
No passado domingo, Mirra Andreeva estendeu a sua sensacional sequência de vitórias (vai neste momento em 12 vitórias consecutivas), ao derrotar a bielorrussa Aryna Sabalenka, número um mundial, com os parciais de 2-6, 6-4 e 6-3 ao fim de pouco mais de duas horas, na final de Indian Wells.
Numa exibição em crescendo, a jovem tenista russa demonstrou que o título do WTA 100 no Dubai (conquistado em Fevereiro deste ano), não foi apenas um mero acaso, e que tem todos os recursos tenísticos para marcar uma era no ténis feminino.
Andreeva deu a melhor sequência ao maior título da sua carreira com a obtenção de mais um torneio WTA 1000, isto no espaço de menos de um mês, o que é absolutamente absurdo, e só ao alcance dos predestinados.
Com este título naqueles que muito consideram o “Quinto Grand Slam”, Mirra Andreeva ganhará certamente um maior respeito junto das suas adversárias, e será claramente tida como uma das grandes candidatas a se tornar uma nova vencedora de Grand Slam em qualquer dos restantes Majors do calendário tenístico deste ano de 2025.
Se o seu percurso no Dubai já impressionou (tendo derrotado antigas vencedoras de Grand Slam, como a checa Marketa Vondrousova, a cazaque Elena Rybakina, e a polaca Iga Swiatek), o de Indian Wells ainda foi mais brilhante, porque voltou a derrotar a cazaque Rybakina e a sempre traiçoeira e competitiva Elina Svitolina, mas também derrotou nas rondas finais as duas melhores tenistas do mundo da atualidade: Iga Swiatek e Aryna Sabalenka.
Sabalenka vinha extremamente motivada depois de conseguir “varrer” da pista a norte-americana Madison Keys e acabar com a sua série impressionante de 16 (!) vitórias consecutivas e desta feita, ter conseguido vingar a derrota surpreendente e certamente muito dolorosa na final do Open da Austrália deste ano.
Mas nem isso foi suficiente para derrotar Mirra Andreeva, que apesar dos seus 17 aninhos, já deixa patente uma maturidade competitiva enorme, e que tem crescido muito nos últimos meses de competição.
No Open da Austrália, tinha sido derrotada facilmente pela sua adversária da final, e desta vez (apesar de perder o primeiro set), manteve-se fiel ao seu plano de jogo, acreditou nas suas possibilidades e beneficiando de uma Sabalenka errática, conseguiu estabilizar o seu jogo e impor-se nos dois sets seguintes.
Quando alcançou a final deste torneio disputado no deserto californiano, Mirra Andreeva já tinha entrado na história como a mais jovem a conseguir tal feito desde 2001, depois da belga Kim Clijsters, multi-campeã de torneios de Grand Slam e antiga número um mundial.
E nesse lote de jovens tenistas a terem conseguido disputar a final de Indian Wells com menos de 18 anos, o seu recorde de precocidade é igualmente partilhado com a suíça Martina Hingis e as americanas Serena Williams e Monica Seles, três das melhores jogadores do mundo de todos os tempos.
Com o título obtido no passado domingo, Andreeva tornou-se na terceira tenista mais jovem de sempre a conseguir ganhar este torneio de elevado grau de importância, a par de Serena Williams e Martina Hingis.
Andreeva é muitíssimo bem treinada pela antiga tenista espanhola Conchita Martinez, que fez um trabalho fantástico com a espanhola Garbine Muguruza, tendo contribuído para que a espanhola tivesse uma carreira mais do que interessante, com presença na final do Open da Austrália e títulos em Wimbledon e em Roland Garros.
Martinez é conhecida no circuito pelo seu grau de exigência, mas igualmente pelo seu lado quase maternal (os jogadores passam mais tempo com a sua equipa técnica do que com a sua família). Devido às suas raízes, Andreeva necessitava de controlar os seus ímpetos para poder explanar todo o seu potencial, e Conchita está a conseguir fazê-lo gradualmente desde que começaram a sua colaboração, em meados do ano passado.
Tem sido um trabalho em que a paciência e a consistência tiveram que estar presentes do lado de ambas, nomeadamente de Andreeva, que não deixa de ser uma adolescente de 17 anos e que inclusive refere em várias entrevistas que gostaria de poder celebrar as suas vitórias com uma garrafa de champanhe, e que anseia por atingir a maioridade para o poder fazer.
Andreeva confia em Conchita, e Conchita confia em Andreeva. A confiança é fundamental na relação entre treinadora e jogadora, porque o circuito é bastante exigente a todos os níveis, quer do ponto de vista físico, quer do ponto psicológico.
Um tenista costuma ter um ego descomunal, e é necessário alguém que refreie os seus ânimos e que consiga que este não perca o foco e se mantenha humilde, continuando a trabalhar intensamente para colmatar as lacunas no seu jogo.
Aceitar as derrotas faz parte da vida de qualquer desportista. Num desporto individual, é ainda mais importante a maneira como lidas com a frustração e os momentos menos bons. É fundamental ser competitivo, mas um jogo de ténis não pode ser uma questão de vida ou de morte.
Um dos momentos mais impactantes do mundo do ténis no ano passado, foi claramente o abraço sentido de Daria Kasatkina (numa enternecedor ato de desportivismo) a uma devastada Mirra Andreeva, depois desta ter perdido a final do WTA 500 de Ningbo, há sensivelmente quatro meses.
De lá para cá, a evolução de Mirra no plano mental tem sido assombrosa nos últimos meses. Joga de forma mais solta, deixou de se pressionar tanto, o seu ténis começa a fluir cada vez mais, e os resultados seriam apenas uma questão de tempo, pois ténis tem em quantidades astronómicas.
É evidente que estamos a falar de uma tenista com uma grande margem de progressão, que irá perder mais do que ganhar (tal como todas as outras tenistas), mas para além de melhorar a sua jogadora do ponto de vista técnico, o maior trabalho de Conchita tem passado por dotar Andreeva de uma fortaleza mental capaz de fazer com que a tenista russa saiba lidar com as adversidades, as mudanças de ascendência durante os jogos e tenha aprendido a ganhar, mesmo jogando mal.
Para esse aspecto, Andreeva também referiu que tem sido fundamental o exemplo do basquetebolista LeBron James (um ídolo no qual ela se espelha).
Em declarações após ter ganho o título de Indian Wells, Andreeva afirmou o seguinte: “Lembro-me que o LeBron James deu uma entrevista e eu gosto de ver vídeos para me motivar antes dos encontros. Ele dizia que quando não te sentes a 100% fisicamente, podes escolher estar a 100% mentalmente e é isso que nos faz campeões. Tentei fazer isso e funcionou”.
A sua rival Aryna Sabalenka também lhe teceu rasgados elogios no discurso de entrega dos troféus. A tenista bielorrussa chegou a afirmar: “Gostava de ter sido tão inteligente como ela quando tinha 17 anos. Nota-se que tem as pessoas certas à sua volta. Gostava de ter tido uma equipa como a dela muito antes de a ter conseguido formar”.
O balneário do ténis feminino costuma ser uma luta de egos e um mundo muito tóxico, e o entorno do tenista é essencial, daí que Sabalenka sabe que também demorou a chegar ao estrelato, por não ter sido bem acompanhada no início da sua carreira.
O céu é o limite para esta jovem adolescente (completa 18 anos em fins de Abril). É uma jogadora bastante completa, tem um grande jogo de rede (basta dizer que é a atual vice-campeã olímpica de pares), é consistente quer na sua pancada de esquerda quer na sua pancada de direita.
É confiante nas suas capacidades, tem igualmente uma grande resposta ao serviço, e um primeiro serviço bastante eficaz, onde faz da colocação a sua arma, pois o seu jogo não é construído à base de pancadas para “agredir” as suas adversárias através da potência do mesmo.
Mas o seu QI tenístico torna-a numa jogadora bastante perigosa, que também apresenta um jogo de pés invejável e uma extraordinária coordenação motora, que a permitem manter-se sólida e fisicamente presente em trocas de bola mais longas.
Terá que melhorar o seu segundo serviço (pois continua a ser bastante permeável), mas as bases do seu jogo já são bastante sólidas. Veremos como lida com o fato de ser uma das grandes favoritas a conquistar o torneio que se segue: o WTA 1000 de Miami. Será uma das primeiras grandes provas de fogo e um teste à sua capacidade de lidar com a pressão das expectativas.
A insaciável Mirra Andreeva conquistou o deserto e chegou ao paraíso. A princesa virou rainha.