A questão da crise habitacional parece ter vindo para ficar. Mesmo que a atual desaceleração no aumento dos preços se confirme e leve a uma estabilização ou, talvez até, a uma improvável redução, é inevitável aceitar que os preços da habitação em Portugal continuarão a superar em muito a capacidade financeira da maioria das famílias, por um período considerável. Como resultado, é crucial explorar soluções inovadoras, e dentre elas, a habitação colaborativa emerge como uma opção promissora.
A habitação colaborativa, também conhecida como "cohousing", apresenta um potencial especialmente relevante como resposta às necessidades habitacionais dos jovens que estão a iniciar a sua vida e ainda não constituíram família, assim como para os cidadãos idosos que desfrutam de um nível significativo de independência.
Portugal figura entre os países europeus com uma população cada vez mais envelhecida. Em 2019, ocupava a terceira posição na União Europeia (UE) em termos da proporção de idosos na população, atingindo 21,8%. No mesmo ano, ocupava o quarto lugar na relação entre idosos e jovens, com 161 idosos por cada 100 jovens. Desde então, esses números provavelmente aumentaram ainda mais, e a imigração tem sido a única forma de equilibrar esse desequilíbrio. No entanto, é incerto se esse mecanismo de compensação é sustentável no longo prazo, especialmente considerando que muitos imigrantes utilizam o país como ponto de entrada para a legalização, migrando depois para outros países da UE.
O desafio de fornecer soluções habitacionais especializadas para idosos que já não possuem total autonomia está a crescer, e isso cruza-se com a crise de preços na habitação, dificultando a criação de novos espaços dessa natureza. É minha convicção, portanto, que o "cohousing" oferece uma saída para aqueles que ainda conservam um nível de independência e têm interesse em partilhar a sua habitação com outros indivíduos nas mesmas condições. Estas residências seriam geridas de forma participativa, livre de hierarquias e líderes, proporcionando uma experiência de democracia e envolvimento dentro das suas microcomunidades. O modelo poderia ser financiado pelo arrendamento das casas em que viviam os seniores que se concentravam numa nova casa, especialmente construída ou adaptada para "cohousing", e que assim poderia ser financeiramente sustentável com um pequeno ou nulo apoio institucional ou público.
Apesar disso, em Portugal, ainda não existem incentivos públicos para esta forma inovadora de habitação, e até mesmo um enquadramento legal está ausente. No entanto, o conceito não é inteiramente novo; existe na Alemanha e na Holanda desde a década de 1970, sendo especialmente popular neste último país como uma solução de moradia para idosos. É crucial chamar a atenção dos decisores políticos, tanto a nível das autarquias locais como do governo central, para que esta alternativa (urgente) seja considerada num país com uma população envelhecida e uma notável falta de opções de habitação apoiada para idosos.
Rui Martins | Eleito local em Lisboa pelo PS à Assembleia de Freguesia do Areeiro (Lisboa), dirigente associativo e fundador da Iniciativa CpC: Cidadãos pela Cibersegurança
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.