
Manuel Coutinho avançou também que o número de situações de 'bullying', 'ciberbullying' e de violência no namoro que chegam à Linha SOS Criança (116 111), do IAC, tem vindo aumentar, totalizando já 48 este ano, mais do que em todo o ano de 2024.
O presidente do IAC comentava à agência Lusa o crime denunciado na quinta-feira pela Polícia Judiciária, segundo a qual os jovens "em contexto grupal constrangeram a vítima [16 anos] a práticas sexuais e filmaram os atos, contra a sua vontade, divulgando-os nas redes sociais".
Segundo a PJ, os suspeitos são 'influencers' com "um público já muito significativo", tendo sido neste que veio a ocorrer esta situação em fevereiro, que foi denunciada pelo Hospital Beatriz Ângelo, onde a jovem foi acompanhada.
Para Manuel Coutinho, situações como esta são indicadores de que a forma como se está a construir a sociedade "está a ficar doente, porque pessoas sem escrúpulos não podem ser influenciadores".
Manifestou também apreensão com o facto de os jovens se deixarem influenciar por pessoas que se autodenominam influenciadores e aceitarem sem crítica tudo o que estes lhes transmitem.
"Agora, além de existirem influenciadores que influenciam negativamente, quando os influenciadores praticam crimes, devem ser julgados claramente pela justiça, porque o crime de abuso sexual é um crime gravíssimo e esta situação não pode passar ao lado da justiça", vincou.
Tendo em atenção a idade dos suspeitos, entre os 17 e os 19 anos, o psicólogo defendeu que devem "ter apoio psicológico e psiquiátrico, porque ninguém no seu estado dito normal tem este tipo de comportamentos e de atitudes".
Para o presidente do IAC, "a vítima também tem que ser muito apoiada, muito ajudada, para tentar ultrapassar um trauma gravíssimo que dificilmente é esquecido".
Apesar da Linha SOS Criança ter registado um aumento de situações de 'bullying', 'ciberbullying' e de violência no namoro, Manuel Coutinho disse que é preciso a população estar alerta e denunciar mais.
"Quem não denuncia as situações é cúmplice das situações. E não tenho a menor dúvida que devem existir cifras negras, ou seja, é muito maior o número de situações de crianças que não veem os seus direitos respeitados (...) do que aquelas crianças que nós efetivamente sabemos", vincou.
"Por isso, ainda estamos a desbravar o início de um terreno que eu acho que é muito pantanoso e que todos, Estado, organizações da sociedade civil, população em geral, cada um de nós, tem de estar muito atento porque esta praga é quase, também, uma pandemia e temos que ter muito cuidado, porque a saúde mental e a vida dos nossos jovens merece todo o nosso cuidado e aprendizagem", sustentou.
Apelou também às pessoas para estarem atentos aos conteúdos que estão a ser transmitidos nas redes sociais e, quando estes foram inapropriados, chamar a atenção e denunciá-lo para que o autor seja responsabilizado pelo que está a fazer.
Para Manuel Coutinho, a sociedade vive um momento "em que parece que não há limites para nada" e que essa falta de limites está a levar a este tipo de situações, que mostram "que algo não está a correr bem e que o modelo educativo, por mais esforços que [sejam feitos], não está a resultar".
"Tudo é permitido e os jovens frequentemente, para serem inovadores, usam por vezes estratégias menos corretas e aqui aparecem muitas situações de bullying, de violência no namoro e a do 'ciberbullying', o que nos deixa muito preocupados", afirmou.
Explicou que a preocupação se prende com o tipo de sociedade que está a ser construída, "em que não existe empatia pelo outro", e o modelo educativo, que passa pelos valores do respeito, da educação, cidadania, por vezes, é substituído por 'influencers', por pessoas, por máquinas, perdendo-se a relação humana.
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Lusa/fim