Com um modelo de negócio híbrido, a Nickel pretende combinar os benefícios da presença física, nomeadamente através da possibilidade de realizar operações financeiras em lojas de comércio local, com a conveniência de soluções digitais para que todos os cidadãos tenham acesso a serviços financeiros básicos e com menos constrangimentos.

Um estudo realizado por aquela instituição de pagamentos, desenvolvido em parceria com a DATA E, revela que cerca de 63% dos portugueses valorizam a possibilidade de fazerem operações financeiras (depósitos e levantamentos) neste tipo de estabelecimentos do comércio local e mais de 62% acreditam que essas lojas são mais convenientes em termos de localização e horário face aos balcões tradicionais.

O SAPO falou com João Guerra, CEO da Nickel Portugal, para saber como é que o comércio local poderá ser uma ferramenta de reaproximação do setor financeiro a regiões sem acesso bancário para promover a acessibilidade a serviços básicos.

Como funciona o vosso modelo de negócio?
Nós temos um modelo de negócio muito particular, que é o modelo híbrido, porque está assente numa plataforma digital e consegue ter aqui uma rede de pontos de venda ou de agentes, que permite às pessoas muito maior proximidade e fazer um conjunto de transações. Hoje em dia, algumas delas já começam a ser difíceis de encontrar e de fazer nos tradicionais balcões bancários, também porque eles têm reduzido a sua presença um pouco por todo o país, nomeadamente em regiões mais do interior.
As pessoas valorizam essa proximidade, o chegar a esses agentes que são lojas do comércio local, tabacarias, papelarias, onde as pessoas podem fazer o básico das operações financeiras que faz tradicionalmente com o banco, seja abrir a conta, levantar dinheiro, depositar dinheiro, substituir o seu cartão se o perder.

E acha que esse comércio local consegue fazer esse tipo de trabalho, de esclarecer essas dúvidas? Têm de ter algum tipo de formação?
Têm sim. Uma é a que nós chamamos de combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo. É uma formação obrigatória e é de revalidação anual. O sistema com que eles trabalham bloqueia se as não tiverem essa formação feita e atualizada. E também têm de ter a formação do Banco de Portugal, que tem que ver com o conhecimento da nota euro, e que pode ser dada ou nos próprios balcões do Banco de Portugal ou através do IFB (Instituto de Formação Bancária). Eles são obrigados a ter essa formação antes de poder fazer as operações, embora, mais uma vez, as operações que eles façam são operações relativamente simples, mas obviamente obrigam essa formação.

Quantos pontos de venda tem neste momento em Portugal?
Neste momento temos quase 700 pontos de vendas já a funcionar.

"As gerações mais jovens já não usam tanto as agências, e isso levou à própria evolução do digital"

Na sua opinião, porque é que fecharam tantas agências bancárias em Portugal?
O facto de estarem a fechar tem que ver com várias coisas, mas um dos aspetos mais importantes são os custos estruturais que essas dependências têm. Depois, algumas gerações mais jovens já não usam tanto as agências, e isso levou à própria evolução do digital, levou a que os bancos aproveitassem para reduzir toda essa estrutura e os respetivos custos associados aos mesmos. Há uma percentagem muito grande da população que valoriza essa proximidade, valoriza o facto de poder falar com alguém, de poder perguntar antes de fazer uma operação, de algumas operações terem de ser feitas fisicamente, como é o caso, por exemplo, do depósito em numerário.

Esse fecho de balcões existe apenas em Portugal?
Não, os modelos de negócio da banca tradicional portuguesa não são diferentes do resto da Europa. Durante os últimos 10 a 15 anos, fechou-se quase metade dos balcões. Mas mais uma vez, isso aconteceu um pouco por toda a Europa e também pelas mesmas razões, porque os modelos de negócio, também são muito semelhantes. O da Nickel assenta essencialmente no digital, tem uma plataforma que permite prestar serviços, estamos presentes nos maiores países da Europa, já nos cinco maiores, França, Alemanha, Espanha, Bélgica, Portugal.

Para além dos levantamentos, depósitos, pagamentos, a Nickel faz outras operações como investimentos ou poupanças?
Para já não. A licença que nós temos não nos permite que as pessoas possam fazer investimentos. O que as pessoas podem fazer são os serviços essenciais do dia a dia, são as transações básicas como levantar dinheiro, depositar dinheiro, fazer transferências e fazer pagamentos. O que podem fazer, em primeiro lugar, é abrir logo a conta sem a complexidade, a burocracia, os custos, a morosidade, a quantidade de papéis da banca tradicional. Em alguns minutos, e apenas com o seu cartão do cidadão, abre a conta e sai da loja com uma conta aberta, ativa, pronta a funcionar e o cartão de débito MasterCard é válido no mundo inteiro e pode usá-lo no minuto a seguir para pagar se quiser.

Que outras vantagens existem em ter uma conta da Nickel?
Têm horários de funcionamento muito mais alargados, muitos deles funcionam até às 10.00 da noite, ao sábado e ao domingo. São as lojas muitas vezes do bairro que eu uso há muitos anos para quem mora ali, sem a burocracia de ter de ir também ao balcão.
Se precisar de levantar dinheiro, já não tem que ir ao balcão ou procurar uma caixa multibanco, pode fazer isso nessas lojas do comércio local: levantar dinheiro e depositar também.

Não existe um valor mínimo para abrir a conta?
Neste caso, não é necessário. Não obriga a nenhum depósito ou à compra de qualquer produto, ou ter lá um valor mínimo. Tem essa facilidade e de não ter nenhum dos requisitos ou exigências à cabeça em termos de valores ou a manter na conta.

"O nosso objetivo para o ano é chegar aos 5.5 milhões de clientes"

E quantos clientes é que têm neste momento?
Atingimos em França os 4 milhões de clientes. É um número muito significativo em apenas dez anos. O nosso objetivo para o ano é chegar aos 5,5 milhões e ter a maior rede de distribuição de contas de pagamento, contas correntes na Europa. Em Portugal, nestes primeiros anos, tem tido um ritmo de crescimento, o que demonstra a adequação do modelo de negócio e dos portugueses procurarem estes novos modelos, de estarem cansados da banca tradicional por alguns aspetos.
Nós temos essa vantagem, que é ser uma mesma plataforma, é digital, eu lanço produto em França, por exemplo, e muito rapidamente em poucas semanas ou meses, conseguimos implementá-lo nos outros países, e em Portugal em concreto, toda essa agilidade de trazer inovação ao mercado já se montou nesses dois anos e vai continuar de certeza nos próximos.

Este estudo que fizeram tinha que objetivos?
Eu diria que o estudo tinha três grandes objetivos. Avaliar os hábitos financeiros dos portugueses, o seu relacionamento com as instituições atuais, e depois também perceber um pouco o crescimento e o status quo destes novos players, um pouco mais digitais, para os diferenciar dos tradicionais e qual a intenção dos portugueses também de aderir a esses novos modelos. E eu diria que as três ou quatro grandes conclusões do estudo são, em primeiro, o que o estudo diz é que os portugueses usam o seu banco essencialmente para as operações do dia a dia como pagamentos, transferências, depósitos, e com destaque também para as apps.

"Há uma intenção dos portugueses e uma vontade pela mudança, pela inovação, de caminhar para este digital"

Uma segunda grande conclusão do estudo é o tal descontentamento dos portugueses com os custos dos serviços, em particular pelo custo da Comissão de Manutenção de Conta. Por outro lado, há uma intenção dos portugueses e uma vontade pela mudança, pela inovação, de caminhar para este digital, para estes modelos de negócio.
Vemos que muitos não mudam banco há muito tempo e não o fazem porque acham que é difícil. Muitos não conhecem, por exemplo, o tema da ferramenta da mobilidade bancária, que é, suposto o próprio banco tratar e mudar, por exemplo, os débitos diretos de um banco para outro. E acabam por ficar conformados. E diria como uma última conclusão foi essa de que ainda há uma utilização mais significativa de dinheiro e a necessidade de fazer depósitos em numerário.
As pessoas procuram a simplicidade, a conveniência, a acessibilidade, os custos. Eu diria que estas são as grandes conclusões do estudo.

O futuro acaba por pôr fim às agências bancárias e começarmos a fazer tudo no comércio local?
Eu acho que estamos a assistir a uma transformação no setor. Aliás, ela já vem desses últimos anos, nem que seja por esta rotação, mas o que vemos é que alguma coisa tem que colmatar porque as pessoas de facto, valorizam, pretendem e ainda utilizam essas agências. O que eu acho que vai haver não é uma alteração de 100%, mas são reajustes. Para determinados tipos de operações, mais complexas, de empresas, até para particulares com envolvimentos muito elevados ou que tenham, muitos tipos de produtos com ou mais bancos farão sentido. Para outro conjunto de operações este modelo de negócio faz todo o sentido porque é muito mais ágil, no sentido de trazer rendimento, distribuição de riqueza, valorização de comércio local, trazer o serviço ou voltar a ter esses serviços nessas regiões e que as pessoas valorizem e podem fazer.

Quais são os próximos passos da Nickel? Querem continuar a ter mais estes agentes do comércio local?
Sim, esse ainda é um dos nossos grandes objetivos. É continuar a crescer com clientes e a base de pontos de vendas. Sendo já a maior rede, com os mais de 650 pontos de venda, temos uma ambição de duplicar este número nos próximos anos, para que possamos chegar a todas as regiões, poder servir toda a população portuguesa e ajudar também a que as pessoas se fixem mais nessas regiões.
E claramente continuar a inovar e a trazer novos produtos ao mercado, uns diretamente, outros por via de parceiros. Tudo aquilo de que as pessoas precisem no dia-a-dia do setor financeiro e que cumpra os nossos valores na prestação de serviço tem de ser uma coisa muito simples, rápida, com preço justo e que a pessoa possa fazer com facilidade e acessível a todos. Todos os produtos que eu veja, que possa oferecer diretamente ou comparecer com este modelo de negócio, com estas premissas, vamos fazê-lo com certeza e vamos trazer ao mercado, com agilidade, também toda a estrutura e que vai mais uma vez inovar no mercado.