Esta obra, escrita por e para profissionais de saúde tem o intuito de despertar os mesmos para a importância da abordagem da sexualidade. “Queremos sensibilizar os profissionais de que esta é uma necessidade humana básica, como o sono e a alimentação. Muitas vezes a sexualidade é perdida nestes cuidados ao longo do ciclo de vida”, refere Dora Carteiro, professora adjunta na Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa e enfermeira especialista em Saúde Materna e Obstétrica.

Ainda assim, apesar de a obra ter sido pensada de modo a que o público-alvo fossem os profissionais de saúde, Hélder Lourenço afirma que “são vários os capítulos que podem ser perfeitamente entendíveis por qualquer pessoa que o leia”.

De acordo com o enfermeiro especialista em Psiquiatria e saúde mental, a literatura aponta que a temática da sexualidade é requerida pelas pessoas durante os cuidados de saúde, mas não querem ser as próprias a ter a iniciativa, esperando que seja o profissional de saúde a abordar o tema. “Por outro lado, há alguma literatura que sugere limitações e constrangimentos na abordagem da sexualidade pelos profissionais de saúde, e é aqui que existe uma lacuna”, sugere o também sexólogo clínico e terapeuta sexual.

“A nossa obra surgiu no sentido de ser um instrumento que facilite aos profissionais suporte de modo a proporcionar uma visão consistente da necessidade que é a abordagem da sexualidade.”

Salientando que “em todas as fases do nosso ciclo de vida devemos ter em atenção o cuidado com a sexualidade”, uma vez que esta é “uma necessidade humana básica”, Dora Carteiro refere algumas das várias temáticas abordadas ao longo do livro. “No centro de tudo está a sexualidade e as suas particularidades. Ainda assim, abordamos as infeções sexualmente transmissíveis, a sexualidade na patologia oncológica, na patologia mental, nas deficiências, nas disforias de género, nas minorias de género, nas parafilias, nas comunidades LGBTQI+, e depois também, por exemplo, na violência sexual e na violência obstétrica”. Além disso, “incluímos também as várias fases de tratamento, desde a parte a parte de tratamento cognitivo ou comportamental, as terapias sexuais, ou o tratamento farmacológico”.

Relativamente às principais questões éticas na abordagem da sexualidade, a professora afirma que todas as profissões da saúde têm padrões de qualidade pelos quais se devem reger. “Estes padrões também existem na sexualidade, uma vez que em cenário de consulta o que está em causa é a sexualidade do outro. Temos de abordar o tema da sexualidade, mas logicamente que com algum cuidado”, nomeadamente no que diz respeito à individualidade de cada um.

“Temos de dar abertura para que a pessoa possa falar, para que se sinta à vontade com a sua sexualidade e fazê-la sentir que podemos ajudar. Perante essa abertura, se a pessoa falar, ótimo. Se não falar, tudo bem, mas pelo menos sabe que existiu um ambiente propício para tal”. No fundo “temos de estar bem com a nossa sexualidade e respeitar as particularidades de cada pessoa. Não estamos aqui para julgar, independentemente da nossa escolha, preferência, atração, identidade”.

Ainda dentro deste tópico, e quanto à abordagem da disforia de género, Hélder Lourenço afirma que “qualquer contacto, tratamento ou orientação que seja feito tem de ter sempre em conta as preferências, escolhas e atrações que temos perante nós”. “Não podemos fazer diferenças entre heterossexual, homossexual, bissexual, assexual, pansexual, transexual. Não pode haver diferença nenhuma. Temos de compreender a pessoa que está à nossa frente, a partir daí tratá-la na sua individualidade, respeitar e, dentro das suas particularidades, tentarmos ajudar.”

Relativamente à sexualidade na gravidez, área de especial interesse de Dora Carteiro, a professora afirma que durante os seus anos de trabalho em enfermagem verificou que existem alterações a nível da função sexual masculina durante a gravidez, em virtude da gestação propriamente dita. “Dependendo do trimestre de gravidez, podem existir alterações ou dificuldades a nível da sexualidade ou agravamento de situações pré existentes”.

Conforme refere a especialista, dependendo do trimestre, também as alterações são diferentes. “O primeiro trimestre está muito associado a alguns desconfortos característicos que por si só podem trazer consequências a nível da vivência da sexualidade. Já o segundo trimestre é normalmente mais tranquilo a nível da vivência da sexualidade. Portanto, já passaram estes desconfortos do primeiro trimestre e o parto ainda é algo que não é tão próximo, pelo que é um trimestre normalmente mais tranquilo a nível da vivência da sexualidade”.

Já o terceiro trimestre surge com a aproximação do parto e com alterações corporais já muito mais evidentes, bem como com a presença mais sentida do bebé, o que pode trazer alguma consequência a nível da vivência da sexualidade. “Claro que isto é muito individual, cada mulher e cada casal vivencia da sua forma. Ainda assim, o profissional de saúde tem de estar atento e aberto a falar com as pessoas sobre estas possíveis dificuldades, para que possam sentir que têm alguém com quem expôr e que lhes podem dar algumas estratégias para melhorar, resolver ou minimizar algumas disfunções que possam existir”.

“Ainda persiste a ligação de sexualidade apenas a sexo, e a sexualidade é muito mais do que sexo”.

“A abordagem das disfunções sexuais consegue obter sucesso se conseguirmos percorrer todo o caminho necessário antes. Se conseguirmos despertar os profissionais de saúde para cuidar da sexualidade ao longo da vida e abordarem a temática ao longo dos seus cuidados, com certeza iremos estar a promover um melhor cuidado também no que se refere às disfunções sexuais”.

Noutro polo, também a sexualidade dos idosos é alvo de atenção nesta obra. “Penso que esta é uma das áreas em que ainda temos muito para explorar”, refere Dora Carteiro. “Há uma certa ideia por parte da sociedade do idoso como um ser assexuado que já não tem necessidade de explorar os seus afetos, sexualidade, vivência sexual. Nada disso se perdeu, e ao promovermos essa vivência estamos a estimular a qualidade de vida destas pessoas”, conclui.

CG

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