Acabei de ler o livro do economista canadiano Jeff Rubin, “Porque é que o seu mundo vai ficar muito mais pequeno” (editora Lua de Papel) e ele afirma que este luxo tem os dias contados – e aponta algumas razões para isso. Não admira que logo no início da obra afirme que ser economista pode dar cabo do apetite – para alguns (não para mim) é difícil digerir o mundo que ele nos apresenta. Hábitos como comer laranjas do Chile ou ananás fresco todo o ano vão acabar, diz Rubin, tal como viajar de avião da forma como o fazemos ou usar o carro como o transporte por excelência.
Especialista em questões energéticas, Rubin prevê, para breve, um mundo desglobalizado, muito mais pequeno. Motivo? O custo elevado do petróleo. “A economia global não será sustentável num mundo com o preço do barril a três dígitos”, afirma. “Se o petróleo custasse 150 dólares o barril, as pessoas não estariam a comer salmão, porque ele não lhes chegaria ao prato a não ser que vivessem na Noruega ou no Canadá. Na verdade, o que se está a comer é muito petróleo”, escreve ele no livro.
Concordemos ou não com esta teoria, precisamos de desdramatizar: quando eu era criança, não havia mangas frescas em Lisboa. Por incrível que pareça, eu sobrevivi! Esta constatação leva-me a sublinhar o que todos já sabemos: os países hoje não são auto-suficientes e, muitas vezes, dependem em grande escala de terceiros para se abastecer. Dados do INE revelam que em Portugal as colheitas de cereais caíram cerca de 60% em 30 anos. Na última década, os Estados Unidos importaram comida da China num valor que ronda, por ano, os 6 mil milhões de dólares. Custos laborais mais baixos nos países emergentes ditam essa opção, em detrimento da produção nacional. Ora, “isto não vai acontecer no mundo dos barris de petróleo a 150 dólares. Não importa se o trabalho agrícola é mais barato. Será muito dispendioso mover os bens e refrigerá-los durante a viagem”, explica Jeff Rubin.
De facto, na economia global, ninguém pensa nas distâncias em quilómetros, mas sim em euros. É preocupante perceber que, se o petróleo for barato, pouco importa se o bacalhau é ou não da Noruega, pois os custos de transporte não encarecem o produto. Mas a partir do momento em que o preço dos combustíveis dispara, o bacalhau torna-se caro – tal como os kiwis da Austrália ou os ténis do sudoeste asiático.
Acontece que Jeff Rubin vaticina que o preço do petróleo vai mesmo aumentar para esses valores. As maiores reservas de crude, como as do Médio Oriente, estão a definhar; e as novas são difíceis de rentabilizar. Junte-se a isso o consumo crescente das novas super-potências (China, Índia) e é fácil prever um futuro radicalmente diferente.
A questão que se pode colocar é a seguinte: o mundo pós-petróleo irá reconfigurar o modo como produzimos, consumimos e vivemos? A economia voltará a ser local? As maçãs de Alcobaça ficarão por cá? E podemos dizer adeus às roupas baratas do Bangladesh? Claro que os avanços tecnológicos poderão permitir a mesma logística com menor pegada carbónica, carros movidos a energia elétrica, hidrogénio, energia nuclear – o que seja. Mas aconteça o que acontecer, de uma coisa tenho a certeza: termos uma economia mais local e países mais autónomos seriam duas boas notícias – não más.
O próprio Jeff Rubin não advoga um mundo apocalíptico, nem prevê o fim da civilização. Aliás, o novo mundo, diz ele, será mais ecológico. A começar pelo desperdício, que será menor. Hoje a televisão avaria e adquire-se uma nova. Não seria mais lógico vivermos num mundo em que, em vez de três televisões feitas na Coreia do Sul, teríamos apenas uma feita na Europa? Porque é que hábitos como reaproveitar peças de vestuário, consertar sapatos ou preservar bens para passá-los de geração em geração têm de ser vistas como atitudes fora de moda, em vez de necessárias e naturais?
Num mundo que rejeitasse o descarte e o consumismo insano ressurgiria a esperança na sustentabilidade. Nesse mundo de mais equilíbrio, a agricultura e outras actividades produtivas seriam estimuladas a nível nacional. A visão de Jeff Rubin não é catastrófica, mas implica “sacrifícios”. Sacrifícios que todos teremos de fazer. “Temos de aprender a construir a nossa economia sem utilizar tanto petróleo. Isto não depende do Banco Central Europeu ou do Tesouro Americano; depende das decisões que todos tomamos – o que comemos, onde vivemos, onde trabalhamos, como nos movemos”, escreve ele.
Não poderia estar mais de acordo. A avaliar pelo que aconteceu na nossa recente campanha eleitoral, em que o tema da emergência climática e da sustentabilidade ambiental esteve praticamente ausente – e o apelo ao crescimento económico foi usado sem contraditório – percebe-se que as pessoas não estão motivadas para consumir menos. Ainda não estamos aí. Mas espero, pelo menos, que a política dos três R – reciclar, reutilizar e reduzir –, há tantos anos apregoada pelos ecologistas, passe a ser aplicada. Porque há coisas em que nem a aposta nas energias renováveis dará resposta. Para um mundo mais sustentável, não basta substituir carros a gasolina por carros eléctricos, por exemplo. Por mais que nos custe, o caminho terá de passar, consistentemente, e sempre que possível, por largarmos o automóvel.
Eu não estou tão optimista como Jeff Rubin, que afirma no seu livro que, no futuro, seremos mais ecológicos, seja qual for o nível de consciência ecológica de cada um. “Emitiremos menos gases poluentes porque as forças económicas ditarão mudanças no nosso comportamento. O preço do petróleo a três dígitos pode, ironicamente, conduzir-nos a um mundo mais verde”. Será?