neste momento eu trabalho numa clínica presencialmente e a maior parte das minhas consultas e acompanhamentos são feitos online. (...) Antigamente, eu acompanhava online as pessoas que não estavam em Lisboa ou que não estavam no país”.

Desta forma, Teresa explica que o paciente começou a ver que esta prática acaba por ter algumas vantagens como por exemplo poupar tempo na deslocação ou dinheiro em combustível e estacionamento. Aliado a isso, permitiu que as consultas possam acontecer sem recorrer a máscaras.

Normalizar o pedido de ajuda

Esta quinta-feira, 10 de outubro, celebra-se o Dia Mundial da Saúde Mental que, como já aqui foi abordado, é um problema que afeta cada vez mais pessoas.

Para que os preconceitos e os tabus sejam quebrados, Teresa Feijão explica que cada vez mais é preciso apostar na "educação, sensibilização pública e numa comunicação mais transparente e explicativa sobre as doenças mentais".

“É imperativo promover uma mudança de paradigma, visando a disseminação de informações mais precisas. Essa abordagem possibilitaria a identificação precoce de sintomas psiquiátricos, incentivando uma procura antecipada de ajuda por parte dos pacientes e aumentando a adesão à terapêutica.”

Canva

No entanto, há que ter atenção e recorrer sempre a profissionais qualificados para que se possa fazer um diagnóstico correto: “Eu estou com a pessoa no mínimo cerca de 50 a 60 minutos, no mínimo (...) Vou logo à partida ver se há algum historial de doenças mentais e afins, mas também despistar qual é a intensidade da ansiedade daquela pessoa, da tristeza, se existe ali uma depressão. Quem não tem competências para tal não vai saber despistar isso, mesmo que saiba como é que vai tratar.”

E no fim fica o alerta...

“As consequências de não procurar ajuda quando é necessária podem tornar um problema de resolução simples (ou menos complicado) em algo complexo e doloroso — no momento ou anos mais tarde. A negligência com a saúde mental pode manifestar-se também através de sintomas físicos e gerar problemas crónicos”.