Um homem exausto. Sem mais reservas de energia, sem forças, sem a possibilidade física de reagir. À medida que o 1.º lugar que ocupou durante boa parte da final de K1 1.000 metros se ia tornando, cada vez mais, o 6.º em que terminou, Fernando Pimenta apercebia-se que não havia milagre que o pudesse salvar, não havia reviravolta mágica que lhe desse a terceira medalha, a tão desejada terceira medalha, a inédita terceira medalha pendurada ao pescoço de um só atleta português.

A explicação para o que sucedeu na luta pelo pódio sai relativamente simples da boca de Fernando Pimenta: “Na parte final faltaram forças e energia”, resume, adiantando que, nesses derradeiros metros, sentiu “impotência e frustração”, o corpo “já não respondia”.

“Tentei dar mais e mais, mas o corpo não respondia. Tentei não o deixar avançar [ao checo Josef Dostal, que o ultrapassou na liderança e seria campeão olímpico], mas na parte final não aguentei", confessa o canoísta, que opina que quem ganhou fê-lo com “todo o mérito”.

O Fernando Pimenta que surge na zona mista de Vaires-sur-Marne é um homem que não esconde que um objetivo grande lhe escapou. Qual o desfecho mais frustrante, este ou do Rio de Janeiro 2016, quando as célebres algas o tramaram?

“São as duas muito frustrantes. Uma [Rio] porque foi um fator externo que me retirou o acesso à medalha. Se calhar já estaríamos a falar de um Fernando Pimenta com três medalhas. Agora foi o meu corpo que cedeu na parte final”.

HUGO DELGADO/Lusa

Com o peso do momento na expressão, não é a falar do resultado desportivo que Fernando se emociona. Quanto a este 6.º lugar, diz que tem a “consciência tranquila”, que deu o seu “melhor”. Achava-se “em condições” de trazer uma medalha, mas “assim é o desporto”, diz, entre referências ao mérito de Dostal, o ouro, de Adám Varga, a prata, e de Balint Kopasz, o bronze.

Há outro tema que, esse sim, o emociona. A voz muda de tom, os olhos indicam o possível surgimento de lágrimas que, timidamente, escorrem, quase convidadas discretas da conversa.

Entre estágios e estágios, competição e competição, a vida de Fernando Pimenta é uma reiterada ausência de casa. Uma distância que o magoa: “Passei muito tempo longe da minha família e dos meus pequeninos. Abdiquei de muitos dias dos meus filhotes, só estive com eles um mês neste último ano, se tanto. Falhei as festinhas da escola da minha filha praticamente todas. Isso parte-me o coração. E depois chegar aqui e não conseguir conquistar o resultado que tínhamos ambicionado…”.

É aqui que a emoção de Fernando atinge o pico. Pela cabeça passarão as manhãs em Montemor-o-Velho, os dias em Avis, os sacrifícios, o frio e o calor. E, como consequência de tudo isto, vem “a parte que mais custa: ”É abdicar deles, abdicar do filhote e da filhota, eles sofreram muito. Houve choros, depois sorrisos quando voltava a casa. O que mais me custa é estar longe dos meus filhotes e ver a minha mulher a ser mãe e pai, a ter de aguentar o barco", confessa.



Por tudo isto, o pensamento mais imediato de Fernando Pimenta é ir “desanuviar um bocadinho a cabeça”. Quer estar com a família, aproveitar o tempo. Mas não muito, porque, “durante a próxima semana”, é para “voltar ao trabalho”.

A vida do limiano é uma sucessão de novos objetivos, de renovadas metas. Por isso, ele quer “voltar à água para a desforra”.

Pimenta acaba de ver um assumido objetivo não ser alcançado, tem ainda no corpo as marcas do desgaste da prova, sentiu, ainda há minutos, as forças falhando. Mas enumera já diferentes triunfos a perseguir. A perseguir não para o ano, mas já.

Fonte de ambição sem limites, o homem das 145 medalhas internacionais já faz mira a mais. Dentro de 15 dias, diz, tem o Mundial de distâncias não olímpicas, no Azerbaijão. Depois disso, no final de setembro, é o Mundial de maratonas, na Alemanha. Canoísta anormalmente completo, Pimenta não ganha só na velocidade, mas também nas distâncias maiores.

“Tenho de resfriar a cabeça e voltar ao trabalho. Não consegui a medalha olímpica, mas posso estar na luta por umas medalhas mundiais. Esse é, agora, o objetivo”, atira.

Europa Press Sports

Esta foi a quinta final olímpica para Fernando Pimenta. Em Londres, foi 2.º no K2 1.000 metros, com Emanuel Silva; no Rio, foi 5.º no K1 1.000 metros e 6.º no K4 1.000 metros; em Tóquio foi 3.º no K1 1.000 metros; em Paris é 6.º no K.1000 metros.

Ter cinco presenças em Jogos entre os seis primeiros é, dentro da história olímpica nacional, um feito notável. Mas o homem que cumprirá 35 anos daqui a três anos “mantém o que disse antes” de Paris, isto é, que irá até LA 2028.

“Sei o que valho. Esta [a dos Jogos Olímpicos] é a medalha que todos os atletas querem, mas a cabeça está tranquila. É respirar e voltar ao trabalho, porque quero conquistar mais resultados e mais medalhas para Portugal”.