Casa é onde a raquete se sente melhor e a serventia de Rafael Nadal foi sendo construída por onde a dele sempre funcionou com mais eficácia. Ao longo dos anos, o espanhol conquistou um império de terra batida – em que o grande bastião é Roland-Garros – e tem uma sala de estar um pouco por todos os sítios onde exista saibro.

Na Suécia, Nuno Borges entraria em court quase que como um convidado para os aposentos de Nadal. O público batia palmas a compasso ao maiorquino e, mesmo que não sendo hostil para o português, percebia-se quem era o favorito das bancadas. Não é que seja de bom tom, mas, perante a parcialidade de quem assistia, por que não estragar uma festa onde chegou sem convite?

Deverá ter sido estranho para Nuno Borges olhar para o outro lado da rede. Por muito que cada um dos oponentes tivesse direito a metade do court, Rafael Nadal, em terra batida, faz os adversários sentirem-se pequenos e presos ao domínio do rei da superfície. Pelo menos era assim nos tempos áureos, aqueles que fizeram do espanhol personagem do sonho que Nuno Borges teve oportunidade de agora viver.

A fotografia tirada pelos dois finalistas antes do jogo terá que ser emoldurada com o máximo cuidado. O processo de embelezamento do retrato podia começar antes de se saber o desfecho do encontro. Afinal, o momento histórico já estava assegurado. Nuno Borges jogou pela primeira vez diante do antigo número um mundial e tornou-se no quarto português a ser protagonista numa final do circuito ATP depois de João Sousa, Frederico Gil e Pedro Sousa.

No saibro de Bastad, na Suécia, havia pelo menos um contraste entre aquilo que é o palmarés do tenista maiato em relação ao de Nadal. O maiorquino disputava no Nordea Open, nada mais, nada menos, que a final número 131 da carreira. Não nos deixemos enganar pelo tom de azul da sua camisola, porque não é bebé nenhum nestas andanças.

Resistir a esse complexo de inferioridade seria o primeiro passo para Nuno Borges conseguir surpreender. Segurar um break na primeira vez que Rafael Nadal viajou para a linha de serviço foi um boost de adrenalina que custou erros não forçados em situações em que o ponto decorria a seu favor. E, mesmo assim, muito aguentou Borges que se esmerou para não vacilar sempre que o oponente se punha a tentar estrangular-lhe o lado esquerdo.

Ninguém assumia um domínio total sobre o serviço. Para fechar o primeiro set (6-3), Nuno Borges teve apenas que ganhar dois dos jogos em que a sua pancada marcou o início da jogada. Como quis assumir o controlo do encontro, viu-se o número 46 do ranking a oscilar entre as esquerdas cruzadas de ângulo muito aberto e os amortis que versavam sobre o amor profundo por aquele momento.

Rafael Nadal, por muito que a condição física o tenha vindo a afetar e o vá encaminhando para o final de carreira, continua a ser um adversário pantagruélico. Ainda que, no início do segundo set (6-2), tenha desferido uma pancada seca, errando a bola ao nível de quem joga ténis pela primeira vez devido a um ressalto irregular da farfalhuda fluorescente na linha final, a categoria não o deixa solitário. A reação foi do campeão que resta nele, mas não suficiente para derrotar aquele que, agora, também pode ser chamado pelo mesmo nome.

Quando o juiz decretou a vitória de Borgesssshhh, um pedaço de história foi escrito no ténis nacional.