Quem acompanhou a política nacional nos anos 90 não esquecerá, nunca mais, a cavalgada épica em certos comícios, pautados pela música de certo compositor grego. Falava-nos a canção da conquista do paraíso, inspirada pelas viagens de Cristóvão Colombo em modo cinematográfico. E se o paraíso, por estes dias, for o Natal, o Benfica cumpriu-o. Com a ajuda de outro Vangelis, não o da música mas o do futebol, e de um suíço saído do banco.

Um remate de Pavlidis fora da área, bem incomum, acabou dentro da baliza do Estoril ainda na 1.ª parte e Amdouni fechou as contas já na 2.ª com um bis. O primeiro golo apareceu quando o Benfica sofria, o segundo quando o Estoril já esmorecia fisicamente e o terceiro a pedir o fim do jogo. A exibição coletiva dos encarnados dificilmente mereceria tantos presentes do Pai Natal, mas o desígnio de Rui Costa, de ser líder na noite de Consoada, aconteceu - com a ajuda das prendas que vieram do outro lado da 2.ª Circular.

E prendas também ia oferecendo o Benfica ao adversário, mal aproveitadas pelo Estoril, nada dentro do espírito da quadra. O meio-campo Kökçü-Aursnes, pouco apoiado por Aktürkoğlu, deixou amplas clareiras para o Estoril se recrear nos primeiros 10 minutos, salpicadas por pózinhos de bolas perdidas e pouca ou nenhuma ligação do ataque. João Carvalho assustou Trubin ainda nem 120 segundos havia no relógio e a qualidade da linha média do Estoril, com Zanocelo, principalmente, também em bom plano, não encontrava particular oposição de um Benfica em inferioridade naquela zona.

FILIPE AMORIM

Só a partir dos 15 minutos o Benfica conseguiu estabilizar. Um remate ao poste de Pavlidis após canto, aos 17’, contava uma história pouco verdadeira do jogo, com o Estoril a encontrar sempre maneira de criar calafrios, ainda que não perigo, porque faltou sempre o dom das boas decisões. Fabrício, ala pela esquerda, foi um corrupio para Bah, Marqués e Wagner Pina beneficiaram, à vez, daquela velocidade, mas o último remate falhou. E quando tentou a felicidade individualmente, os remates também saíram mal a Fabrício.

Do lado do Benfica, Beste era então a principal fonte de aproximação, com cruzamentos tensos pela esquerda que não eram aproveitados pela direita, antes do alemão eclipsar-se no que restou do jogo - como fez os 90 minutos só pode ser um mistério de Natal. O golo do Benfica, numa fase em que a equipa encarnada pouco tinha feito por isso, surgiu de um erro individual, de um balão de João Carvalho que Pavlidis agradeceu para fazer o seu primeiro golo no campeonato fora dos limites da área.

FILIPE AMORIM

O Estoril dividiu o jogo até lhe faltarem as forças e voltou a entrar bem na 1.ª parte, ainda que Trubin tenha tido, tudo colocado em cima da mesa, pouco trabalho ao longo dos 90 minutos. O Benfica procurava um meio-campo debaixo da árvore de Natal, mas continuou a oferecer espaços e oportunidades para o adversário progredir. E no ataque Pavlidis e, principalmente, Aktürkoğlu, batiam de frente com o ato de finalizar. A entrada de Zeki Amdouni, cada vez mais uma espécie de jóquer, atalharia os caminhos para a baliza. Numa fase em que fisicamente o Estoril já era mais de um amarelo desbotado, o avançado suíço foi eficaz num lance em que mais uma vez o turco não o foi - a veia goleadora parece também estar ela um pouco menos colorida do que em outros momentos da temporada para Kerem.

Uma recarga após boa jogada de entendimento pela direita, com Di Maria ao barulho, chamaram a liderança a uma Luz que quase encheu com 60 mil almas. Com nova meia oportunidade, agora num canto já para lá dos 90, Amdouni bisou, num castigo demasiado severo para o Estoril, que tem qualidade, mas a quem parece faltar o faro de baliza.