O Estado angolano "nada" receberá pela venda da Efacec e dificilmente conseguirá algum benefício da alienação do banco EuroBic, antigos ativos de Isabel dos Santos, alvo de processos judiciais, diz a Cedesa, entidade que estuda assuntos de Angola.
Para a Cedesa, "a situação da Efacec é linear. Nada será devolvido ao Estado angolano, porque a empresa estava em situação líquida negativa quando foi nacionalizada" pelo Estado português.
Esta conclusão consta do último relatório do grupo de académicos intitulado "O problema da recuperação dos ativos de Isabel dos Santos em Portugal", a que a Lusa teve hoje acesso.
Mas não é a única. No mesmo documento, o grupo de académicos também defende que dificilmente o Estado angolano conseguirá obter algum benefício da venda da participação maioritária de Isabel dos Santos no Eurobic ao espanhol Abanca.
"A conclusão essencial a que se chega é que a recuperação dos ativos de Isabel dos Santos em relação ao Eurobic pode acontecer a longo prazo, mas é muito frágil", afirmam.
Em relação à Efacec, os analistas da Cedesa consideram que, como a empresa foi nacionalizada, em 2020, "apenas haverá direito à indemnização de acordo com o valor dos respetivos direitos, avaliados à luz da situação patrimonial e financeira [da empresa] à data da entrada em vigor do ato de nacionalização".
E o cálculo da indemnização a atribuir aos titulares das participações sociais nacionalizadas, "o valor dos respetivos direitos, é apurado tendo em conta o efetivo património líquido", acrescentam.
Ora, de acordo com um relatório recente do Tribunal de Contas português, foi necessário um "financiamento público de 484 milhões de euros, havendo o risco de subir até aos 564 milhões de euros", à Efacec, pelo que "facilmente se conclui que o valor à data da nacionalização [da empresa] era negativo", defendem.
"Não havendo", por isso "nada a indemnizar aos proprietários da empresa [Isabel dos Santos] ou a quem esta deva por força de qualquer processo criminal [Estado angolano]", concluem.
“Fragilidade legal”
Já no que respeita ao EuroBic, a Cedesa recorda que, quando decorreu a venda da participação de Isabel dos Santos no banco português EuroBic ao banco espanhol Abanca, foram identificadas sociedades que tinham a antiga acionista do banco e filha do ex-Presidente de Angola José Eduardo dos Santos como beneficiária última, como a Santoro Financial Holding, SGPS, S.A., com 25% do capital social do banco, e a Finisantoro Holding Limited, com 17,5% do capital do banco, o que totaliza 42,5%.
Estas participações estavam sujeitas "a um arresto preventivo decretado em vários processos criminais portugueses", sublinha.
Além disso, segundo a informação pública disponível, "o montante recebido por Isabel dos Santos pela venda à Abanca, de 127,5 milhões de euros, terá ficado arrestado nos termos anteriores de participação, embora os termos exatos não sejam totalmente claros".
Pelo que, em relação a uma eventual recuperação deste ativo, o relatório salienta que "o arresto preventivo é uma medida de processo penal, que procura garantir pagamentos em que o arguido advenha no futuro", nomeadamente referentes a penas pecuniárias, custas do processo ou outras dívidas ao Estado relacionadas com o crime.
Pelo que "é uma medida provisória que pode ser revogada por um juiz ou declarada extinta". E "o certo" para a Cedesa "é que este arresto não garante factualmente que, no final, o Estado angolano receba qualquer destes montantes, quer por os processos criminais em Portugal não se concluírem, prescreverem ou mesmo por Isabel dos Santos ser absolvida", conclui.
Por isso, defende que "o montante só será retirado definitivamente da esfera de Isabel dos Santos em caso de condenação com trânsito em julgado dos processos referidos, o que provavelmente demorará dez anos ou mais".
Em caso de "prescrição, absolvição ou arquivamento" dos processos, isto implica "a entrega dos montantes a Isabel dos Santos", sublinha.
Mesmo em caso de condenação de Isabel dos Santos, como estes processos correm em Portugal, "os custos a eles associados, serão primeiro ressarcidos pelo Estado português".
Resumindo, "efetivamente, há uma fragilidade legal nas medidas tomadas pelas autoridades de ambos os países em relação a Isabel dos Santos, que poderá ter como consequência que, com o decorrer do tempo, não existam benefícios de toda esta atuação judicial, pelo menos, para Angola", conclui a Cedesa.
Aliás, para o grupo de analistas, na generalidade dos casos, a recuperação dos ativos de Isabel dos Santos em Portugal "é longínqua" e depende de "vicissitudes jurídicas", e só o acionamento do chamado "confisco sem condenação judicial", previsto no Código Penal português, poderá levar à apropriação dos bens da filha do ex-Presidente de Angola pelo Estado.