Hwang In-beom, Quinten Timber e Ayase Ueda nasceram em partes muito distantes do globo. O primeiro na Coreia do Sul, o segundo nos Países Baixos, o terceiro no Japão. Terão tido infâncias diferentes, experiências variadas, vivências com pouco em comum. Ou com muito, quem sabe.
Sabemos é que, por 90 minutos em Lisboa, estes homens uniram-se para atormentar a noite do Benfica. Podemos juntar aqui Antoni Milambo, outro neerlandês para a anedota que para as águias não fará rir.
Depois de seis vitórias em seis jogos com Bruno Lage, adeus pleno de triunfos, adeus a viver só com sorrisos. O 3-1 deixa avisos e sinais de alerta, sobretudo quando só agora chegam os grandes desafios na Liga dos Campeões: seguem-se visitas a Bayern Munique e ao Mónaco.
O Feyenoord de Brian Priske, o homem que substituiu Arne Slot quando o técnico foi para o Liverpool, rapidamente mostrou ao que vinha. Circular a partir de trás, ligando o jogo com critério e paciência, montando teias que confundiam e desmontavam a desorganizada pressão do Benfica.
Bola nos centrais, segura na paciência de Trauner. Bola na lateral, agitada na irreverência de Lotomba. Esperar pela pressão, passar depois da espera, progredir. O Benfica cedo começou a cair na artimanha dos neerlandeses, mas não foi por ser repetida que a fórmula foi rapidamente contrariada. Quando a teia chegava ao meio-campo, Hwang In-beom dominava todo o relvado, todo o estádio, toda Lisboa. Assim se cozinhou a primeira vitória neerlandesa na Luz desde 1974/75.
O 3-1 de Antoni Milambo, assinado aos 92', não foi mais que a confirmação de um duelo que para o Benfica começou desorganizado, prosseguiu descrente, continuou impaciente e acabou, simplesmente, triste. Sem soluções.
Os vice-campeões da Eredivisie juntaram o bom futebol ao golo logo aos 12'. Lançado em velocidade, Igor Paixão levantou a cabeça e Ueda, perante a orfandade do matador mexicano Giménez, atirou para o 1-0. Como se marcar não fosse confirmação suficiente do bom início, logo a seguir nova boa saída de pressão deu espaço a Igor Paixão, que atirou forte a escassos centímetros do poste direito de Trubin.
Perante o cenário de dificuldades, Bruno Lage era um homem agitado no banco. Na verdade, o treinador espelhava a postura da equipa, com dúvidas, sem saber se estar sentado ou de pé, se refilar com a equipa ou com o árbitro. Aos 20', chegou a primeira grande oportunidade do Benfica, num canto à Di María que Bah atirou ao poste.
No entanto, a superioridade visitante prosseguia. A pressão das águias ia abrindo brechas para que as trocas de bola do Feyenoord galgassem metros, convidando a que o jogo chegasse ao metrónomo que há em Hwang e ao veneno que vive em Timber.
Se o sul-coreano — que chegou a Roterdão há menos de dois meses mas parece ter nascido no porto da cidade — manda no meio-campo, o capitão acrescenta o perigo às jogadas. Já depois de ter forçado Trubin a boa defesa e de Ueda ter visto o seu bis ser anulado por falta sobre Otamendi, Timber assistiu mesmo Milambo para o 2-0. O médio fez um túnel a Otamendi e dobrou a vantagem do emblema campeão europeu em 1970.
Em cima do intervalo, Di María atirou um livre para defesa atenta de Timon Wellenreuther, mas não foi uma noite inspirada para o craque argentino. O campeão do mundo viria a ser substituído aos 65', numa dupla troca que também envolveu Florentino do lado dos que saíram, entrando Amdouni e Beste. Era Lage à procura de uma resposta.
A reação do Benfica assentou tanto nas mudanças de Lage como nas de Priske. Quando o Feyenoord nem sofria muito com o ataque da equipa da casa — até colocou a bola no fundo da baliza, num 3-0 anulado por fora de jogo de Trauner —, o técnico dos neerlandeses tirou o rapidíssimo Osman e colocou Beelen, passando a fechar com linha de cinco. Era o convite para o domínio das águias, circunstância que ainda não sucedera na noite da Luz.
Para se juntar às mexidas de ambos os bancos, o público agitou-se, criando uma tempestade perfeita. Aos 66', Beste, lançado em contra-ataque, rematou para defesa incompleta de Wellenreuther. O ressalto foi atraído pelo magnetismo de Muhammed Kerem Aktürkoğlu, viciado em recolher estes ressaltos. 2-1 e a partida relançada.
A entrada de Renato Sanches contribuiu para dobrar a aposta do entusiasmo, mas rapidamente a excitação se tornou falta de cabeça, de discernimento. O Benfica viciou-se no esticar do jogo, partiu a equipa, foi demasiado com o coração e pouco com a cabeça. Com estes pecados, raras vezes esteve verdadeiramente perto do empate.
No epílogo da partida, o Feyenoord foi gerindo a posse, ganhando cantos e faltas. E foi de um livre trabalhado que a oportunidade de remate chegou a Milambo, que selou o 3-1 final. Um sul-coreano, um neerlandês e um japonês, produtos do futebol multicultural, decidiram este embate de campeões europeus, este confronto entre símbolos de outros tempos na grande montra europeia.