Está tudo no nome. Bem, no nome e na história dos pais. Não tudo, mas muito, não toda a curta narrativa de vida de Learner Tien, mas boa parte das razões que distinguem o rapaz vindo ao mundo a 2 de dezembro de 2005.
Os pais, ambos imigrantes vietnamitas nos Estados Unidos, conheceram-se graças ao ténis, paixão que ambos partilhavam. Aí está parte da história. A outra parte está no nome: Huyen Tien é professora de matemática, então decidiu que o filho chamar-se-ia em homenagem ao ofício. Learner, aprendiz, estudante, aluno. Khuong Tien é advogado e decidiu que a filha partilharia uma dedicatória semelhante ao irmão. Chama-se Justice.
Os senhores Tien foram, como tantos vietnamitas, para os EUA em busca de vidas melhores. Ambos atravessaram o Pacífico com as respetivas famílias, Khuong de avião, Huyen de barco, esta numa viagem atribulada, longa, cheio de medos, como confessou ao “Tennis Channel”.
Khuong e Huyen, imigrantes vietnamitas na Califórnia, ingressaram na faculdade. As suas vidas cruzaram-se graças ao ténis, modalidade que gostavam de praticar, mais por divertimento do que por competição. O apreço foi passado para o filho, que pegou numa raquete pela primeira vez com um ano e meio de existência.
Learner começou a jogar por brincadeira. Mas Learner, um aprendiz, rapidamente se começou a destacar. No ambiente muito multicultural de Irvine, o rapaz chamou a atenção de detetores de talentos, que o levaram, com 10 anos, para um programa de desenvolvimento da federação norte-americana de ténis.
E, claro, Learner aprendeu. O canhoto vira sempre o jogo “como uma brincadeira de recreio”, mas a festa rapidamente ganhou contornos mais sérios. O menino tornou-se promessa.
Tien ganhou fama como um dos melhores adolescentes da muitíssimo competitiva cena do ténis dos Estados Unidos. Canhoto, tornou-se campeão nacional sub-18 quando tinha apenas 16 voltas ao sol, o que lhe valeu, em 2022, um convite para o quadro principal do US Open. Foi o mais novo norte-americano no major de Nova Iorque desde Donald Young, em 2005. Perdeu na primeira eliminatória contra Kecmanovic, mas forçou o sérvio a disputar quatro sets.
Apesar do gosto por jogar ténis, Learner não tinha, até então, particular interesse por ver encontros. Mas, em 2022, algo estava a surgir. Um fenómeno raro, chamado Carlos Alcaraz, irrompeu no circuito com a força dos predestinados. No mesmo US Open em que Tien se estreou, o espanhol venceu o título, com apenas 19 anos.
Ver aquilo “suscitou imenso interesse” no filho de vietnamitas, diz Learner em declarações à ATP. “Não costumava ver muito ténis, mas o Alcaraz mudou isso, atraiu-me para ser espetador. O fator entretenimento que ele trouxe foi fundamental, e vê-lo fez-me perceber mais de ténis, compreender melhor certas coisas.” Aprender, sempre aprender.
A época de 2023 traria, para o fã da série “Breaking Bad”, a consolidação como grande promessa. Foi finalista vencido nas versões júnior do Open da Austrália e do US Open. Em Nova Iorque, foi derrotado por João Fonseca, nove meses mais novo e uma constante na curta viagem de Tien pelo universo da bola amarela.
Mas adolescentes promissores há muitos. E problemas na transição dos escalões jovens para o brutal e impiedoso circuito ATP também. O californiano sentiu essas dores.
Literalmente sentiu-as. No começo da época 2024, uma fractura nas costelas obrigou-o a estar mais de três meses fora dos courts. O selvagem ranking mostrava as dores de crescimento: há 12 meses, Tien era 473.º da hierarquia. Em maio de 2024, há escassos oito meses, estava fora dos 400 primeiros.
Foi, justamente, no fim de maio do ano transato que Learner voltou à competição. Passara meses a trabalhar na sombra, melhorando, pulindo o seu jogo, assistindo a exibições de Alcaraz. A subida, quando começou, pareceu imparável.
O canhoto venceu os 28 encontros ao retorno aos courts. No final de julho já estava em 242.º, no final de agosto encontrava-se entre os 200 primeiros, em setembro entrou para os 150 primeiros. Conquistou o seu primeiro título Challenger, tornando-se o mais novo norte-americano a erguer um troféu no circuito secundário deste Frances Tiafoe, em 2016.
Voltou, via wildcard, ao quadro principal do US Open, onde Arthur Fils o bateu em quatro parciais. O ponto simbólico da ascensão, o reencontro de Learner com a sua história de jovem promessa, foi a presenças nas Next Gen Finals, o torneio de fim de temporada que reúne os melhores talentos jovens da modalidade. Foi finalista vencido, voltando a perder para João Fonseca.
Eric Díaz, o seu treinador, utiliza recorrentemente uma expressão muito na moda para definir o adolescente. “Ele tem aura, não dá bem para explicar”, comenta o técnico.
Mas há algo além desse toque mítico a ajudar o californiano. Depois de passar a fase de qualificação do Open da Austrália, Tien defrontou, na ronda inaugural do quadro principal, o argentino Ugo Carabelli, num embate onde não esteve particularmente inspirado. Somou 16 duplas faltas, cometeu 69 erros não forçados.
Mas há algo de Darwiniano na forma como Tien e o seu treinador falam do jogador. “Quando as coisas não correm bem, muitos tenistas entram em desespero. Ele fica calmo, adapta-se e encontra alternativas”, diz Eric Díaz. O jogador mencionou várias vezes a palavra “adaptação”. Em quase quatro horas, o adolescente derrotou Carabelli após cinco sets.
Como um ser vivo em busca da sobrevivência, Learner, o aprendiz, adapta-se. Molda-se às circunstâncias, ao momento. “Ele está em constante evolução, sempre em mutação. Agora está a tentar soluções diferentes na movimentação, coisas diferenças na forma como pega na raquete. Hoje [contra Carabelli] o lançamento da bola no serviço estava a sair mal, então ele ajustou automaticamente. Isso é excelente”, explicou Eric Díaz.
Se em maio estava fora dos 400 lugares cimeiros do ranking ATP, agora está às portas do top 100. Na atualização ao vivo da lista, no cálculo virtual que se faz tendo em contas os resultados de Melbourne, o norte-americano surge em 108.º, um posto abaixo da posição virtual de Jaime Faria, outro caso de incrível escalada recente no circuito profissional.
Na segunda ronda na Austrália, Learner Tien terá o maior desafio da sua curta carreira. Defrontará Daniil Medvedev esta quinta-feira (nunca antes das 9h, Eurosport), outro caso de adaptação, um mestre de xadrez feito tenista. O que quer Learner para esse encontro? Aprender, claro.
“Desejo continuar a melhorar. E melhorar em cima de vitórias, porque, lá por ganhar, não quer dizer que não haja espaço para crescer. Lá por estar num bom momento, não significa que tenha atingido o meu potencial máximo. É muito cool saber que há muita margem para crescer.”