Podem ser identificados alguns fatores de risco ou desencadeantes, nomeadamente, o consumo de alguns alimentos (condimentos/picantes, citrinos, tomate, laticínios, café, chocolate), bebidas alcoólicas ou tabaco, estando também associado a doenças psiquiátricas e a higiene excessiva/precária ou com recurso a produtos irritantes.
O prurido anal classifica-se em secundário e primário (ou idiopático). Na maioria dos casos (até 75%), é secundário a patologias anorretais, infeciosas, neoplásicas, inflamatórias cutâneas ou a doenças sistémicas. O prurido anal primário, menos frequente, não se associa a nenhuma doença, mas parece estar relacionado com a exposição da pele a fezes e a enzimas bacterianas. Esta exposição deve-se a relaxamentos anormais do esfíncter anal com perda de conteúdo fecal, muitas vezes impercetível. A exposição prolongada causa um ciclo vicioso de irritação da pele, comichão, ato de coçar, inflamação e lesões de coceira e maior irritação da pele. De acordo com o tempo de evolução, o prurido pode ainda ser considerado agudo (<6 semanas) ou crónico (> 6 semanas).
A abordagem deste sintoma exige um diálogo aberto com o doente, sendo fundamental um ambiente calmo e de compreensão para que o doente se sinta confortável a descrever e explicar os seus sintomas. É necessário questionar o doente acerca do início, duração, localização, fatores de agravamento e atenuantes, relação com o funcionamento intestinal e a presença de outros sintomas, nomeadamente, perdas de sangue, dor, prolapso e drenagem ou escorrência. Devem ser registados os hábitos de higiene, comportamentos sexuais, a revisão da medicação crónica e da já utilizada para tratar o prurido, bem como rever os antecedentes pessoais e familiares.
A observação do doente é indispensável e é denominada de exame proctológico. O doente deve ser examinado de forma cuidadosa, observando-se a região perianal, anal, perineal e genital e deve ser realizado o toque retal. A anuscopia deve ser sempre realizada para visualizar o canal anal e o reto distal. A observação permite diagnosticar as causas mais frequentes (mariscas, fissuras, prolapso hemorroidário, pólipos fibroides, papilas anais hipertróficas e dermatites), bem como identificar as lesões provocadas pelo ato de coçar. Nas fases iniciais, a região perianal pode ser normal, contudo, nos casos mais graves e/ou de longa duração, o traumatismo repetido do ato de coçar, causa vermelhidão e pequenas úlceras superficiais e posteriormente espessamento da pele.
Após a anamnese e exame objetivo, na maioria dos casos não são necessários exames adicionais. Contudo, se existirem dúvidas relativamente à presença de causas secundárias associadas, devem ser solicitados exames complementares de diagnóstico, tais como análises, colonoscopia, zaragatoa ou biópsias.
O tratamento é desafiante e frequentemente de longa duração. Os cuidados gerais aplicam-se a todos os doentes com prurido. Nos casos de prurido secundário, em que uma causa exata é identificada, deve ser realizada a terapêutica específica e dirigida a essa patologia. No prurido primário, está recomendada terapêutica tópica e sistémica.
Os cuidados gerais consistem na limpeza da pele da região perianal com recurso a água tépida e produtos de lavagem hipoalergénicos, seguida de secagem completa da zona (com toalha macia e sem fricção ou com a utilização de ar frio). Devem ser evitados toalhetes perfumados, sabonetes e agentes tópicos que possam provocar desidratação e ou irritação de pele. Deve ser privilegiado o uso de roupa interior composta por algodão. As alterações dietéticas recomendadas incluem o aumento do aporte de fibras e a evicção de tabaco, bebidas alcoólicas, cafeína, tomate, citrinos e alimentos picantes. Na maioria dos doentes com prurido anal primário, a instituição destas medidas é geralmente eficaz e suficiente.
Se os sintomas persistirem, a utilização de cremes de barreira e cicatrizantes está indicada. Os corticoides e imunomodeladores tópicos, os antihistamínicos orais, as injeções intradérmicas, os antidepressivos e neurolépticos estão recomendados para os casos mais graves e refratários
Em conclusão, o prurido anal é frequente, mas condiciona muitas vezes angústia e vergonha para o doente, o que leva a um atraso na procura de ajuda médica. Consulte o seu médico e se necessário um Gastrenterologista/Proctologista que ajudará a solucionar este problema.
Sandra Barbeiro,
Assistente Hospitalar de Gastrenterologia,
Serviço de Gastrenterologia da ULS Região de Leiria,
Direção da Sociedade Portuguesa de Coloproctologia
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