Ricardo Velho é uma espécie de último soldado que resiste estoicamente depois do seu pelotão ser dizimado numa qualquer inútil guerra. Derradeira linha de defesa de um Farense a quem falta este ano muito talento individual e, também por consequência, coletivo, o guarda-redes é um pouco de tudo nesta equipa: salva-vidas, último recetor de esperança, um santo a quem se pode rezar por um milagre.

Contra o FC Porto, como em tantos outros jogos, Velho defendeu uma, duas, três, sete vezes, sete oportunidades flagrantes, dizem os dados oficiais. Desta vez contou ainda com um ajudante de luxo, os ferros que envolvem a baliza que tão bem guardou, que tiraram mais quatro bolas de golo à equipa de Vítor Bruno.

E só assim se explica que o FC Porto não tenha voltado às lides do campeonato com uma goleada. Houve produção ofensiva mais do que suficiente para tornar este jogo de início de tarde numa formalidade domingueira, mas para a última barreira ser quebrada foi preciso paciência e suor. Para lá dos postes e de Ricardo Velho, um erro de Otávio, mais um, diga-se, já que estamos a falar de recorrências, adicionou uma indesejável dificuldade, mas a vitória da equipa da casa é inquestionável.

Depois da paragem para as seleções (e fecho do mercado), Vítor Bruno lançou dois reforços para o onze inicial. Francisco Moura foi titular na lateral-esquerda e respondeu com personalidade e um jogo seguríssimo. Nehuén Pérez pouco teve que fazer, mas trouxe serenidade ao eixo da defesa. Vasco Sousa foi desta vez suplente, sacrificado para o treinador do FC Porto juntar Pepê e Galeno na linha atacante.

MIGUEL RIOPA

Com um início fulgurante, logo aos 3 minutos Nico avançou com classe pelo corredor central. Ivan Jaime recebeu, girou e lançou João Mário, que rematou cruzado para o poste - e estava dado o mote para um duelo bem particular dos jogadores do FC Porto com os ferros. Ricardo Velho estava também prestes a iniciar o seu show individual: aos 12’ salvou por instinto uma bola inesperada de Nico - e a seguir Otávio cabeceoua ao poste - e pouco depois não se atemorizou quando Pepê encheu o pé, dando o corpo às balas.

Depois de um período de menor intensidade de parte a parte, o FC Porto voltaria a carregar até ao intervalo. Aos 35’, mais uma grande defesa de Ricardo Velho, a ir ao chão para ir buscar um cabeceamento de Nico, garantia que o jogo ia para o intervalo sem golos. Muito graças ao guarda-redes dos algarvios.

Ainda se respiravam os primeiros ares da 2.ª parte quando Galeno foi agarrado na área e tratou ele próprio de marcar o penálti - acredite-se ou não, Ricardo Velho ainda tocou na bola. E quando parecia que o jogo seguiria o seu percurso natural, um erro técnico de Otávio, a falhar completamente a abordagem após lançamento lateral do Farense, permitiu a Tomané isolar-se e marcar um golo que parecia até então impensável, face à parca presença ofensiva da equipa. Mas não há como recusar presentes.

MANUEL FERNANDO ARAUJO

O golo fez abanar o FC Porto. Minutos depois do empate, Marco Moreno apareceu sozinho ao segundo poste para responder a um livre lateral, mas Diogo Costa respondeu com defesa atenta.

Nico voltaria a ver um remate seu embater teimosamente no poste aos 66’, momento que serviu para acordar o FC Porto. Ricardo Velho tirou novamente um golo a Pepê e aos 71, a trave, o 12.º jogador do Farense esta tarde, negou a vantagem à equipa da casa. Samu já tinha então entrado, mais envolvido depois do clássico da última jornada, e o espanhol seria decisivo para uma vitória que apareceu ainda antes dos dragões ficarem desesperados.

A 15 minutos do apito final, a um remate chapado de Alan Varela à entrada da área, Ricardo Velho respondeu com a eficácia do costume. Mas estava lá o avançado contratado ao Atlético Madrid para a recarga, afastando demónios de nova perca de pontos.

Que seria, diga-se, injusta. O FC Porto voltou a mostrar boa conexão no ataque e alguns padrões já bem trabalhados. Mas teve mais adversários do que estava à espera, num início de tarde de festa no Dragão, com muitas crianças nas bancadas, algo impossível de ver em jogos que terminam já perto das onze da noite.