As mulheres ligadas ao sector da tecnologia continuam a sentir-se mal pagas, sub-representadas e subfinanciadas, é o que nos revela o estudo “Women in Tech 2024”, desenvolvido pelos responsáveis da Web Summit (a maior conferência tecnológica da Europa) e que contou com a intervenção de mil mulheres a nível global.

Em particular, mais de 75% das inquiridas admitem ter de trabalhar mais que os homens que desempenham funções semelhantes. “Ser mulher num ambiente predominantemente masculino significa ter de provar as suas capacidades a dobrar, enfrentando desafios adicionais para ser reconhecida e valorizada”, refere uma das inquiridas.

Das mil mulheres que decidiram responder ao referido estudo, 68,2% afirmam ter uma pessoa do sexo feminino a ocupar um cargo de chefia. Porém, no que diz respeito às remunerações, mais de metade sente-se injustamente compensada face aos homens. Apesar dos desafios, cerca de 76% das inquiridas sentem-se capacitadas para exercer e/ou manter uma posição de liderança.

“Infelizmente, as disparidades salariais baseadas no género são muito reais. Muitas vezes, numa sociedade patriarcal, as mulheres não têm o mesmo poder de influência para exigir igualdade”, comentou uma das inquiridas.

Quase um terço (29,6%) das mulheres interrogadas pela Web Summit citou o financiamento como um grande obstáculo para iniciar um negócio, “refletindo as tendências globais das empresas em fase de arranque lideradas por mulheres que lutam para obter capital de risco”. Uma análise do Fórum Económico Mundial, com base nas estatísticas do Pitchbook (que também é citada no estudo da Web Summit) dá conta de que as startups compostas só por mulheres receberam apenas 1,8% do financiamento de capital de risco na Europa e 2% nos Estados Unidos em 2023. Também os dados da plataforma Wamda mostram que as startups formadas apenas pelo sexo feminino receberam somente 0,47% do financiamento na região MENA (que abrange as regiões do Médio Oriente e do Norte de África), no ano passado.

Segundo o estudo da Web Summit, quase metade (49,1%) das mulheres ligadas ao sector tecnológico também se sente pressionada a escolher entre a vida familiar e uma carreira, um número que cresceu 7% em relação ao ano passado. “A grande maioria das respostas mostra que existe uma grave falta de iniciativas empresariais destinadas a promover a igualdade de género, com pouco mais de 65% dos inquiridos a revelarem que as suas organizações não têm quaisquer programas deste tipo”, refere o relatório. De forma mais abrangente, quase 69% das intervenientes neste estudo estão insatisfeitas com os esforços feitos pelo Governo no que diz respeito ao combate à desigualdade de género.

Tal como o Expresso já noticiou, desde 2023 que existem regras específicas para reforçar a transparência remuneratória nos empregadores europeus e a igualdade salarial entre géneros. Regras essas que os vários Estados-membros têm de transpor para os seus ordenamentos jurídicos até 2026.

Um outro relatório da consultora Ratio sobre a indústria tecnológica europeia em 2024 confirma alguns dos desafios levantados pelo estudo da Web Summit. Dos mil líderes empresariais interrogados pela Ratio, 45% responderam que a implementação da lei da transparência salarial está muito longe de ser uma prioridade no momento.

Web Summit deste ano vai contar com número recorde de startups fundadas por mulheres

Criado em 2015, pela Web Summit, o programa “Mulheres na Tecnologia” tem como objetivo combater a desigualdade de género. Esta iniciativa oferece descontos para incentivar mais mulheres a assistir e a participar nas várias conferências da Web Summit “tornando os eventos mais acessíveis e inclusivos”.

Um ano depois da entrada em vigor desta iniciativa, a percentagem de participantes do sexo feminino na Web Summit aumentou para 42%. Já em 2021, as mulheres ultrapassaram os homens pela primeira vez, atingindo os 50,5%. Este ano, das 3000 startups que vão estar presentes no evento a ocorrer em Lisboa, mil foram fundadas por mulheres.

“É frustrante que questões como o sexismo, a remuneração injusta, a síndrome do impostor e o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal continuem a aparecer - muitas vezes parece que estamos presos nas mesmas conversas. No entanto, não posso deixar de me sentir esperançosa. Mais mulheres estão a dar um passo em frente, a liderar e a trazer as suas startups para eventos como a Web Summit”, comenta Carolyn Quinlan, vice-presidente da comunidade da Web Summit, no relatório “Women in Tech 2024”.