De Lisboa a Belgrado passa-se por Istambul. Bem, não passa, mas, espiritualmente, foi esse o caminho da primeira vitória europeia do Benfica 2024/25. Um golo para cada uma das coqueluches turcas, um 2-1 mais eficaz que fantástico, mais umas doses de tranquilidade para um clube que precisa dela como de oxigénio para respirar.

Primeiro foi Kerem Aktürkoğlu. O irrequieto mágico nem tardou 90 segundos para ameaçar a baliza do Estrela Vermelha, confirmando o perigo aos 9', com o 1-0, o seu sétimo golo na época.

Depois foi Orkun Kökçü. O médio deu, há meses, uma polémica entrevista, acusando Roger Schmidt de não o usar da melhor forma. Se é para dar uma entrevista daquelas, que a resposta seja assim: elevando brutalmente o nível quando, efetivamente, lhe é dada a função que o ex-Feyenoord prefere. Um livre ao estilo do centrocampista dobrou a vantagem dos visitantes.

Antes da meia-hora de desafio, já os três pontos pareciam bem perto para o conjunto português. Perante um adversário escasso em arte ofensiva, a sensação confirmou-se, apesar da passividade do segundo tempo. O Estrela Vermelha reduziu aos 86' e ainda houve minutos de desnecessário sofrimento para o Benfica, mas a missão foi cumprida.

Dois jogos, duas vitórias para Bruno Lage. Era fundamental aproveitar este arranque com calendário acessível para ganhar algum embalo e é isso que está a acontecer, tudo à boleia da parelha turca que é o destaque máximo na Luz.

Para ajudar o Sport Türquia e Benfica a vencer, há ainda a arte de Di María. Da pausa do argentino começou a brotar o 1-0, que continuou num cruzamento de Bah, numa hesitação da defesa do Estrela Vermelha e na agressividade de Aktürkoğlu.

ANDREJ ISAKOVIC

Um Estrela Vermelha-Benfica, disputado ao terceiro dia da nova era da Liga dos Campeões, é uma curiosa interceção entre passado e futuro. Ter estes dois campeões europeus em campo lembra-nos do tempo quando, em Lisboa ou em Belgrado, era legítimo acreditar que juntando uma grande geração de jogadores e um treinador de competência acima da média se podia lutar pelo trono continental. Desperta memórias de alturas em que dominar a Europa não era coisa repartida entre meia-dúzia — se tanto — de emblemas.

Mas o que vem aí afasta-nos cada vez mais desse paradigma, fechando, progressivamente, o lote de candidatos ao título, cavando o fosso entre mais e menos ricos. Já não se sonha em Belgrado.

Estando do lado perdedor desta história — também por graves erros próprios —, o futebol sérvio vive em depressão. A seleção está num péssimo momento, os clubes têm feito paupérrimas campanhas. Nos últimos 11 encontros na Liga dos Campeões, o Crvena Zvezda (Estrela Vermelha) perdeu 10 e empatou um.

Entre o golo madrugador de Kerem Aktürkoğlu e o grande livre de Kökçü, os locais tiveram um raro momento em que entusiasmaram o público que não encheu o estádio que, noutra vida, foi apelidado de Marakanã, nome dado pelo tamanho colossal e pelo requinte técnico dos conjuntos da Jugoslávia. Krunic atirou para defesa segura de Trubin, Bruno Duarte, goleador com passado em Faro e Guimarães, disparou para intervenção mais apertada do guardião ucraniano.

Aos 29', Kökçü cimentaria a margem de vantagem do Benfica, num livre em que beneficiou da imperfeita coordenação da barreira do Estrela Vermelha.

Já com 2-0 no marcador, veio a única notícia negativa do primeiro tempo para Bruno Lage. Bah, lesionado, teve de sair, promovendo a estreia de Issa Kaboré com a camisola do Benfica.

O lateral do Burquina Faso teve um encontro difícil, com algumas dificuldades defensivas, também acentuadas pela escassa colaboração defensiva de Di María. Para tentar mitigar essa situação, Lage trocou Aktürkoğlu de lado em certa altura depois do descanso, com o turco a ajudar mais o debutante.

O segundo tempo trouxe um Benfica mais passivo. A equipa recuou o bloco, pressionou menos e foi o Estrela Vermelha a ter bem mais bola, ainda que sem criatividade para criar verdadeiras oportunidades de golo.

Nos 20 minutos depois do intervalo, o Benfica não fez qualquer remate, enquanto os locais dispararam seis vezes. No entanto, nenhum desses tiros foi enquadrado com a baliza de Trubin, um dado que ajuda a entender a escassez de ameaça ofensiva dos heptacampeões da Sérvia.

Ainda assim, o adormecer dos visitantes deu motivos de crença para os locais. Aos 86', MIlson, que em 27 jogos pelo Marítimo na I Liga só marcou uma vez, apontou o 2-1. O Estrela tentou carregar a área do Benfica com cruzamentos, mas nunca se aproximou do empate, acabando por ser Amdouni a confirmar a especial atração pelos ferros que o seu início na Luz está a ter, acertando no poste após excelente jogada.

Após o apito final, Bruno Lage aproximou-se da zona onde estavam os adeptos do Benfica e festejou vigorosamente. O técnico continua a tentar reaproximar o banco da bancada, restabelecendo relações danificadas. Fazê-lo à boleia da inspiração turca é mais fácil.