O Movimento Democrático de Mulheres (MDM) pediu esclarecimentos à Comissão Nacional de Promoção dos Direitos das Crianças e Jovens (CNPDCJ) sobre retirada de crianças a famílias em condições socioeconómicas precárias, criticando a situação de "violência institucional e "dupla penalização".

Em comunicado, o MDM refere notícias recentes a dar conta da retirada de crianças a famílias em situações de pobreza que não permitem garantir condições de habitação e a intervenção de Comissões de Proteção de Crianças e Jovens nesse sentido.

Admitindo que o enquadramento legal permite essa atuação, uma vez que a falta de uma habitação ou condições económicas que garantam o seu bem-estar podem ser considerados como fatores de perigo para as crianças, o MDM alerta que face às "situações inesperadas" com que as famílias se veem confrontadas, a retirada das crianças "constitui penalização e sofrimento acrescidos e com efeitos devastadores nas famílias, onde se incluem as crianças alvo das medidas".

"As famílias não podem ser "duplamente" penalizadas por não conseguirem encontrar emprego ou casa digna. Assim, o MDM dirigiu uma comunicação à CNPDCJ solicitando esclarecimentos sobre estas denúncias que podem configurar situações de violência institucional sobre quem já sofre a violência, discriminação e desigualdades que grassam na nossa sociedade", lê-se no comunicado do movimento hoje divulgado.

O MDM sublinha que "a pobreza, a falta de habitação, não podem ser motivos para retirar crianças das suas famílias" e frisa "o papel de proteção e de apoio às famílias em caso de vulnerabilidade socioeconómica que cabe ao Estado".

"O que se impõe é o apoio com medidas que dê resposta concreta e justa aos problemas e não a criação de mais problemas", conclui o comunicado.

O jornal Expresso noticiava hoje que há mais crianças a ficar retidas nas maternidades por falta de condições de habitação das famílias.

Recentemente, o caso de Ana Paula dos Santos trouxe o tema para a ordem do dia, quando se soube que a mulher, mãe de três filhos e à beira do nascimento de uma quarta criança, estava em risco de perder os filhos e de não poder sair com o recém-nascido da maternidade por falta de casa.

O caso de Ana Paula dos Santos foi identificado numa petição pública, assinada por mais de mil pessoas e 59 coletivos, denunciando o receio de retirada dos filhos a pessoas sem casa ou em risco de despejo.

Ana Paula dos Santos está a viver numa pensão, no centro de Lisboa e onde não lhe é permitido cozinhar, desde 24 de setembro de 2024, dia em que a sua casa autoconstruída no bairro do Talude Militar foi demolida pelos serviços municipais de Loures.

Quando falou à Lusa, ainda grávida, Ana Paula dos Santos relatou que as assistentes sociais a estavam a pressionar, ameaçando-a de que, quando tivesse o bebé, se não tivesse uma morada, ele não sairia da maternidade. Contou, inclusivamente, que lhe deram "oito dias, no máximo, para conseguir casa", algo que o Instituto de Segurança Social negou.

Entretanto, Ana Paula teve o bebé e, em resposta enviada à Lusa, a autarquia de Loures garantiu que ela vai poder continuar alojada com os filhos na pensão atribuída pela Segurança Social, em Lisboa.

Ana Paula, imigrante, há oito anos em Portugal e auxiliar efetiva num lar de idosos, não recebeu mais nenhuma indicação da Segurança Social, nomeadamente quanto a prazos.

O seu caso motivou uma vigília de solidariedade à porta da maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa, onde nasceu o bebé.