Ser mulher é difícil sempre. Não é só hoje. A investigação nas ciências da vida e do comportamento comprova que a mulher está mais preparada para a dor física e emocional do que o homem, daí que também a exterioriza mais. Aliás ambas as dores. E não somos histéricas por o fazermos, simplesmente assumimos a dor sem complacência e sem pretensão de vitimização. Isto porque a capacidade para suportar maior dor e sofrimento está predeterminada no nosso ADN (no das mulheres, as que menstruam e as que não menstruam).
Mas só me referindo às mulheres cuja identidade sexual é a feminina (não me estou a referir à identidade de género que andam muitos a discriminar, outros a confundir com ideologia de género(s)). Explicando sucintamente, apoiada na boca da ciência exata: as mulheres têm uma estrutura cerebral que nunca acompanhou, ao longo dos milhões de anos, a sua dimensão física. Somos menos fortes do que os homens fisicamente, por norma. Por causa da estrutura e altura óssea. Mas, o nosso corpo sempre suportou mais, por liderança dos mecanismos cerebrais superiores, as dores por causa do parto e de tarefas continuadas domésticas. Desde gerações e gerações. E há mais argumentos, mas hoje não estou nem na sala de aula, nem na TV a comentar. Estou a reportar via escrita.
Após uma análise estatística, com base nos indicadores do INE, as mulheres (as que menstruam e as que não menstruam) respondem com menos saúde “muito boa” por comparação com os homens sobretudo desde 2021. Em 2017-2020, o sexo masculino respondia de forma mais otimista sobre como se sentia face a todos os níveis de saúde. Depois, reparei nas entranhas da estatística do INE ao longo da última década e notei, sem surpresa, que as mulheres têm mais longevidade do que os homens. Em Portugal continental. A coisa muda de figura nas ilhas. A tendência das doenças e dos seus tratamentos, ao longo das últimas duas décadas, aumentou a esperança média de vida, mas não ajuda à esperança de outras coisas dentro da vida – o caso da saúde mental que afeta mais o sexo feminino do que o masculino.
Todavia, nessa relação ‘saúde mental e mulheres’, refiro-me às taxas relacionadas com quadros de depressão e ansiedade. Mas, são os homens que mais sofrem de doenças de foro psiquiátrico (esquizofrenia e psicopatia, por exemplo) e que explicam a autoria de muitos crimes que conhecemos.
Saiba-se que os números apurados (pelo INE e outras fontes estatísticas de saúde e de demografia) desde 2017 revelam que ser mulher e viver no arquipélago dos Açores e na área metropolitana de Lisboa é indicador de viver mais anos (número de óbitos por sexo). Isto face aos recentes anos. E morrem mais mulheres no Alentejo e no arquipélago da Madeira. Não sei se terá isto que ver com o tempo mais quente que carateriza estas zonas portuguesas. Matéria para um outro momento em que eu própria tenha tempo.
Mais, na saúde e entre mulheres, verificou-se que são as mulheres que mais consomem seguros de saúde, considerando que cerca de 4 milhões de portugueses têm seguro de saúde. O problema que coloco, enquanto mulher e enquanto utente, mas sobretudo enquanto ‘utente’ de um Estado regido por trabalhadores supostamente pagos, é o seguinte: se são mais as mulheres que se sentem mais fragilizadas sobre a sua saúde, se são mais as mulheres que pagam pelos seus seguros de saúde, como está a questão da oferta – nesses seguros – de serviços de obstetrícia (para mães e futuras mães; e para as suas crianças)?
Deparo-me com isto numa altura da fertilidade em que desejos ou celeumas como “quero engravidar agora” podem levantar realmente questões de não inclusão de género. Ou seja, desses 4 milhões de tomadores de seguro, normalmente a maioria tem seguro de grupo (seguro pago pelas entidades patronais). O que acho muito bem. O que já acho execrável é ser-me negado (e a muitas mulheres trabalhadoras) ter cobertura de saúde na área reprodutiva. E a sociedade ‘pedir’ taxas de natalidade.
Ora, então os homens estarão mais serenos do que mulheres porque não podem usufruir de serviços que deviam ser de cobertura prioritária: obstetrícia, sobretudo para consultas neonatais, pós-natais e para o parto. Sobretudo sabendo que também a estatística atual nos informa que há mais médicos especialistas em ginecologia e obstetrícia nos hospitais públicos e privados, por comparação com outras especialidades. Talvez não soubesse isto...
Considero então que muitas mulheres estão renegadas no mosaico frágil da saúde portuguesa. Temos de pagar mais que os homens para podermos ser mulheres e, sobretudo, mulheres-mães. E, nisto, outra questão impõe-se: para quê estar a financiar mais estudos científicos preocupados com o aumento da longevidade humana e pesquisas sobre um outro lugar (Marte) para morar caso a Terra exploda com conflito nuclear, se nem sequer sabemos lidar, em Portugal, com algo tão básico como o financiamento de seguros de saúde inclusivos.
Ser mulher muito tempo já não me parece, assim, tão apetecível. Fica cada vez mais caro e fora do alcance do bolso da mulher portuguesa.
Professora universitária, investigadora científica e escritora