As temperaturas do oceano na Grande Barreira de Coral atingiram em 2024 o valor mais quente dos últimos 400 anos, o que coloca em perigo aquele que é o maior recife do mundo, conclui uma investigação publicada nesta quarta-feira na revista científica Nature. O recife – que é o maior ecossistema vivo a nível global – estende-se por cerca de 2400 quilómetros ao largo da costa do estado de Queensland, na Austrália.

A elevada temperatura das águas na zona não é novidade, mas desta vez um grupo de cientistas australiano decidiu analisar amostras de corais para medir as temperaturas oceânicas desde 1618. Habitualmente, os estudos sobre os danos no recife abrangem um período de tempo mais curto. Os resultados mostram que os valores se mantiveram relativamente estáveis até 1900, quando começaram a subir devido à influência humana. A situação agravou-se sobretudo a partir de 1960 até à atualidade, registando-se um aquecimento médio anual de 0,12 graus Celsius por década.

“A análise dos modelos climáticos confirma que a influência humana no sistema climático é responsável pelo rápido aquecimento registado nas últimas décadas. Esta atribuição, juntamente com os recentes extremos de temperatura dos oceanos, a tendência de aquecimento pós-1900 e o branqueamento em massa de corais observado, mostra que a ameaça existencial para o ecossistema da Grande Barreira de Coral decorrente das alterações climáticas antropogénicas é agora uma realidade”, lê-se no documento.

Os anos mais quentes verificaram-se já no século XXI: 2016, 2017, 2020, 2022 e 2024. O recorde, atingido este ano no período de janeiro a março, é de 1,73 graus Celsius acima da média entre 1618 e 1899. Em 2022, o valor foi 1,46ºC mais elevado, enquanto em 2020 foi 1,53ºC, em 2017 a subida chegou a 1,54ºC e em 2016 atingiu 1,50ºC.

O stress dos corais

Tal provoca o branqueamento dos corais, isto é, uma reação de stress ao calor em que se perdem as algas simbióticas que lhes dão cor e nutrientes. Os corais podem recuperar, mas ficam mais suscetíveis a doenças e têm dificuldade em reproduzir-se. A situação pode tornar-se fatal se as temperaturas se mantiverem elevadas durante demasiado tempo.

“Os recentes acontecimentos na Grande Barreira de Coral são extraordinários. Infelizmente, são notícias terríveis para o recife. No entanto, ainda há uma réstia de esperança. Se conseguirmos unir-nos e restringir o aquecimento global, há uma réstia de esperança de que este recife, e outros em todo o mundo, sobrevivam no seu estado atual”, afirmou à BBC o autor principal do estudo, Benjamin Henley, investigador da Universidade de Melbourne.

O trabalho surge duas semanas depois de o Comité do Património Mundial ter decidido não incluir a Grande Barreira de Coral na lista de locais considerados em perigo. Tal classificação “enviaria um enorme sinal ao mundo sobre a gravidade do problema”, considera a professora da Universidade de Wollongong e outra das autoras do estudo, Helen McGregor. A decisão será reavaliada em 2026 e, até lá, a Austrália terá de apresentar dois relatórios sobre a situação: um até 1 de fevereiro de 2025 e outro até 1 de fevereiro de 2026. De acordo com a análise da agência governamental responsável pela gestão do recife, os impactos provocados pelo clima no verão de 2023-2024 foram superiores relativamente aos verões anteriores, com 79% dos corais afetados por branqueamento.

Proteger as linhas costeiras da erosão e servir como habitat para milhares de espécies marinhas estão entre as importantes funções dos recifes de coral. Pelo menos 54 países e territórios registaram um branqueamento em massa de recifes desde fevereiro do ano passado, à medida que as alterações climáticas aquecem as águas superficiais dos oceanos, indicou em abril a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos Estados Unidos (NOAA). Trata-se do quarto fenómeno global desde 1985, o segundo nos últimos dez anos.