'Deseja-se Fernanda!', que se estreia no Teatro Municipal São Luiz, tem texto de Ana Lázaro e encenação de Cucha Carvalheiro, que, juntamente com Fernanda Lapa, fez parte do grupo de mulheres fundadoras daquela companhia de teatro em 1995.

Cinco anos depois da morte de Fernanda Lapa (1943-2020) e trinta da criação a companhia, Cucha Carvalheiro dirige um espetáculo que não só recorda aquela atriz e encenadora, como celebra o ato de representar, de encenar e de se estar no teatro.

"Quisemos fazer um espetáculo que fosse um bocadinho uma festa. É quase um musical sem ser um musical, porque combinamos alguma leveza com a 'gravitas' que a Fernanda também tinha. As coisas que interpretou ou que encenou combinavam esses dois elementos", afirmou Cucha Carvalheiro à agência Lusa no final de um dos ensaios.

Para quem não conheceu Fernanda Lapa, a peça poderá aguçar a curiosidade e a vontade de se "saber mais sobre o seu percurso e a sua importância na história do teatro português", disse a encenadora.

'Deseja-se Fernanda!' tem interpretação das atrizes Ana Sampaio e Maia, Carla Bolito, Margarida Cardeal e Marta Lapa, encarnando personagens de peças que de alguma forma estiveram ligadas ao percurso de Fernanda Lapa. Mas há momentos em que todas as atrizes são Fernanda Lapa.

A peça conta ainda com o ator Luís Gaspar, no papel de um encenador "à procura das pegadas da Fernanda", e do pianista Nuno Vieira de Almeida, "que foi um cúmplice artístico" da atriz e encenadora.

O título exclamativo remete ainda para a peça "Deseja-se mulher', de Almada Negreiros, na qual Fernanda Lapa se estreou como atriz, em 1963, e como encenadora, em 1972, na Casa da Comédia.

No espetáculo de Ana Lázaro 'há bocadinhos de peças que a Fernanda ou encenou ou representou e que aparecem ao estilo da peça da Almada [...] um bocadinho dadaísta", disse Cucha Carvalheiro, dando como exemplos 'Crisótemis', de Yannis Ritsos, 'As bacantes', de Eurípides, e 'A noite das Tríbades', de Per Olov Enquist.

A Escola de Mulheres -- Oficina de Teatro foi fundada em Lisboa em 1995 por Fernanda Lapa, Cucha Carvalheiro, Isabel Medina, Marta Lapa, Cristina Carvalhal, Aida Soutullo e Conceição Cabrita.

Na página oficial, a estrutura lembra o Manifesto da Escola de Mulheres "que visou sempre enaltecer o trabalho das mulheres nas artes, em geral e no teatro em particular, além de ter sempre feito refletir nas suas produções problemáticas transversais a toda a sociedade como as questões de género, da desigualdade social, entre outras".

Apesar de se ter afastado da companhia de teatro, atualmente dirigida por Marta Lapa e Ruy Malheiro, Cucha Carvalheiro lembra os tempos de fundação da Escola de Mulheres.

"Quando nós começámos, em 1995, fizemo-lo porque sentimos que havia uma grande discrepância entre a importância dada às mulheres no panorama teatral português não só como atrizes, sentíamos isso. Normalmente éramos escolhidas por encenadores homens, para interpretar peças de homens, e muitas vezes fazíamos papéis um bocadinho secundários em relação aos nossos colegas homens", recordou a atriz, hoje com 76 anos.

Cucha Carvalheiro sublinha que a companhia foi fundada não só para colmatar falhas na representação e na encenação para mulheres, mas também noutras áreas criativas ligadas ao teatro, na cenografia, na direção musical, na iluminação.

"O balanço que faço é que hoje em dia há muito mais mulheres a trabalharem nas várias áreas do teatro, mas ainda estamos longe da paridade, portanto a luta continua", disse.

'Deseja-se Fernanda!' é a 78.ª produção da Escola de Mulheres e ficará em cena no Teatro Municipal São Luiz entre os dias 15 e 23 de março, estando ainda prevista uma apresentação, a 27 de março, Dia Mundial do Teatro, no Teatrão, em Coimbra.

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