Marques Mendes considera que, após as suspeitas de acumulação indevida de funções que a SIC divulgou na sexta-feira, António Granda d’Almeida “não tinha alternativa” senão demitir-se da função de diretor-executivo do Serviço Nacional de Saúde (SNS). “A minha convicção é que a ministra terá pressionado logo para que Granda d’Almeida apresentasse o pedido de demissão”, disse o conselheiro de Estado.
No seu espaço de comentário de domingo na SIC, o antigo líder social-democrata afirmou concordar “totalmente” com o bastonário da Ordem dos Médicos, quando este defende que o próximo CEO do SNS deve ter um perfil mais técnico e não político-partidário. Mas Mendes lançou o que diz ser a “questão de fundo”: esta comissão executiva do SNS faz mesmo sentido, vale mesmo a pena? “Tenho as maiores das dúvidas. Nunca concordei muito com a criação desta comissão. Não vejo uma real utilidade, e pode ser foco de conflitos com outras entidades”, atirou, sublinhando que “a relação custo-benefício devia ser debatida”.
Quanto ao novo aeroporto, o comentador elogiou a “coragem” do Governo ao tomar uma decisão que esta semana se tornou “irreversível”. Para isso contribuem dois “sinais”: “ficou claro que a ANA aceita a solução do Campo de Tiro de Alcochete e aceita que se faça sem usar dinheiro do Orçamento do Estado”. Em aberto estão alguns pontos a negociar com a ANA, como o custo e o prazo da obra, o tempo da concessão dos aeroportos e o aumento das taxas de 2026 a 2030, assinalou.
Relativamente às eleições autárquicas, que se realizam entre setembro e outubro, Mendes disse não haver dúvidas de que Alexandra Leitão é “uma escolha forte” como cabeça-de-lista socialista para Lisboa. “É a número 2 do PS hoje em dia, a seguir a Pedro Nuno Santos é a pessoa mais importante e influente”, justificou, acrescentando que, por causa do seu “feitio” e “estilo muito assertivo”, a candidata irá mobilizar os seus apoiantes à esquerda e os seus adversários de centro e centro-direita. Dada esta “forte polarização”, prevê-se uma disputa “muito interessante e combativa” na capital.
Face à maior definição do figurino autárquico em Lisboa, “o Porto vai ter de acelerar depois desta decisão”, sobretudo na área do PSD. Confirmado está Manuel Pizarro pelo PS, recordou, sendo que Pedro Duarte é o “desejado” pelo PSD, enquanto Filipe Araújo, do movimento independente que apoiou Rui Moreira nos últimos anos, é um candidato “possível”. Mendes cenarizou ainda os casos de Gaia, Cascais, Castelo Branco e Braga.
Reagindo à queda da natalidade registada no ano passado, o comentador destacou que “uma política de imigração regulada é muito importante, mas também é fundamental uma política de apoio e incentivo à natalidade”. E defendeu que “o Governo devia introduzir a política da natalidade na sua agenda”.
O espaço de comentário arrancou com a notícia do dia: a libertação das primeiras três reféns no âmbito do acordo de cessar-fogo entre Israel e o Hamas, que entrou em vigor este domingo. Mendes atribui “uma vitória institucional” a Joe Biden, porque a assinatura deste acordo aconteceu ainda no seu mandato – e desde maio o Presidente cessante dos Estados Unidos tem vindo a fazer “grandes esforços” nesse sentido. A “vitória política” é atribuída a Donald Trump, que toma posse esta segunda-feira para um segundo mandato presidencial, porque “a sua influência e pressão ajudaram imenso”. Mas “o mais importante é ter havido cessar-fogo” e “finalmente uma boa notícia que vem do Médio Oriente”.
À luz de um estudo de opinião divulgado esta semana, Mendes vê um mundo “profundamente dividido” em relação a Trump. “Fora do Ocidente, o clima de otimismo é grande. Na Europa, o ambiente é de grande pessimismo”, disse, acreditando que “o segundo mandato vai ser bem diferente do primeiro”, durante o qual houve “muita trapalhada”, mas “as consequências não foram grandes na política interna e externa, foi mais ruído”. “Agora vai ser diferente, porque Trump tem legitimidade mais forte, teve uma vitória quase absoluta e está hoje mais profissional”, antevê.
O antigo líder do PSD destaca consequências de um segundo mandato em cinco grandes domínios: imigração, China, NATO, Europa e guerra na Ucrânia. Mendes alerta para a falta de mão-de-obra na construção e infraestruturas decorrente das prometidas deportações em massa e para a inflação nos Estados Unidos e um menor crescimento global como resultado das taxas alfandegárias no quadro da guerra comercial com Pequim. Quanto à Aliança Atlântica, “os países europeus vão ter de pagar mais, já deviam estar a fazê-lo há vários anos, colocaram-se a jeito”, disse, antecipando “uma espécie de PRR para a defesa na Europa”. Na relação “tensa” com o Velho Continente, os dirigentes europeus deverão prestar “menos atenção ao que Trump diz e mais ao que faz”.
Relativamente à guerra na Ucrânia, o Presidente americano não conseguirá acabar com ela num dia, como prometeu, mas “ninguém tem dúvidas de que vai alterar a orientação que vem de trás”. Mas haverá uma retirada imediata ou gradual do apoio de Washington a Kiev? E negociações para a paz? Além destas questões, Mendes introduziu uma outra: com “dois grandes egos na mesma sala”, como os de Trump e Elon Musk, “o clima de amizade e harmonia [entre ambos] mantém-se?”.