Pedro Chagas Freitas continua a viver uma fase muito complicada, derivado da doença do filho Benjamim.
Em mais um desabafo, o autor português falou sobre as amizades que o filho foi fazendo ao longo do tempo que tem passado no hospital.
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Ora, veja:
— Pai, a X já vai ter alta?
— Sim.Ficas em silêncio, sorris, os olhos abrem muito, como se quisessem olhar para a parte de trás das palavras, para a parte de trás da realidade. Foram muitos os que entraram e saíram desde que chegaste. Conheceste amigos e amigas novos, uns mais novos, outros mais velhos, tiveste diálogos com todos, construíste uma marca com todos. Eles vão, tu ficas. Queres a tua casa, não a vês. Eles vão para as casas deles, vão ser felizes. Sinto em ti que ficas feliz por eles, numa grandeza que tão pouca gente tem. Perguntas muitas vezes se estão bem, dizes que queres ajudá-los, ofereces o que podes, ajudas como podes. Quando paras um pouco, ficas pensativo. Não entendes. Não sabes porque vão eles e tu não. Não entendes porque podem eles ir e tu não. Nunca o dizes, nunca o verbalizas. Sente-se na forma como olhas, na maneira como procuras saber o que vai acontecer-te a seguir. Fazes tudo certinho. Cumpres a medicação (és tu que nos lembras, muitas vezes, dela, és tão responsável nisso, talvez até demais, talvez penses demais nisso, talvez devesses pensar menos, ser mais inconsequente, mais livre dessas prisões que são só tuas), comes o que te pediram para comer, bebes até o que não gostas só porque te disseram que te faz bem, fazes exercício, não falhas com nada — e ainda aqui estás. Que merda, não é? A justiça às vezes é apenas um verso num poema inexistente. A vida não sabe muito sobre as pessoas. Descansa, filho. Um dia chega a tua vez, um dia tem de chegar a tua vez. Até lá, há algumas batalhas para enfrentar. A próxima não demora muito. Vais ter de ser o gigante que és sempre, vais ter de me dar mais uma lição, vais ter de dar cabo de todos os muros. Para pessoas como tu, os muros são só um instrumento para veres o mundo mais de cima. Entretanto, vais continuar a comer pipocas, a percorrer as curvas sinuosas do destino como um louco (louco pela vida, meu filho, sempre louco pela vida), a viver como um louco. É sempre assim, a viver como um louco, que se impede a chegada da loucura.