No momento em que entramos em contagem decrescente para a grande festa dos 40 anos da BLITZ, na Meo Arena, em Lisboa, a 12 de dezembro – com concertos de Xutos & Pontapés, Capitão Fausto, Gisela João e MARO –, pedimos a músicos, promotores, jornalistas, radialistas e outras personalidades que vão ao baú resgatar memórias de quatro décadas de história, deixando-nos, também, uma mensagem para o futuro.

“Nasci em 1988, quatro anos depois da primeira edição da BLITZ", começa por nos contar Luís de Freitas Branco, crítico musical e autor de “A Revolução Antes da Revolução”. “O meu pai, Pedro de Freitas Branco, é um melómano obsessivo, e na década de 90, além de músico profissional, era também um jornalista e crítico musical ocasional. Até hoje, ele não consegue sequer estrelar um ovo - um músico, portanto - e as nossas refeições eram sempre numa pastelaria, em horários indefinidos - hoje diríamos brunch”, relata.

“A nossa companhia eram dois jornais que o meu pai comprava religiosamente, por motivos diferentes, igualmente doentios: ‘A Bola’ e a BLITZ. Esta é a minha memória mais antiga da BLITZ: segurar aquelas páginas imensas, entre migalhas de bolos e salgados, que continham segredos indecifráveis. Que gente fascinante era esta, quais super heróis da cantiga”.

Só aos 18 anos é que Luís de Freitas Branco comprou a BLITZ pela primeira vez. “Logo a edição de estreia em revista, com os Rolling Stones na capa”, nota. "Na altura, recordo-me do meu pai e amigos a amaldiçoarem o formato, o sacrilégio, a morte do jornalismo musical, enquanto para mim foi o exato oposto: enfim, uma revista de música em Portugal, na senda da ‘Mojo’, ‘Uncut’ ou ‘Q’, as revistas britânicas que formaram a minha melomania. A revista chegou num momento curioso: no mesmo ano, é editado o álbum de estreia dos Arctic Monkeys, possivelmente o último frenesim mediático do pop rock, quando ainda se faziam filas numa loja de discos, no dia de lançamento; e a BLITZ acompanhou esta espécie de movimento transatlântico, dos Strokes, White Stripes, Franz Ferdinand, aos Pontos Negros. A revista BLITZ está associada a esta memória, a celebração de um punhado de bandas pop de guitarras que, finalmente, podia chamar de minhas. E mais tarde, em 2010, um acontecimento que, como é natural, ninguém reparou: estreei-me na BLITZ como crítico musical".

Para o crítico, “o maior contributo da BLITZ é o registo da memória musical portuguesa. A BLITZ conseguiu alimentar uma cultura de nostalgia de música popular, como fazem as revistas e jornais anglosaxónicos, e ainda apresentar e celebrar projetos de música portuguesa. Estes dois pontos são cruciais: a imprensa é inseparável da indústria musical, é o meio que memoriza a nossa história musical, e sem os cronistas, não existe memória, não existe nada. A BLITZ celebrou a música portuguesa e determinou o seu cânone, sobretudo, quando escolheu os melhores álbuns de sempre da música portuguesa, em 2004, e depois, dividido por décadas, em 2009. O cânone é outro pilar fundamental para a cultura musical, define uma identidade, que será referenciada pelos projetos futuros, seja por imitação ou por rejeição. Neste momento, estou a mestrar em Ciências Musicais e utilizo as BLITZ como referências de um período, tão relevante como qualquer outro documento histórico”.

O desejo de Luís de Freitas Branco para o futuro da BLITZ é “algo simultaneamente elementar e desafiante: longevidade. Enquanto fecham jornais e revistas, espaços de concertos e estúdios, a BLITZ mantém-se, 40 anos depois”. "É a longevidade que distingue a BLITZ”, remata.