Para Luís Marques Mendes, a decisão judicial de exigir a presença de Ricardo Salgado no início do julgamento do caso BES é compreensível, tal como o seria se o tribunal decidisse dispensá-lo, como a defesa pediu. Ainda assim, considera que a decisão mais adequada teria sido Salgado ir a tribunal “mas de uma forma resguardada e recatada”. Ou seja, “entrar da maneira como saiu” e, depois, “ser dispensado pelo juiz”.

“Não me chocava que o tribunal dispensasse a presença de Ricardo Salgado, como a defesa pediu”, declarou este domingo no seu espaço habitual de comentário na SIC. “Relatórios médicos dizem que não está em condições de responder a perguntas complexas em tribunal. Também não me choca a decisão tomada. O que me choca é o espetáculo mediático”, comentou Marques Mendes.

“Ao que se diz, foi uma estratégia da defesa. Compreendo. Quando muita gente põe em causa os relatórios médicos e o estado de saúde de Ricardo Salgado, a defesa quer mostrar para acreditar”, explica. “Mas não concordo, o dano é muito maior desta forma. É a dignidade de Ricardo Salgado que está em causa. E também a posição da sua mulher, família, que neste momento são sofredores”.

Questionado sobre se, no atual contexto em que Ricardo Salgado se encontra (com Alzheimer), não deveria haver julgamento, Marques Mendes realça que há opiniões distintas, “todas legítimas e compreensíveis”. “Mas os tribunais regem-se pela lei. E a lei portuguesa diz que só é possível extinguir um procedimento criminal num único caso: morte do arguido. O tribunal não pode fazer de outra maneira. E ainda bem. De outra forma suscitavam-se acusações sérias de impunidade”.

Recordando que o caso BES já durou 10 anos e que poderá durar outros 10 até ao trânsito em julgado, considera que, “apesar da complexidade deste processo”, “um ciclo temporal destes é absolutamente lamentável”. Na sua opinião, os megaprocessos são “demasiado longos” e “atrasam a justiça”. “Não há justiça na hora, tudo leva tempo”, concede. “A diferença é entre ser um tempo razoável ou irrazoável. Ter um megaprocesso pode ser muito interessante do ponto de vista da investigação, mas em termos de recursos, julgamento e para produzir prova é ingerível.”

Ainda assim, reconhece que aquele que foi “dos casos mais graves da nossa democracia” dificilmente se repetirá. Uma situação como a do BES, BPN ou BPP “pode acontecer no futuro, mas não é provável”, atira, mencionando as declarações recentes de Vítor Bento, presidente da Associação Portuguesa de Bancos. E nota que os bancos estão hoje bem capitalizados e houve uma mudança significativa ao nível da gestão da banca, com maior profissionalismo e transparência.

Pedro Nuno Santos “atuou bem do ponto de vista do interesse do país, do PS e dele próprio”

Questionado sobre a decisão de Pedro Nuno Santos em propor a abstenção em relaçao à proposta de Orçamento do Estado para 2025 (OE2025) – que, na prática, viabiliza o Orçamento na generalidade –, o comentador da SIC considera que Pedro Nuno Santos não tomou uma decisão mais cedo porque “o Plano A do Partido Socialista (PS) era evitar que fosse o PS a viabilizar o OE”. “Mas para a história o que fica é a decisão – e a decisão de Pedro Nuno Santos está certa”, sublinha.

Na sua perspetiva, Pedro Nuno Santos “atuou bem do ponto de vista do interesse do país, evitando uma crise política que ninguém compreenderia”. “Também fez bem do ponto de vista do interesse do PS, já que este não era um bom momento para o partido ir a votos, sobretudo estando bastante dividido”. E, por fim, “fez bem do ponto de vista da sua credibilidade”. “Nestes momentos em que um líder toma decisões difíceis ganha credibilidade e estatuto”, nota. “Os portugueses recompensam quem toma decisões em função do interesse nacional”.

Marques Mendes acredita que esta decisão contribuiu ainda para “pacificar o PS”, uma vez que a decisão de abstenção “unia mais” do que o voto contra o OE. Para o comentador da SIC, os vencedores do processo são, assim, Pedro Nuno Santos, Marcelo Rebelo de Sousa (“que trabalhou nos bastidores para ajudar este desfecho, estando silencioso”) e Luís Montenegro (que “mostrou capacidade de diálogo, tolerância e sentido de Estado”), por oposição ao Chega.

“O facto de esta novela orçamental ter sido muito longa só teve uma vantagem: mostrar a instabilidade do Chega”, que “propôs tudo e o seu contrário”, atira. “Desde 10 de março, o Chega perde sempre: perdeu nas europeias, na eleição do presidente da AR e no OE. Estar permanentemente a mudar de opinião não dá credibilidade a ninguém.”

Sublinhando que o processo orçamental ainda não está concluído, Marques Mendes não acredita em impasses na discussão do OE na especialidade. “Acredito que haja dificuldades, mas não impasses. Não acredito que Pedro Nuno Santos queira pôr em causa a credibilidade que ganhou.”

É neste contexto que considera que “descompressão” é a palavra ideal para descrever o Congresso do PSD, que decorreu este fim de semana em Braga, de forma “tranquila, serena e morna”. Para si, Luís Montenegro surpreendeu com “a desgovernamentalização do seu núcleo duro partidário”, com a escolha de Leonor Beleza para sua vice-presidente (pela sua “enorme qualidade humana e política”) e no discurso de encerramento, que considera ter sido “virado para fora”, com um programa de ação para os próximos meses no domínio da água, da segurança, da educação, do combate à violência doméstica. E, especialmente, “ao nível de um novo plano de recuperação para a Área Metropolitana de Lisboa, criando uma espécie de Expo98”.

Já questionado por Clara de Sousa sobre se a sua presença no Congresso serviu para testar o apoio do PSD a uma eventual candidatura presidencial, Marques Mendes respondeu negativamente. “Não, é a minha coerência”, garante. “Tenho ido à maioria dos congressos. Aquela é a minha família política. Tal como gosto de ir a um batizado ou casamento da minha família no plano pessoal, gosto de estar com a minha família política. Não significa que aqui na SIC, ao domingo, não faça um enorme esforço de independência. Quando aqui estou não visto o fato partidário”, referiu.