Que balanço faz da edição deste ano do Moving Beyond 2025?
Tendo sido a primeira edição desta conferência, totalmente dedicada à ciência do exercício físico e cancro, o balanço não podia ser mais positivo. Contámos com 400 participantes, mais de 100 apresentações em formato de poster, comunicações orais, um painel diversificado de palestrantes de renome nacional e internacional e todos estes elementos, juntamente com o entusiasmo de todos os envolvidos e o ambiente que a Fundação Champalimaud providencia para este tipo de eventos, contribuíram para o sucesso desta conferência.

Correspondeu às expetativas? Que tipo de feedback receberam dos participantes?
Diria que superou as expetativas. A maioria dos keynote speakers e participantes descreveu esta conferência como um sucesso a vários níveis, apontada por muitos como a melhor e maior conferência de Exercise Oncology até à data. Nunca se tinha juntado este conjunto internacional de pessoas para discutir ciência neste tópico.

O tema central está relacionado com o papel da atividade física na prevenção e tratamento do cancro. Porquê?
A evidência do papel do exercício físico como estratégia preventiva de cancro está atualmente estabelecida. Sabemos que o exercício físico previne até 13 tipos de cancros diferentes e existem recomendações claras para a população geral de exercício semanal de 150 minutos de atividade moderada ou 75 minutos de atividade intensa.
Adicionalmente, o papel do exercício ao longo do tratamento oncológico é cada vez mais evidente, com benefícios na fadiga, no sono, nos níveis de ansiedade e depressão, traduzindo-se numa melhoria global da qualidade de vida. Muita investigação existe atualmente, na qual a Fundação Champalimaud é também pioneira, no sentido de compreender o efeito do exercício físico no controlo tumoral e dos efeitos secundários dos tratamentos oncológicos. Foram os dados mais recentes da investigação nestas áreas, que é feita a nível nacional e internacional, que foram partilhados na conferência, para que também melhor possamos informar e aconselhar os doentes no dia a dia.

Houve algum tema ou painel que tenha gerado especial interesse ou maior participação?
Uma das keynote speakers, a Kathryn Schmitz, fez a apresentação de abertura e discutiu os desafios de implementação e coordenação de programas de exercício na trajetória da doença oncológica, bem como soluções possíveis. Foi, sem dúvida, das palestras que mais interesse suscitou. A experiência portuguesa de projetos de sucesso foi dada pelo Alberto Alves, outra das palestras que marcaram a conferência.

Qual é exatamente o papel e a importância da atividade física, tanto na prevenção como no tratamento do cancro?
A nível celular, os estudos nesta área derivam, nomeadamente, de modelos animais, mas temos também cada vez mais estudos em humanos. O exercício físico tem a capacidade de ativar a resposta do sistema imunitário, ter efeitos anti-inflamatórios, melhorar a entrega de quimioterapia à massa tumoral e modular hormonas essenciais na regulação tumoral, como o estrogénio.

Há alguma(s) conclusões principais ou mensagens-chave que possa destacar desta edição?
Diria que as principais conclusões são: o exercício físico tem efeitos comprovados na prevenção do cancro e a população em geral deve ser motivada à prática regular como medida preventiva. Para as pessoas diagnosticadas com cancro, a avaliação ou triagem das pessoas que têm condições para a prática de exercício deve ser realizada, apesar de ainda termos atualmente muitos desafios na área de como implementar esta triagem. Os programas de exercício físico, que podem ser supervisionados em ginásio, ou programas em casa, com recurso a ferramentas virtuais, bem como o tipo de treino (o treino aeróbio versus força ou treino combinado), devem ser idealmente individualizados à pessoa, doença e tratamentos, e ser prescritos por um fisiologista do exercício especializado, com envolvimento das equipas clínicas.

O nome da conferência aponta para o futuro — Moving Beyond 2025. Que desafios e oportunidades se colocam, na sua visão, para além desse horizonte?
O desafio da implementação é tremendo. Em Portugal, o exercício físico não é financiado, nem reembolsado e, portanto, ultrapassar esta primeira barreira é desde logo importante. Depois, construir uma rede de referenciação que seja otimizada, que transmita confiança e responda às necessidades. Depois, claro, a sensibilização dos profissionais de saúde para a referenciação e a motivação dos doentes. Pois sabemos que a população portuguesa é, em geral, pouco motivada para a prática de exercício físico regular, com desafios adicionais no contexto da doença oncológica e dos tratamentos que daí advêm. Todos estes são desafios que constituem oportunidades de melhoria, onde esperamos continuar a trabalhar, seguindo os exemplos de outros países que, na conferência, partilharam implementações bem-sucedidas. Seja o caso dos EUA, Austrália ou Alemanha.

Olhando já para o futuro, podemos esperar uma nova edição?
Depois do sucesso desta primeira edição, esperamos repetir um evento semelhante, possivelmente com uma escala maior, tentando de novo colocar Portugal no mapa de referência nesta área e promovendo a ciência do Exercise Oncology.

Sílvia Malheiro

Notícia relacionada

Prática semanal de 150 minutos de exercício baixa risco e cancro