O presidente executivo (CEO) da NOS considera, em declarações à Lusa, que a regulação europeia do digital "é claramente a mais restritiva do mundo" e que a transposição da diretiva sobre cibersegurança "impõe uma carga terrível adicional" para as empresas.

"A Europa não tem nenhuma empresa com dimensão, com relevância, com impacto na inteligência artificial [IA]. No entanto, fomos os primeiros a regular", começa por dizer Miguel Almeida, quando questionado sobre o tema.

Em suma, "somos muito rápidos a regular, mas não sei muito bem o que é que estamos a regular", afirma. Até porque "a regulação sobre o digital da Europa é claramente a mais restritiva do mundo e nós não temos empresas de dimensão na esfera digital, incluindo na inteligência artificial. Porque é que será", questiona o gestor.

Não é "certamente" por incapacidade ou falta de empreendedorismo dos europeus, "porque muitas das empresas, nomeadamente nos Estados Unidos", até são europeias, acrescenta.

Agora, "enquanto a Europa achar que deve regular, em vez de estimular o crescimento, nomeadamente nas novas tecnologias, que são decisivas para a competitividade das economias do futuro, qual é a nossa preocupação enquanto europeus? Regular", reforça. Ou seja, "já temos uma regulação para a inteligência artificial, não temos a inteligência artificial", prossegue.

Tal afeta "essencialmente as empresas que fazem o desenvolvimento dos modelos" de IA, mas "não existem empresas na Europa, nem existirão com este tipo de regulação no que diz respeito à adoção por parte das empresas de todos os setores", diz.

No caso da NOS, o grupo já aposta na IA "há anos", quando ainda não se falava de inteligência artificial generativa, nem do ChatGPT. "Em termos de aplicação, nomeadamente 'machine learning', já temos um 'track record' [historial] com alguns anos" e agora "tudo isto é exponenciado pelos modelos do generativo", explica Miguel Almeida.

"Estamos também a incorporar esta vaga e temos na empresa exemplos concretos de processos, de atividades, de métodos de decisão assente em inteligência artificial, não é teoria", assevera o CEO da NOS.

Todos os dias "há uma série de processos da NOS que já assentam na inteligência artificial", mas "não é aí que está o valor", este está no "desenvolvimento dos próprios modelos" e para isso "basta a ver as valorizações implícitas das empresas americanas ou chinesas que estão nessa frente" da IA, comenta. Miguel Almeida admite que a IA tem riscos, mas primeiro "é preciso criar o problema para se regular o problema".

A questão na Europa, "nomeadamente na inteligência artificial é que nós ainda não tínhamos o problema e já estávamos a regular, não digo que não viessem ou que não venham a existir problemas, mas primeiro tem que se dar espaço para as coisas crescerem e, depois, então progressivamente controlá-las", considera.

Agora, se o processo é feito ao contrário, a consequência é que "não vão existir empresas europeias nessa frente", adverte. Sobre a transposição da diretiva de segurança das redes e sistemas de informação [NIS2 - Network and Information Security], vulgo cibersegurança, Miguel Almeida que as ameaças de ciberataques "crescem todos os dias" e é preciso "investir em múltiplas frentes".

Ou seja, "isto é um jogo do gato e do rato e (...) temos de estar sempre a pedalar um bocadinho mais rápido do que aqueles que querem fazer mal". E isso "cada vez mais recursos, mais especializados, que sejam capazes de contrariar aquilo que são gente talentosa a tentar fazer o mal", explica.

Portanto, "mais investimento" e "em cima disso há regulação, mais uma vez, nomeadamente a regulação europeia" da NIS2, aponta. Isto "impõe uma carga terrível adicional e, portanto, continuamos - não é só na cibersegurança, mas esse é um bom exemplo - a pôr carga em cima das empresas, a pôr ónus em cima das empresas, seja de atividades concretas, seja de reporte", cujas exigências são muitas, nomeadamente para uma empresa de infraestrutura crítica.

Relativamente ao talento, o CEO considera que onde estiverem "as melhores oportunidades" é "para aí que o principal talento vai". "Estamos a esvaziar a Europa e o país, como o caso de Portugal. Acho que estamos a esvaziar o país de talento" e o problema é abrangente. Portugal tem um "problema de dimensão" e não tem a escala que, por exemplo, uma empresa norte-americana tem para pagar a um especialista de IA. Mas este é um problema que também assola a Europa.

"As oportunidades em Portugal, para quem tenha ambição, são muito limitadas e as pessoas emigram, cada vez mais, todos os anos, temos milhares de jovens, dos mais talentosos, dos que têm melhor formação que saem das nossas escolas, muitas delas públicas onde o país investiu numa formação que tem qualidade", a irem para fora do país, sublinha. A questão "é como é que criamos oportunidades" para reter esse talento.

Relativamente à NOS, "fizemos investimentos consideráveis ao longo dos últimos anos, que nos dão um portfólio de capacidades e de ativos distintivos muito importante que vamos alavancar para continuar este caminho de crescimento", assevera.

Contudo, "nestas condições de mercado que se avizinham, obviamente que isso não vai ser suficiente e vamos ter que trabalhar também na eficiência dos processos e na eficiência da empresa como um todo para poder acomodar aquilo que é o contexto de mercado que vamos enfrentar", conclui.

5G é "ponto de viragem"

"Hoje, temos o país completamente coberto com 5G, temos a rede mais rápida da Europa de 5G", no que diz respeito à tecnologia "já atingimos as metas que a União Europeia definiu para 2030, penso que somos o único país", ou seja, "falta zero vírgula não sei quantos por cento", diz Miguel Almeida, em jeito de balanço.

Do ponto de vista da disponibilidade dos serviços e do acesso que os portugueses têm aos serviços de quinta geração, "mais do que recuperamos o atraso, estamos claramente à frente do resto Europa", salienta. "Não estarei a faltar a verdade se disser que somos claramente líderes no que diz respeito ao 5G", pois "mesmo números publicados pelas entidades oficiais confirmam", acrescenta. Portanto, "estamos muito satisfeitos com aquilo que temos vindo a desenvolver", sublinha o CEO da NOS.

Agora, "do ponto de vista de negócio, é um desafio", admite. "Acho que temos que ser realistas, transparentes e sinceros, a nossa expetativa era que, neste momento da fase da vida do 5G, já existissem muito mais serviços potenciados pelo 5G, uma adoção desses serviços já com alguma materialidade e a verdade é que isso não acontece", admite.

E tal não acontece em Portugal como também "não acontece em sítio nenhum". Na perspetiva dos "serviços específicos potenciados, permitidos pelo 5G, é um bocadinho uma desilusão", mas do ponto de vista de que "este investimento contribuiu para NOS, estamos muito satisfeitos", prossegue.

Porque isso permite "que os nossos clientes tenham uma experiência muito melhor na utilização dos serviços no que diz respeito àquilo que tinham antes com as tecnologias anteriores e também comparativamente com os nossos concorrentes e isso tem-se materializado no crescimento que nós temos de quota e no crescimento que temos de receitas que vêm desse crescimento de quota", argumenta.

Na realidade, "o ecossistema que potenciaria isso não se desenvolveu ao ritmo que se acreditava, que toda a gente acreditava, nós também, que se ia desenvolver, o facto de não ter acontecido não quer dizer que não venha a acontecer", considera Miguel Almeida.

Atualmente, há já desenvolvimento noutros países, nomeadamente na Ásia, "que estão à frente na adoção" do 5G.

Mas "estamos a falar de países que, nomeadamente, têm um tecido industrial completamente diferente do nosso e empresas de uma dimensão completamente diferente e estamos sempre a falar de investimentos", acrescenta.

E, portanto, "- o problema, não é português, é um problema europeu - mas Portugal, dada dimensão das empresas e, em particular, no setor industrial, onde o 5G mais potencia, não é um mercado muito significativo", conclui.

Assinalando o terceiro aniversário do 5G em Portugal, a NOS irá lançar uma série de ações durante todo o mês de novembro, como forma de mostrar o que está a ser feito nos vários setores.