A retinopatia diabética e o edema macular diabético são as patologias mais frequentes na pessoa com diabetes no que diz respeito à visão?

Sim. Para além da catarata, a retinopatia diabética e o edema macular diabético são, sem dúvida, as patologias oftalmológicas mais frequentes em doentes com diabetes. Sabemos que 1/3 dos doentes diabéticos têm retinopatia diabética e que 6-7% dos doentes diabéticos têm edema macular diabético. Tendo em conta que as estimativas oficiais apontam para cerca de 1 milhão de portugueses com diabetes, conseguimos entender o enorme impacto negativo que estas patologias têm na acuidade visual dos portugueses.

Qual o seu impacto na qualidade de vida, sobretudo quando são diagnosticadas tardiamente?

O impacto visual é muito significativo na presença de lesões graves de retinopatia diabética e na presença de edema macular diabético. Aliás, em Portugal, a retinopatia diabética é a principal causa de cegueira em indivíduos em idade ativa em Portugal. O que é trágico, é que a maioria dos casos de cegueira seria perfeitamente evitada, caso houvesse um diagnóstico e tratamentos precoces.

De acordo com o “Barómetro da Oftalmologia”, metade dos doentes com diabetes nunca consultaram um oftalmologista e nem sequer fizer qualquer rastreio oftalmológico. O que está a falhar?

Um dos objetivos do Barómetro, um projeto internacional promovido por um conjunto de peritos de renome mundial na área da retina, e no qual Portugal participou, foi avaliar o acesso dos doentes aos cuidados de saúde oftalmológicos. De facto, os resultados obtidos são preocupantes e ajudam-nos a entender que não estamos a fazer o suficiente. Apesar de haver alguns programas promovidos pela Sociedade Portuguesa de Oftalmologia e pelo Ministério da Saúde, que tentam sensibilizar a população diabética para a necessidade de serem observados por oftalmologistas e, haver inclusivamente, tal como referiu, um programa de rastreio oftalmológico com recurso à retinografia, o que é certo é que em Portugal o acesso à saúde não é fácil. O Serviço Nacional de Saúde é gratuito, mas deixa uma parte significativa da população sem cuidados de saúde regulares e atempados. Há que criar as condições de organização necessárias para melhor servir os cidadãos e há que valorizar os profissionais de saúde. Também seria importante que o Estado não resumisse a sua função à de mero prestador de cuidados de saúde, mas assumisse de modo mais amplo a sua função de regulador, de modo a facilitar o acesso dos portugueses à saúde. Há sempre uma certa relutância em implementar reformas, mas esta inação atual não se pode tornar numa fatalidade coletiva que comprometa as gerações futuras.

“Na verdade, o diagnóstico precoce e o tratamento atempado alteram completamente o prognóstico da doença, evitando um comprometimento irreversível da acuidade visual”

Os doentes queixam-se de tratamentos muito frequentes (assim como os oftalmologistas) e de dificuldades nas deslocações. De que forma se resolver estes constrangimentos?

Até há cerca de 15-20 anos, poucos tratamentos eficazes existiam para patologias como o Edema Macular Diabético, a Degenerescência Macular da Idade ou as Oclusões Venosas Retinianas. De facto, o aparecimento de novas classes terapêuticas, como os anti-VEGF, veio revolucionar o prognóstico visual dos nossos doentes. No entanto, estas terapêuticas exigem o recurso a uma sala operatória dedicada e a uma monitorização clínica regular levando, por isso, a uma alta frequência de visitas sobrecarregando os sistemas de saúde, bem como os doentes e respetivas famílias. A reorganização dos serviços de Oftalmologia, de modo a permitir a adoção de um modelo de diagnóstico e tratamento num só dia (também denominada clínica de injeções), a utilização de fármacos intraoculares com maior duração de ação e o apoio social às deslocações de doentes aos serviços de saúde são algumas das respostas para esses constrangimentos.

Que outras medidas considera serem relevantes para proteger a saúde visual das pessoas com diabetes?

Para além de medidas gerais de educação para a saúde, é importante que os doentes diabéticos otimizem as suas glicemias, controlem a tensão arterial e e evitem a dislipidemia. São medidas importantes porque há evidência científica relevante que mostra que estas atitudes reduzem o aparecimento e a progressão da retinopatia diabética. Por outro lado, como a Diabetes é uma doença particularmente exigente com impacto no dia-a-dia dos doentes e respetivas famílias e, como frequentemente é acompanhada de muitas comorbilidades, é muito importante que os doentes tenham apoio médico multidisciplinar.

Por fim, nunca é demais sublinhar a importância do diagnóstico precoce e o acesso atempado ao respetivo tratamento, quando indicado. Na verdade, o diagnóstico precoce e o tratamento atempado alteram completamente o prognóstico da doença, evitando um comprometimento irreversível da acuidade visual. Por isso é que esta e outras iniciativas de sensibilização da população são tão importantes.

MJG

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