Pablo Marçal, empresário conhecido pelos cursos motivacionais e especialista em viralizar conteúdos na internet, é um dos principais candidatos a vencer as eleições na cidade de São Paulo, roubando espaço à direita sem ter o apoio de Jair Bolsonaro.

"Sou eu, um celular [telemóvel], Deus e o povo!", descreve-se assim o candidato de 37 anos, numa das últimas publicações no Instagram, na sua nova conta criada há cerca de três semanas e que já tem 4,5 milhões de seguidores, após as suas contas anteriores terem sido suspensas por abuso de poder económico eleitoral na sequência de um inquérito por denúncias de pagamentos a seguidores para distribuírem 'cortes' (micro conteúdos) nas redes sociais e torná-los virais.

À Lusa, o profissional de marketing digital Marcelo Vitorino, que está a trabalhar para quase uma dezena de candidatos às eleições municipais de 06 de outubro no Brasil, explicou que Marçal, por ser um profissional da área, consegue entender de forma quase perfeita o funcionamento das redes: "um gancho muito curto, de até cinco segundos", para captar a atenção.

"As pessoas vão às redes sociais porque sentem que precisam de dopamina", não em busca de conversa e conteúdo de um político tradicional, mas sim de algo que vai captar a sua atenção, frisou.

A postura nos debates tem sido a de encontrar frases curtas e fortes, criando apelidos para os outros candidatos, como chamar Guilherme Boulos (apoiado por Lula da Silva) de "cheirador de cocaína", ou dizendo o seu nome em linguagem neutra, de forma a criar 'cortes' para as redes sociais e viralizarem.

O clima hostil já passou das ofensas para a agressão física: Durante um debate na TV Cultura, no domingo, Pablo Marçal foi atacado com uma cadeira pelo candidato José Luiz Datena, conhecido apresentador de televisão, de 67 anos, segundos depois de dizer que Datena não tinha coragem de lhe bater. Segundo a sua assessoria, Marçal terá fraturado uma costela.

Nos intervalos dos debates faz 'lives' para as suas redes, muitas vezes apontando o telemóvel para os restantes candidatos, dirigindo-se a eles de forma jocosa.

"Ele entendeu que não precisa responder aos adversários, não tem de seguir normas. Ele só precisa gerar 'cortes' e falar com o público", disse Marcelo Vitorino.

"Pode-se transformar numa tragédia do ponto de vista administrativo, mas do ponto de vista da comunicação é muito inteligente", resumiu, descrevendo ainda os seus discursos feitos através de "uma lógica evangélica, em que a ligação com deus te faz próspero", num "alinhamento com o divino".

De acordo com as mais recentes sondagens, Pablo Marçal encontra-se virtualmente empatado com o deputado federal Guilherme Boulos, e com o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, que tem o apoio do ex-chefe de Estado e, até agora, líder incontestável da direita, Jair Bolsonaro.

Também à Lusa, o cientista político e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Rodrigo Prando analisou as características do candidato do pequeno Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) dizendo ser uma pessoa com conhecimento técnico do funcionamento das redes sociais e, ao mesmo tempo, com carisma, que traz consigo a cultura ao antissistema e do enriquecimento e que vem "desse universo do 'coach', da teologia da prosperidade".

"A política é uma porcaria, tudo é uma porcaria, como é que você vai mudar? Você não vai mudar a realidade, você vai mudar você. Você vai enriquecer e não vai depender mais disso", resumiu assim Rodrigo Prando, ao falar da postura de Pablo Marçal.

"Isto tem um poder de atração enorme", já que, "com todas as críticas, Pablo Marçal saiu da pobreza e tornou-se um milionário", detalhou, referindo-se ao candidato que declarou um património de 169 milhões de reais (27 milhões euros) ao Tribunal Superior Eleitoral.

O ex-'coach' e empresário que vende cursos e mentoria de empreendedorismo, marketing digital e inteligência emocional agregou o culto à prosperidade e empreendedorismo ao Deus, Pátria, Família e Liberdade, slogan de Bolsonaro.

"Por incrível que pareça, Pablo Marçal tem entendido sociologicamente muito mais a periferia e os pobres do que a esquerda", considerou.

Para além disso, difere de Bolsonaro na criação política: "Bolsonaro foi um político que encaixou muito bem o discurso no Brasil de alguém que atacava o sistema político, embora fosse um político há 28 anos no Congresso" e, embora sendo um bom ator, "quem fazia o roteiro e a direção daquela atuação nas redes sociais era o filho Carlos Bolsonaro", explicou.

Por outro lado, o agora candidato à maior cidade da América Latina, com uma população ligeiramente superior à de Portugal, é ao mesmo tempo o ator com um discurso antipolítica e antissistema e o "próprio roteirista e o diretor da sua própria campanha e do seu personagem", sendo "intelectualmente mais sofisticado que Bolsonaro".

O empresário, segundo o professor, entende que "a lógica das redes dá-se por conta dos algoritmos que promovem não uma discussão racional", mas sim através do sentimento, como "o medo, a angústia, a raiva, o ódio e o humor".

Pablo Marçal tem lidado com pinças o tema Jair Bolsonaro, já que entende que para vencer a cidade de São Paulo, numa possível segunda volta, precisará do apoio dos seguidores do ex-Presidente.

A relação entre os dois tem sido complicada durante a campanha, com o epicentro do atrito a acontecer durante o dia da Independência do Brasil, 07 de setembro, data que foi capturada nos últimos anos pelo bolsonarismo.

O grande evento organizado por Bolsonaro e que reuniu milhares de pessoas aconteceu precisamente em São Paulo. O candidato apoiado pelo ex-Presidente marcou presença no camião, havendo a expectativa da presença de Pablo Marçal.

Só que Marçal chegou depois dos discursos encerrarem e foi-lhe vetado subir ao camião. "Queria subir no carro de som e acenar para o público (fazer palanque às custas do trabalho e risco dos outros), e não foi permitido por questões óbvias", escreveu Bolsonaro numa mensagem aos seus aliados, segundo o jornal Metrópoles.