Financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, este projeto de investigação do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP) que durou quatro anos centrou-se no impacto da gentrificação urbana, insegurança habitacional e deslocamento forçado (saída de habitações do Porto para a periferia) na saúde física e mental dos portuenses.

No âmbito do projeto HUG, liderado por Ana Isabel Ribeiro, foram desenvolvidos vários estudos, tendo um deles procurado perceber a relação entre a gentrificação e saúde a partir do método 'Photovoice'.

A equipa de investigadores, liderada por José Pedro Silva, pediu a 16 participantes da coorte EPI Porto [estudo longitudinal que, desde 1999, acompanha a população adulta residente no Porto] para fotografar a cidade e mostrar como os processos de gentrificação estão a mudar a vida e saúde dos habitantes.

A informação foi agrupada em "seis grandes temas" associados a várias consequências para a saúde dos portuenses, "algumas positivas, mas a maior parte negativas".

Um dos temas foi o aumento da população flutuante (turistas ou estudantes), que trouxe "mais 'stress', ruído e poluição", fatores que também são assinalados na construção e reabilitação urbana.

A dificuldade de acesso a habitação, que empurrou residentes para a periferia, "enfraqueceu laços sociais e gerou consequências graves" na saúde e qualidade de vida, sobretudo dos mais velhos.

Se as mudanças no comércio local "reduziram o acesso a bens essenciais" e afetaram sobretudo idosos e pessoas com menor mobilidade, a perda do sentido de lugar "causou alienação, mal-estar psicológico e, em alguns casos, um ressentimento potenciador de violência".

"Estas mudanças socioeconómicas aumentaram as desigualdades, impactando negativamente a saúde publica e, particularmente, a saúde das populações mais vulneráveis", assinala o estudo.

Com os resultados a indicarem que os impactos da gentrificação afetam sobretudo a população mais velha, os investigadores José Pedro Silva e Cláudia Jardim Santos lançaram uma nova investigação, na qual entrevistaram 12 mulheres e sete homens, entre os 62 e 88 anos.

Os resultados demonstram que o aumento da população flutuante trouxe "mais ruído, poluição, 'stress' e sérias dificuldades de mobilidade", e que a falta de habitação culminou em "deslocamentos forçados".

"Muitos relataram sentimentos de desenraizamento e perda de suporte social, com casos de depressão e até mesmo relatos de morte precoce entre a população deslocada", lê-se.

A crise habitacional na cidade motivou outra investigação sobre o deslocamento forçado com base numa amostra de 12 voluntários que viveram em casas arrendadas e foram obrigados a sair.

Também liderado por José Pedro Silva, o estudo mostrou que a relocalização tem impactos negativos, causando sentimentos como "angústia, ansiedade, depressão, tristeza, impotência, ressentimento e dificuldade em dormir".

O impacto da mudança e instabilidade residencial nas crianças foi também analisado pela investigadora Obinna Ezedei, numa investigação que envolveu mais de 6.000 crianças da coorte Geração XXI, um estudo longitudinal que, desde 2005, acompanha as crianças que nasceram nas maternidades públicas da Área Metropolitana do Porto e as suas mães.

O estudo concluiu que a instabilidade residencial está associada a um maior risco de vitimização por 'bullying', comportamentos agressivos e redução significativa no desempenho cognitivo.

As condições habitacionais precárias no Porto foram também analisadas pela investigadora Cláudia Jardim Santos num estudo que envolveu mais de 600 participantes da coorte EPI Porto e que concluiu estarem associadas a um maior nível de solidão e pior qualidade de vida entre os mais velhos.

O estudo é divulgado hoje a partir das 14:30.

SPC // JAP

Lusa/fFm