Tinha uma voz bastante rouca e grave cuja profundidade parecia vir do centro do continente africano que amava. Natural de Kinshasa, capital do Congo, mesmo que alguém estivesse de costas sabia perfeitamente quem acabara de entrar na sala ou no campo. Dikembe Mutombo Mplolondo Mukamba Jean-Jacques Wamutombo, provavelmente um dos maiores nomes da história da NBA que será sempre recordado como Dikembe Mutombo, faleceu em Atlanta, aos 58 anos, devido a tumor cerebral.

«Dikembe Mutombo era simplesmente maior que a vida. No court, foi um dos maiores bloqueadores e defensores da NBA. Fora de campo, dedicou-se de coração e alma para ajudar os outros... Não havia ninguém mais qualificado para servir como embaixador global da NBA. Era um humanitário no seu intimo… O espirito indominável de Dikembe continuará naqueles que ajudou e inspirou através da sua extraordinária vida. Fui uma dessas muitas pessoas cujas vidas foram tocadas pelo grande coração de Dikembe e sentirei muito a sua falta…», escreveu o commissioner Adam Silver na sentida mensagem postada pela NBA nas redes sociais à anunciar o falecimento do ex-jogador que está no Hall of Fame do basquetebol.

Poste de 2,18m, depois de escolhido na 4.ª posição no draft de 1991 pelos Nuggets, atuou 19 temporadas ao serviço de outros cinco clubes: Hawks, 76’ers, Nets, Knicks, Rockets. Além de all-star em oito ocasiões, foi junto ao cesto que se tornou num dos mais temidos defensores, o que fez com que Nuggets e Hawks tenham retirado a camisola com o n.º 55.

Além de ter sido eleito quatro vezes como Defensor do Ano e três para o Cinco Defensivo Ideal, assim como duas no Segundo Cinco Defensivo, foi ainda o melhor ressaltador da regular season em duas ocasiões e liderou os desarmes de lançamentos em três. Motivo pelo qual criou a sua imagem de marca ao abanar o indicador direito a dizer não na cara de quem acabara de abafar. «Not in my house (não na minha casa)», dizia como fosse o dono da área defensiva.

Gesto que a NBA, entretanto, passou a proibir e punir com falta técnica se realizado na cara do adversário, mas que Michael Jordan também aplicou a Mutombo quando este não foi bem sucedido no abafanço à superestrela dos Bulls no play-off de 1996/97. Três meses antes Dikembe gabara-se no balneário do jogo all-star, sentado ao lado de Michael, que este nunca afundara na sua cara.

Aliás, uma provocação entre Mount Mutombo e Jordan a 3,5s do fim da visita de Chicago a Denver, em novembro de 1991, proporcionou uma das imagens icónicas de MJ quando este lançou e marcou da linha de lance livre de olhos fechados: «Hey, Mutombo, este é para ti, baby!»

Eternamente na retina ficou ainda a imagem de Mutombo deitado de costas a rir-se agarrado à bola depois dos Nuggets terem eliminado os Supersonics no play-off de 1993/94, tornando-se no primeiro 8.º classificado de conferência a eliminar (Jogo 5) o 1.º.

A BOLA entrevistou Dikembe num All-Star em que já tinha dificuldade em falar palavras em português, uma das quatro línguas que aprendera, além de cinco dialetos africanos, por em Kinshasa ter tido vizinhos angolanos. O que também ajudara uma das irmãs – tinha nove irmãos -, a trabalhar na embaixada de Angola.

Mas, foi também fora de campo que deixou a sua marca. Não só a ajudar a desenvolver o basquetebol em África como ajudando os que mais necessitam. Conseguiu angariar fundos para a construção de um hospital no Congo – tinha querido ser médico quando foi estudar para a Universidade de Georgetown -, a que deu o nome da mãe: Hospital Biamba Maria Mutombo. Ela morrera durante a guerra civil por não ter chegado a tempo uma ambulância que a levasse para o Hospital.

Ajudou a combater a poliomielite no país e noutros em África através da sua fundação criada em 1997, e ao Instituto de Ciência e Empreendedorismo que construiu batizou-o com o nome do pai, Samuel Mutombo, o qual havia sido diretor de uma escola e trabalhou para o ministério da educação do Congo.