
«Servir o desporto significa, em primeiro lugar, servir a nossa própria causa. Todas as iniciativas promovidas pelo L’Equipe têm o mesmo objetivo: ajudar-nos a vender o jornal.»
Se é um romântico do futebol, talvez este texto não seja para si. Se acredita que aquela que é considerada a mais importante prova de clubes do mundo nasceu assente nos valores mais puros do desportivismo, talvez seja melhor pensar duas vezes.
A frase que abre estas linhas foi dita por Jacques Goddet, fundador e diretor do jornal francês, considerado um dos pais da ideia da criação da primeira competição europeia de clubes.
Sim, é verdade: a competição foi idealizada pelo L’Équipe com um propósito comercial: ter matéria sobre a qual escrever a meio da semana para vender mais jornais. De resto, a fórmula não era nova. Em 1903, a mesma publicação tinha inventado a roda - ou melhor, o Tour - com o objetivo de vender mais jornais no verão.
Claro que a ideia de uma competição que juntasse clubes de países diferentes já pairava no ar, como se percebia no final de 1954.
A 13 de dezembro desse ano, realizou-se um jogo particular entre o campeão inglês, o Wolverhampton, e o húngaro, o Budapest Honved, que os Wolves venceram no seu estádio, por 3-2.
Gabriel Hanot, repórter do L’Équipe enviado para o jogo, ao ler nos jornais ingleses do dia seguinte e perceber que os responsáveis do Wolverhampton se consideravam campeões do mundo por terem saído vencedores da partida, escreveu um texto que pode ser considerada a primeira pedra da Liga dos Campeões.
«A ideia de criar um campeonato do mundo, ou pelo menos um europeu de clubes maior, mais expressivo e menos episódico do que a rota da Europa central valeria a pena ser lançada», escreveu, dando mote para que a ideia começasse a ser discutida, primeiro internamente no jornal, e depois com responsáveis do futebol.
Nesse sentido, a proposta da criação da Taça da Europa de clubes foi apresentada nos dias 2 e 3 de abril de 1955, numa reunião na qual estavam presentes personalidades como o selecionador da Hungria, Gusztav Sebes, um vice-presidente da Associação Francesa de Clubes, Ernest Bédrignans, além de Santiago Bernabéu e Raimundo Saporta, dirigentes do Real Madrid.
A proposta final foi publicada no dia seguinte no L’Équipe: um participante por cada um dos 16 países, jogos em casa e fora a meio da semana e à noite e a ideia de procurar uma televisão internacional que pagasse para transmitir as partidas.
O regulamento foi escrito à mão por Jacques Ferran, jornalista que na altura tinha 34 anos - doou esse manuscrito à UEFA, que o terá perdido - e no dia 4 de abril o L’Équipe titulou: «A Taça Europeia de Clubes nasceu envolta em alegria».
Tendo em conta que ficou definido que seria uma competição aberta, na qual entrariam os clubes campeões a cada ano, ficou estipulado que não fazia sentido serem os países fundadores a financiar a prova, sendo que o jornal também não tinha condições para o fazer.
O responsável dos clubes franceses foi nomeado presidente do comité executivo, destituído quando a UEFA decidiu entrar em campo, ainda que só após a pressão da FIFA tenha assumido definitivamente a liderança das operações para tornar realidade a competição sonhada pelos jornalistas do L’Équipe.
Sporting e Benfica nos primórdios, Ronaldo na história
A competição arrancaria na época 1955/56, com 16 equipas convidadas, sete das quais campeãs, tendo o Sporting sido o primeiro clube português a participar e a equipa a marcar o primeiro golo da competição, por João Martins. Os leões foram eliminados logo na 1.ª fase pelos sérvios do Partizan, depois de empatarem em casa (3-3) e perderem fora (5-2).
O Real Madrid conquistou essa edição – conquistaria as cinco primeiras – ao bater o Stade Reims por 4-3 na final.
Em 1960/61, o Benfica conseguiu terminar com o domínio dos merengues, sagrando-se bicampeão europeu no ano seguinte.
O FC Porto conquistou a prova também duas vezes, a primeira na época 1986/87, e a segunda em 2003/04, já com a denominação atual, Liga dos Campeões.
No que diz respeito aos melhores da história da competição, o Real Madrid é o clube com mais presenças (55) – seguido do Benfica e Bayern Munique (41) – e é também aquele que conquistou mais títulos (15), mais do dobro do segundo, o Milan que ganhou sete vezes.
Cristiano Ronaldo lidera três dados estatísticos da Liga dos Campeões: mais jogos (183), mais golos (140) e mais minutos (15.917).