No momento em que entramos em contagem decrescente para a grande festa dos 40 anos da BLITZ, na Meo Arena, em Lisboa, a 12 de dezembro – com concertos de Xutos & Pontapés, Capitão Fausto, Gisela João e MARO –, pedimos a músicos, promotores, jornalistas, radialistas e outras personalidades que vão ao baú resgatar memórias de quatro décadas de história, deixando-nos, também, uma mensagem para o futuro.

A ligação de Fernando Ribeiro, dos Moonspell, à BLITZ remonta à década de 1980 e tem, até, um papel importante na formação da banda. “Um momento charneira da nossa carreira foi quando veio cá o vocalista dos Bathory, o Quorthon, que era a nossa banda preferida, isto em 1990, e nós vimos o anúncio no BLITZ”, recorda o vocalista, “depois dessa notícia, fomos conhecer o vocalista, letrista e compositor sueco que mais nos influenciava. Na altura, era uma música muito underground. Vimos no BLITZ e gostámos tanto que, no outro dia, dissemos ‘vamos fazer uma banda também, a ver se conseguimos imitar este ser magnânimo da Suécia que apareceu aqui em Almada e em Lisboa, não sabemos muito bem como’”. Antes disso, Fernando Ribeiro já seguia a coluna do BLITZ ‘Arame Farpado’, inicialmente assinada por Pedro Cardoso e depois por António Freitas. “Era das poucas coisas que tínhamos em Portugal para saber das novidades lá de fora e do nosso estilo de música. E lembro-me porque o Pedro Cardoso era professor de artes visuais numa escola da Brandoa… isto em finais de 1980, no princípio do jornal. Dizíamos sempre, ‘olha, olha que o professor escreve para o BLITZ’. Andávamos sempre atrás dele, sedentos de um bocado da sua sabedoria, que ele colocava no jornal. Isso era a maior razão por que eu ia comprar os BLITZ lá no quiosque da Brandoa”.

“Lembro-me de ser metaleiro, de gostar de heavy metal, das bandas normais, os Metallica, os Iron Maiden, as bandas underground também, que me influenciaram mais como músico, mas lembro-me perfeitamente de o BLITZ ser um jornal de leitura obrigatória entre os jovens que gostavam de música em Portugal”, continua Fernando Ribeiro, “na escola secundária, apesar de ser do grupo mais pequeno dos metaleiros, tínhamos também o grupo dos vanguardas ou indies, que ouviam Siouxsie and the Banshees, Sisters of Mercy, Cure, Pixies, Spacemen 3, Fields of the Nephilim, tudo o que fosse 4AD e Beggars Banquet, Nick Cave, Depeche Mode. E, na altura, quando o BLITZ apareceu, era uma publicação muito dada à música independente, por isso eu expandi bastante os meus horizontes, lendo reportagens de concertos, quando eles vinham a Portugal, críticas de discos, etc. Sempre gostei muito de música independente, também, não só de heavy metal, e o BLITZ desempenhava um bocado essa função de me educar em relação a essas bandas: de onde vinham, qual era a novidade”.

Sobre o grande contributo que a BLITZ tem na música em Portugal, o líder dos Moonspell não tem grande dúvida: “a sua existência”. “Os músicos, confesso, nem sempre têm uma relação pacífica com a imprensa. Qualquer músico que se preze, já andou às turras. Há turras, há birras, há celeumas, há cismas, mas eu, pessoalmente, estou muito contente que a BLITZ tenha chegado a estes 40 anos, sob este formato novo, que encarna as novas tecnologias, as novas maneiras, que tem vantagens e desvantagens”, defende, “há uma grande nostalgia pelo BLITZ, que eu acho que é uma coisa boa. Mesmo que as pessoas tenham aquela saudade, dos pregões, etc., não sabem muito bem libertar essa nostalgia. Hoje, se vocês fizessem uma secção de pregões, ninguém mandava pregões para nada, porque já não há necessidade desse tipo de comunicação, mas foi uma memória com que as pessoas ficaram, como ficaram com a roupa dos Porfírios, ou com uma loja de discos qualquer que havia em Portugal”.

Segundo Ribeiro, “o grande presente que a BLITZ dá aos seus seguidores, que hoje são ainda mais, é a sua própria existência e o facto de ter gerido bem as crises. Eu também tenho uma banda com 32 anos, temos menos 8 anos, e nunca fizemos tudo perfeito, nem bem. Não tomámos sempre as decisões certas, mas tomámos as decisões que nos permitiram aguentar o barco. E acho muito interessante a sensação de legado, que também deve acontecer às pessoas que trabalham diariamente na BLITZ. Eu nunca tive essa sensação até a banda fazer 30 anos. É a tal distância histórica. A BLITZ, agora, tem distância histórica para perceber que é uma força da música em Portugal, independentemente do vai e vem das bandas. Continua a ser o nosso ‘New Musical Express’, a nossa ‘Spin’, a nossa ‘Metal Hammer’”.

Sobre o momento presente da BLITZ, o músico diz acompanhar a “revista digital”. “Sei que não têm parado na inovação, agora com os concertos na redação, o Posto Emissor, que se estabeleceu também e era uma coisa que não tinham na altura porque não havia hipótese de fazer”, defende, “realmente, é pena que o nosso público não esteja mais educado para querer o objeto físico. Isso, realmente, seria excelente. Sei que, de vez em quando, fazem edições especiais…”. Para o futuro, Fernando Ribeiro deixa o desafio: “era giro voltarem os Prémios BLITZ, porque não eram prémios da indústria, com todo o respeito pelos Play. Eram prémios da música, do público. Lembro-me de ver lá os Radiohead, por exemplo, a receber um prémio. E eu ao lado, sentado. Isso é o papel de uma revista. Digital ou não, isso agora não interessa. Independentemente do formato, eu, pessoalmente, estou contente que a BLITZ faça 40 anos e voto para mais que virão. Sempre foram parceiros dos Moonspell em tudo, portanto, para mim, é fundamental, também”.