
Armando Sá marcou a primeira década dos 2000 no panorama nacional. Dentro dos relvados era considerado um lateral moderno, capaz de fazer toda a linha, algo que aos dias de hoje está na moda. Brilhou em Portugal, Espanha, Inglaterra e Irão, abraçando em seguida uma carreira fora das quatro linhas, em crescendo e recheada de trabalho, tal como fizera no passado enquanto jogador. Hoje em dia encontra-se no Canadá, onde soma algumas aventuras, mas o próximo objetivo já está definido: ser treinador principal.
BnR: Olá, Armando Sá. Obrigado por teres aceitado o nosso convite para esta entrevista!
Armando Sá: O gosto é todo meu.
BnR: Para quem não te conhece ou não te viu dentro das quatro linhas, fala-nos de ti enquanto jogador…
Armando Sá: Eu cheguei muito novo a Portugal, vindo de Moçambique. O meu pai é português e a minha mãe é moçambicana. Saí do país em tempos difíceis, eram tempos complicados. Tinha 12 anos quando cheguei a Portugal. Comecei a jogar futsal e futebol nas escolas, também na rua, com os amigos, naquele antigamente. Jogávamos mesmo na estrada, no meio dos carros. Começávamos a jogar e não parávamos. Eu sou ali da Amadora, do Casal de São Brás, e começaram-me a dar a alcunha do Pelé de Casal de São Brás. O nome começou-se a espalhar pelas zonas todas, nessa parte da Amadora. Entretanto decidi jogar federado no Casal de São Brás, mas futsal, jogava muito futsal. Comecei a fazer uns golinhos, a dar nas vistas. O clube tinha muito bons jogadores na altura. Aquela zona sempre teve bons jogadores e muita qualidade. O clube começou a criar o futebol de 11. Aí comecei a jogar futebol de 11, a entrar, a disfrutar, a entender o que era o futebol de 11. Comecei cada vez mais a crescer como jogador, como atleta e a tentar levar aquilo. A fama começava a puxar e a exigir mais. Levava as coisas a sério. Na escola um professor meu, o João Couto, disse-me para ir fazer captações ao Belenenses e eu aceitei. Acabei por ficar no Belém e aí começa a história. Toda a minha trajetória foi uma trajetória de luta, não foi nada dado. Eu conquistei esta trajetória e trabalhei para conseguir todos os meus objetivos. Não foi nada fácil. Também tive de correr atrás na transição para sénior. Tive de mostrar o meu valor através das pessoas. Cheguei à Primeira Liga e aí também tive de trabalhar para conquistar o meu lugar nesse escalão. Nessa altura estava no Rio Ave. Conquistei o meu espaço e comecei a atingir patamares altos….
BnR: Chamavam-te de Pelé quando eras mais jovem. Como é que acabaste a ala direito?
Armando Sá: Eu fazia muitos golos, era um 10, um 9. Eu cheguei a jogar no Damaiense, antes de ir para o Belenenses. Eu fiz mais de 40 golos por época, eu era goleador. Porém, era muito franzino (risos). Levava muita porrada e no Belém as coisas ficaram mais sérias, com campeonatos nacionais. Meteram-me a extremo nessa altura. Era rápido, sempre fui um jogador muito rápido e muito dinâmico. Também era muito bom no um contra um. O meu treinador, o filho do Mário Wilson, falou comigo e disse-me que tinha tudo para ser profissional, mas para o ser tinha que ir para lateral direito. Ele disse-me que do meio campo para a frente os portugueses não apostam muito na formação. Se reparares é verdade, agora há mais portugueses, mas antigamente eram jogadores que vêm de fora, com muita experiência, que os clubes investem financeiramente. Ele disse que eu tinha as caraterísticas suficientes para fazer a linha toda. Colocou-me num jogo contra o Sporting, a marcar o Dani. O jogo correu muito bem, o Dani era a grande referência do Sporting nas camadas jovens, era uma estrela, nem sei dizer bem…
Hoje em dia é uma facilidade com os 3x4x3, os laterais fazem aquilo tudo. Eu tinha já essa habilidade de poder atacar e defender, fazer o corredor todo sozinho, dominar essa zona. Tinha isso tudo.
BnR: Era o Ronaldo antes de existir o Ronaldo…
Armando Sá: Era exatamente isso. Eu estava a marcar o Dani e as coisas correram muito bem. Lá fiquei eu como lateral, comecei a apanhar o gosto de jogar a lateral e de fazer o corredor. Não havia muitos laterais na altura de subida, que atacavam muito. Eu acho que sou da geração em que isto começou.
BnR: Encaixarias bem num sistema de três centrais, suponho…
Armando Sá: Isso! Hoje em dia é uma facilidade com os 3x4x3, os laterais fazem aquilo tudo. Eu tinha já essa habilidade de poder atacar e defender, fazer o corredor todo sozinho, dominar essa zona. Tinha isso tudo. Era um lateral moderno. O Belenenses tinha um lateral que era o Chico Fonseca. Tínhamos uma equipa muito forte nos seniores, com o Taira, o Emerson, tínhamos jogadores mesmo muito fortes. Eu tinha o objetivo de chegar à equipa principal do Belém. Foi assim que fui para a lateral.
BnR: Acabaste por chegar à Primeira Liga como lateral e vingaste na posição…
Armando Sá: Tinha aquela veia de querer marcar golos e querer aparecer (risos). Mas entendi perfeitamente e comecei a gostar de jogar na lateral direita. As pessoas começaram-me a encher os ouvidos, que eu podia ser um bom lateral. Comecei a entender mais o que era defender, o que era jogar na linha.
BnR: Destacaste-te no Sporting de Braga e conseguiste uma transferência para o Benfica. Sentes que esse foi o pico da tua carreira? Ou foi mais tarde?
Armando Sá: Eu já no Rio Ave fiz grandes épocas. Fui Jogador Revelação do Rio Ave, fui Revelação da Liga. Aparecia naquelas equipas do ano dos jornais. Ganhei alguns prémios relacionados com a lateral. É verdade que no Braga tínhamos uma equipa muito boa, estávamos a lutar por outros objetivos. Encaixei muito bem na equipa do Braga. Acho que foi o começar e mostrei-me para outros patamares que eu tinha qualidade para chegar onde acabei por chegar.
O que é a grandeza de um clube como o Benfica? Não quer dizer que as outras instituições que eu joguei sejam pequenas, mas no Benfica acabei por perceber o que era jogar lá. Muitas vezes falamos em pressão, na exigência de se jogar no Benfica.
BnR: Foste treinado pelo Jesualdo Ferreira, que é um técnico marcante do séc. XXI, no panorama nacional. Como foi a experiência?
Armando Sá: O Jesualdo Ferreira foi importantíssimo na minha contratação para o Benfica. Tive uma boa relação com ele. O professor sempre foi uma pessoa muito correta e sempre tentava ensinar fundamentos. Ele tem essa qualidade de pôr fundamentos nos jogadores, ensinar como ajustar o corpo. Foi interessante e tenho uma boa relação com ele. O professor veio ao meu casamento na altura. Sem ele não era possível, ele era o treinador principal do Benfica e ele aprovou a minha contratação.
BnR: Como foi a experiência no Benfica?
Armando Sá: Entrei para um mundo totalmente diferente. O que é que é o Benfica? O que é a grandeza de um clube como o Benfica? Não quer dizer que as outras instituições que eu joguei sejam pequenas, mas no Benfica acabei por perceber o que era jogar lá. Muitas vezes falamos em pressão, na exigência de se jogar no Benfica. Foi maravilhoso, foi muito bom, ver o que era a história e a grande do Benfica. Saber que houve alguns moçambicanos também passaram por lá e fizeram história. Eu na altura convivia com o Eusébio, o Coluna, o Shéu, eles iam ao balneário. Sentia uma responsabilidade grande dentro de mim para poder colocar essas pessoas orgulhosas. Acho que fui muito bem acolhido por toda a gente. Mas é uma pressão enorme, tens que estar mentalmente muito forte. Quando o jogo te corre mal, o teu vizinho é do Benfica, vais meter gasolina, a pessoa que mete a gasolina é do Benfica… Tens que estar mentalmente preparado. Podes ter problemas se não tiveres essa mentalidade. É um clube muito grande.
BnR: Acreditas que falta no teu palmarés uma Primeira Liga pelo Benfica?
Armando Sá: Por um lado sim. Eu tive numa transição do Benfica. Da mudança do estádio antigo para o novo, treinávamos às vezes no Casal de São Brás, também íamos treinar no Jamor. Os primeiros anos, eu estive la três anos e qualquer coisa, o primeiro ano, aqueles seis meses, foi de adaptação ao Benfica. O segundo ano existiu essa tal transição e no terceiro ano é que as coisas estabilizaram. Quando estabilizaram nós ganhámos a Taça de Portugal, fizemos uma grande segunda volta na Primeira Liga, fomos eliminados da Taça UEFA nos oitavos de final pelo Inter Milão. Estávamos a subir de rendimento e via-se que futuramente estávamos próximos do título. Eliminámos o FC Porto do José Mourinho na Taça de Portugal. O Benfica não ganhava há oito anos a Taça de Portugal. Nesse ano apareceram-me propostas de França e de Espanha. Sentia que o ano que vinha ia ser um ano de sucesso. A base da equipa estava feita. Dito e feito. Assinei pelo Villarreal, o Benfica manteve praticamente a equipa, houve uns ajustes, e o clube foi campeão em 2004/05. Sinto-me parte dessa conquista. Estive inserido naquele grupo. Sabia o que se estava a passar. Sinto-me parte dessa conquista também. mas claro que eu gostaria de ter a mesma experiência. Também vivi a ida ao Jamor e ao Marquês de Pombal, viver aquela festa e foi espetacular. Imagino e vi quando o Benfica é campeão. Claro que fiquei um pouco engasgado com a falta da conquista do título. Mas estava bem onde estava, fui para uma equipa de grande nível, de La Liga.

BnR: Como surge o convite para rumares ao Villarreal?
Armando Sá: Depois do terceiro ano de Benfica, começar a fazer uma época muito mais regular… eu tive no Benfica altos e baixos. Cheguei muito bem, mas depois o segundo ano penso que senti muito as transições. O terceiro ano acho que comecei a apanhar o meu espaço, a praticar o meu futebol. Com os jogos que acabei por fazer havia interesse de alguns clubes. Apareceram várias equipas. O Villarreal foi uma delas. Eles venderam o Belletti ao Barcelona e perguntaram ao Camacho informações sobre mim. O Camacho deu boas referências e o Villarreal acabou por chegar a mim e começámos a negociar. Foi tudo muito fácil. Era um objetivo para mim jogar na La Liga e foi fácil chegar ao acordo.
BnR: O que achaste do nível de competitividade? Enfrentaste craques como o Ronaldinho Gaúcho…
Armando Sá: É totalmente diferente da Primeira Liga. A nossa liga não é fácil de jogar, longe disso. As pessoas podem pensar que até é, mas não é. É uma liga muito rápida, tem muito contacto. Quando eu chego a Espanha, à La Liga, sentes a qualidade do jogador, todas as equipas tinham craques. Hoje em dia não vejo isto tão assim. No tempo em que tive lá todas as equipas tinham dois ou três craques. O Bétis tinha o Joaquín, o Sevilha tinha o Saviola, o Júlio Baptista, tinhas de tudo. A qualidade era outra. O jogo era diferente. Foi uma experiência muito boa. Partilhar o balneário com grandes craques como o Riquelme ou Forlán foi fantástico. Defrontar jogadores de nível mundial também foi ótimo. Jogar contra o Zidane, Ronaldinho, são coisas únicas… até o Figo estava lá na altura. Enfrentar craques destes é muito bom.
Eu não acredito que os treinadores mais antigos não entendam de futebol, não tem nada a ver uma coisa com a outra. Claro que entendem muito, se calhar melhor que os atuais, mas em termos de gerir o grupo e entender a nova geração, há uns que ficaram um pouco para trás.
BnR: Acabaste por ter igualmente treinadores de topo. Há um nome que eu ressalvo, que é o do Manuel Pellegrini. O que tens a dizer sobre ele?
Armando Sá: É um gentleman. Um senhor. Ele tem uma personalidade muito forte e foi um desafio para ele também. ele também tinha chegado a Espanha. Foi um desafio para ele esse Villarreal. Ele acabou por apanhar uma equipa fantástica, o submarino amarelo. A equipa gostava de jogar bola no pé, tinha o estilo tiki taka. Ele conseguiu juntar aqueles craques todos e fazer daquilo uma família. Conseguiu tirar os egos, o chamado management. Conseguimos todos entender, partilhar e jogar da mesma maneira, estávamos na mesma página, na mesma sintonia. Ele foi muito importante na caminhada do Villarreal. Ele depois teve muito sucesso, passou pelo Manchester City, pelo Real Madrid, agora está no Bétis.
BnR: Qual é o segredo da longevidade de treinadores como ele? Qual a tua opinião, já que fazes parte de uma equipa técnica?
Armando Sá: Ele continua no topo. Eu tive dois treinadores que ainda estão no topo, que é o Pellegrini e o Ernesto Valverde, que me treinou no Espanyol. O Pellegrini jogou agora com o Vitória SC e o Valverde com a AS Roma. Eu acredito que o treinador que continuar a acompanhar a evolução do futebol vão conseguir vingar. Existem os treinadores old school. O que mais rápido conseguir adaptar-se à nova geração ou ao novo futebol, ou à nova maneira de lidar com os jogadores terá sucesso. Os jogadores de antigamente não têm nada a ver com os atuais, não digo que sejam melhores ou piores, mas tem que se lidar de maneira diferente. Eu acredito que o treinador que consegue, de uma maneira ou de outra, gerir os grupos, entender o grupo, que tipo de grupo é que tem, vai ter sucesso. Temos que entender onde é que estamos inseridos. O Pellegrini e o próprio Ernesto Valverde são pessoas que estão a acompanhar a evolução do futebol e tentam entender o novo jogador. Esses treinadores vão durando por causa disso. Eu não acredito que os treinadores mais antigos não entendam de futebol, não tem nada a ver uma coisa com a outra. Claro que entendem muito, se calhar melhor que os atuais, mas em termos de gerir o grupo e entender a nova geração, há uns que ficaram um pouco para trás. Outros seguiram. Claro que há outras coisas no caminho, há empresários…

BnR: Nesta fase em que atuaste no estrangeiro, já começavas a pensar em todos estes aspetos? De ser treinador, pensar numa equipa técnica….
Armando Sá: Há pessoas que podem estar surpresas, eu não tinha intenções nem pensava muito nisso. Quando estava a acabar a minha carreira, no Irão, houve um último ano em que comecei como jogador-treinador. Comecei a dar palpites. O meu treinador no Sepahan, que é o selecionador nacional do Irão, perguntava-me coisas. Eu entrava nas conversas e dava as minhas ideias. Dava também alguns palpites e eles ouviam-me. Eles até brincavam, diziam ‘Armando Coach’ (risos). Comecei a entender e a mudar mentalmente. Comecei a pensar que se calhar posso ver onde é que aquilo ia dar. Surgiu o tal bichinho, mas tive de fazer uma transformação do que eu era como jogador para treinador. São coisas totalmente diferentes. O meu comportamento é totalmente diferente. Não há comparação possível. Não consigo pensar com o egoísmo de jogador. Isso não entra na minha etapa fora das quatro linhas. Em Portugal acabei por desenvolver-me mais.
BnR: Como surgiu o convite para ires para o Canadá?
Armando Sá: Eu tenho um amigo, que foi jogador do Ajax na geração forte do Kluivert, do Davids. Eu vim jogar ao Canadá, a representar o Benfica Legends. Viemos aqui jogar contra o AC Milan. Essa equipa tinha o Papin, o Maldini, estava cheia de craques, não era uma equipa qualquer. Em conversa acabei por saber que esse meu amigo estava aqui no Canadá e estava a gerir um clube. Ele convidou-me para trabalhar lá no Kleinburg, que é um clube de formação. Ele estava num processo de formação, a construir o clube. Ele perguntou-me se eu queria ser o Team Manager e trabalhar com um grupo mais competitivo, ensinar os jovens. Eu como já estava neste processo, os meus primeiros passos foram no Cultural da Pontinha. Treinei ali os Sub-15, fiz lá um aninho. Estava a tirar os cursos também. Eu decidi aceitar. Levei a minha vida para o Canadá e, entretanto, inscrevi-me aqui no curso de treinadores. Por que fiz isso? Para eu conhecer esse network market, fazer-me conhecer ao futebol canadiano. Tirei o máximo nível da licença do Canadá. Acabei por conhecer pessoas, fazer contactos e comecei a entrar no futebol. Agora estou no nível profissional.
BnR: Chegaste a abrir a tua própria academia. Como é que surgiu essa ideia?
Armando Sá: Começaram-me a surgir muitos miúdos, muitos jogadores, a pedirem-me treinos privados. Cheguei a um ponto em que já tinha uma quantidade muito boa de miúdos. Comecei a ficar sem muito tempo e tinha que fazer uma escolha. Como comecei o processo do desenvolvimento dos jovens, de como trabalhavam, decidi começar esse desafio. Comecei assim a academia e dava lá os treinos, apoiando também o clube em si. Ia gerindo aqueles miúdos, que vinham de vários sítios. Havia muitas crianças, muitos pais que vinham e pediam. Tem tudo a ver com o meu background como jogador. Depois comecei a montar equipas, a participar em algumas competições. Depois veio a pandemia… ainda fazíamos aqueles treinos por Zoom, mas não é o mesmo, não tem mesmo nada a ver. Todos os negócios foram um pouco abaixo e eu optei por ir por outra área.
Eustáquio é o cérebro da seleção do Canadá. Para mim é o jogador mais importante, em termos de estrutura.
BnR: Já tinhas entrado em contacto com o teu seguinte projeto, o Pacific FC? Foi algo que tinhas planeado?
Armando Sá: Não estava planeado. Entretanto surgiu a Liga Canadiana, porque na altura não existia uma liga caseira. Tem apenas sete anos. É um projeto praticamente novo. Quando eu soube que havia uma liga profissional comecei a ver as possibilidades que existiam de poder entrar. Isto é um bicho que está dentro, sempre fui muito competitivo. Na altura ligou-me o meu atual treinador no Pacific FC, o James Merriman, e perguntou-me se estava disponível para trabalhar com ele. Disse-me que tinha um bom background como jogador e tinha uma muito boa reputação como treinador no Canadá. Eu disse que sem dúvidas queria ir. Vou para o meu quarto ano.
BnR: Qual o nível do campeonato?
Armando Sá: Essa pergunta é um pouco complicada. Eu posso dizer-te que pode ter um nível de uma Liga 3, aqui em Portugal, mas também pode ser uma Segunda Liga. No nosso campeonato até pode ser uma Liga 3, mas quando enfrentamos equipas da MLS, quando jogamos à Champions League da América do Norte, onde jogamos com equipas de outros países, sinto que nos batemos muito bem e conseguimos até vencer essas equipas. É complicado dizer qual é o nível.
BnR: Mas sentes que é um projeto que está em crescendo…
Armando Sá: Sinto isso, sem dúvida. No primeiro ano o Pacific FC foi campeão, depois chegámos às meias finais da Taça do Canadá. Fomos à Champions League da América do Norte e passámos a primeira eliminatória, contra uma equipa da Jamaica, e a seguinte estivemos perto, perdemos contra um clube da Costa Rica. Já tivemos equipas daqui a eliminar clubes da MLS. Está a evoluir bastante, há jogadores de outro nível, com mais qualidade. A Liga em si é uma grande aposta. A seleção também sai a ganhar, é muito boa e pode surpreender neste Mundial 2026…
BnR: Ia tocar nesse ponto, vem lá um Mundial 2026 que o Canadá faz parte da organização….
Armando Sá: Tem a sua quota parte na organização. Tem ótimos jogadores, o Alphonso Davies, o Eustáquio, o Jonathan David, jogadores que jogam em grandes equipas na Europa. O treinador, o Jesse Marsch trouxe uma filosofia de jogo diferente, uma competitividade mito grande. Tudo isto encaixa. Se a seleção anda a um nível bom, o campeonato também tem que começar a produzir jogadores para mandarem para a seleção. Está tudo num bom caminho. Acho que está a seguir os mesmos passos da MLS, porque a MLS começou assim, até acho que começou pior, daquilo que ouvi dizer. O campeonato está num bom caminho, há mais equipas a querer entrar. Temos oito equipas. Faz-se quatro voltas e depois tem o estilo americano, com os playoffs. O primeiro joga com o quarto e o segundo com o terceiro. É um estilo interessante, diferente. Acho que está num bom caminho. A qualidade de jogo e de jogadores está a aumentar. Há muita procura e a venda de jogadores canadianos para as equipas da MLS e para as segundas divisões europeias tem aumentado. Há muita qualidade, há muitos jogadores a serem vendidos. Os jogadores têm oportunidades na Europa. No meu clube. Aqui no Pacific FC, acabámos por vender o nosso guarda-redes, o Emil Gazdov, foi para o Montréal Impact, que joga na MLS. Um miúdo de 21 anos, com muita qualidade. A visibilidade começa a aumentar.
Tenho outros objetivos e quero ser treinador principal, mas também não tenho nenhum problema de entrar numa equipa técnica em que eu possa valorizar-me e que me possa ajudar.
BnR: Em Portugal associamos o Canadá ao Eustáquio e ao Steven Vitória…
Armando Sá: O Eustáquio é o cérebro da seleção do Canadá. Para mim é o jogador mais importante, em termos de estrutura. Claro que existem outros, o Davies, o Jonathan David, o Buchanan… Há outros jogadores na Bundesliga. O Steven Vitória foi uma referência na seleção. Toda a gente aqui o respeita. Ele foi também um dos pilares de tudo isto.
BnR: Vamos falar do teu futuro. Para quando uma aventura como principal? Já estás a pensar nisso?
Armando Sá: Já estou a pensar nisso. Já estou no processo de treino há algum tempo, já fiz a minha formação de camadas jovens e passei por todos os escalões. Já estou no nível profissional já há algum tempo. O meu passado também me dá a experiência, os cursos que tirei… claro que chegou o momento de eu pensar noutros voos, em outros objetivos. Tenho outros objetivos e quero ser treinador principal, mas também não tenho nenhum problema de entrar numa equipa técnica em que eu possa valorizar-me e que me possa ajudar. Neste momento sou treinador adjunto, mas tenho esse objetivo e acho que pode vir um novo passo. O mais importante é estar preparado para isso, para quando a oportunidade aparecer. Tenho a certeza de que estou preparado. É uma questão de oportunidade.
BnR: Verias com bons olhos um regresso a Portugal?
Armando Sá: Portugal é casa, sinto-me em casa. É onde está a minha família, os meus filhos. Estão todos aí em Portugal. É um objetivo de poder também trabalhar em casa, em Portugal. Gostaria mesmo muito de poder ter um projeto em Portugal.
BnR: Quem é o teu treinador referência? Se lhe podemos chamar assim…
Armando Sá: O ano passado estive a trabalhar no Brighton, com o Roberto De Zerbi. Gostei muito de trabalhar com ele, gostei muito de ver os processos dele. Todos os anos, quando tenho possibilidade de ir a alguns clubes, aproveito para aprender de maneira a evoluir. Vejo novos processos. Gostei mesmo muito do Roberto De Zerbi. Acompanho o seu trabalho, vejo os jogos dele no Marselha, vejo a forma como ele trabalha. Claro que há outras referências, como o Mourinho, esses clássicos. Gosto muito também do estilo do Ruben Amorim, da forma como ele trabalha e acho-o um grande treinador. Também gosto do treinador da Atalanta, o Gian Piero Gasperini.
tens que te ajustar e pouco a pouco incutir a tua própria mentalidade, a tua identidade no jogo e nos jogadores. Eles têm que morder a ideia, entender a tua ideia, isso é muito importante.
BnR: Porém, às vezes é complicado para um novo treinador ter uma equipa que se adapte às suas ideias, por vezes até funciona um pouco ao contrário, com o técnico a adaptar-se ao plantel que existe….
Armando Sá: Na minha maneira de ver, quando chegas a uma casa tens que olhar e ajustar-te ao que tens na casa. Se chegas a meio da época a uma equipa, acho que o primeiro passo é entender o que tens à frente de ti, o que podes trabalhar com os jogadores. Não faz sentido nenhum eu querer impor um estilo de jogo e não ter jogadores para isso. Acho que vou estar a remar um pouco contra a maré. Se me pedem resultados imediatos terá que ser assim. A longo prazo é diferente, aí sim pouco a pouco vou colocando a minha ideia e no ano seguinte vou estabilizar. Quando te pedem resultados a imediato tens que te ajustar onde estás, entender o que tens e trabalhar no que tu tens para alcançar os objetivos. Sou muito versátil como treinador, gosto muito de versatilidade. Acho que os jogadores são muito inteligentes e às vezes as pessoas não pensam isso. Os jogadores são capazes de entender várias maneiras de jogar, várias táticas. Os jogadores têm essa capacidade. Depois tens que te ajustar e pouco a pouco incutir a tua própria mentalidade, a tua identidade no jogo e nos jogadores. Eles têm que morder a ideia, entender a tua ideia, isso é muito importante.
BnR: Falemos um pouco de atualidade. Tens acompanhado a Primeira Liga? O que tens achado da luta pelo título?
Armando Sá: Tenho acompanhado bastante. Vejo a Primeira Liga, a Segunda Liga, a Liga 3, é muito importante para mim acompanhar o futebol português. A luta está interessante, o campeonato está competitivo, embora eu ache que este é um dos piores anos, parece-me que o campeonato está mais fraco. Sporting, Benfica, FC Porto e o Braga estão todos irregulares, então ninguém consegue fugir, continuam naquela batalha. Ninguém se conseguiu destacar e sair destacado. Acho que estamos num momento crucial para isso. O Benfica está mais estável, começou a atingir uma estabilidade. O FC Porto continua neste processo de mudança, a tentar entender as ideias do Martín Anselmi. Neste caso ainda não encaixaram muito bem. Os jogos para eles têm sido muito difíceis, é tudo muito complicado. O Sporting, na minha ideia, tem uma grande equipa, gosto muito do Rui Borges. Está um pouco intermitente. Neste momento, o Benfica é o que está mais estável, agarrou uma estabilidade e tem um jogo a menos. Isso pode influenciar.
BnR: Conhecendo a realidade do Benfica como conheces, se o Benfica falhar o título este ano, acreditas que os sócios não vão perdoar a direção em outubro, nas próximas eleições?
Armando Sá: O Benfica sempre foi um clube muito exigente. Os sócios nunca perdoam uma derrota do Benfica. A própria equipa do Benfica está muito bem reforçada em todos os setores, tem muita qualidade. Por vezes mostram muito bom futebol. O Bruno Lage tem feito um bom trabalho nesse aspeto. Nisto também ajuda não ter lesões, isso é importante. Contratou-se o Manu Silva, que é um brilhante jogador e perderam logo o Manu Silva por lesão. O Florentino também esteve parado. Os sócios não querem saber muito disso, eles querem é saber de vitórias e de ganhar, benfiquista é assim. Isso são coisas que passam ao lado na família benfiquista.
Os jogadores São todos diferentes, eu também era um jogador único, tinha a minha maneira, mas gosto muito do Álvaro Carreras, faz todos o corredor e aparece
BnR: Como é que tens acompanhado do Geny Catamo (que é moçambicano, país de origem de Armando Sá)? Ele também faz a ala direita, como tu fazias…
Armando Sá: Esteve em destaque com o Ruben Amorim, começou a ganhar o seu próprio espaço, estava muito bem encaixado naquela forma de jogar, decidia jogos. Agora esteve lesionado, baixou um pouco o rendimento, mas é um jogador com muita qualidade, muito rápido, num 1×1 é muito bom, tem passe e golo. É um jogador muito interessante e é um orgulho saber que é moçambicano.
BnR: Proponho-te um desafio para fecharmos. Quem achas que é o jogador mais parecido ao Armando Sá? A parte do Pelé não vale (risos)
Armando Sá: A parte do Pelé podes esquecer (risos)… mas em Portugal?
BnR: Pode ser o que tu quiseres, se for em Portugal, melhor…
Armando Sá: É um desafio difícil, é mesmo muito complicado. São todos diferentes, eu também era um jogador único, tinha a minha maneira, mas gosto muito do Álvaro Carreras, faz todos o corredor e aparece. Em termos de laterais da Primeira Liga gosto muito dele.
